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Estudo. Maioria das grandes empresas "falha" nas promessas climáticas

por Inês Moreira Santos - RTP
Kai Pfaffenbach - Reuters

Muitas das maiores empresas do mundo não estão a conseguir cumprir as metas de combate às alterações climáticas a que se propõem, revela um novo estudo do New Climate Institute. A maioria das instituições "exageram" nas ações ambientais, mas não fazem o suficiente para diminuir a sua pegada de carbono. A Apple, a Amazon, o Ikea, a Nestlé e a Google são alguns dos exemplos analisados neste relatório.

“As principais promessas climáticas de 25 das maiores empresas do mundo, na realidade, apenas se comprometem a reduzir suas emissões em 40 por cento em média, não 100 por cento, como sugerem as suas alegações de 'zero emissões líquidas' e 'neutros em carbono'", de acordo com o Monitor de Responsabilidade Climática Corporativa 2022.

Algumas das empresas mais conhecidas do mundo têm clamado para mostrar o quão empenhadas estão a tentar combater o aquecimento global, somando-se cada vez mais organizações com promessas de eliminar a sua pegada de carbono nas próximas décadas. Mas como concluiu o relatório, divulgado esta segunda-feira pelo New Climate Institute, um grande número destas instituições não faz o suficiente para cumprir as próprias promessas.

“A rápida aceleração das promessas climáticas corporativas, combinada com a fragmentação das abordagens, mostra que é mais difícil do que nunca distinguir entre liderança climática real e greenwashing infundado. Isto ainda é agravado por uma falta geral de supervisão regulatória nos níveis nacional e setorial”, aponta o relatório que avaliou 25 grandes empresas, que operam em diferentes setores e em países, para determinar a transparência e a integridade dos seus principais compromissos climáticos.

Propusemo-nos a identificar o maior número possível de boas práticas replicáveis, mas ficamos francamente surpreendidos e desapontados com a integridade geral das reivindicações das empresas”, escreveu no documento Thomas Day, do New Climate Institute e principal autor do estudo, realizado em colaboração com o Carbon Market Watch.

À medida que aumenta a pressão sobre as empresas para agir sobre as mudanças climáticas, explicou o especialista, “as promessas ambiciosas muitas vezes carecem de substância real, o que pode enganar tanto os consumidores como os reguladores, essenciais para orientar a sua direção estratégica”.

E mesmo as empresas que estão a ir “relativamente bem”, no que toca a medidas a favor do ambiente, “exageram as suas ações”.
Metas pouco ambiciosas
As conclusões do Monitor de Responsabilidade Climática Corporativa indicam que, das 25 principais empresas avaliadas, apenas uma empresa com compromisso líquido zero foi considerada como tendo "integridade razoável" - a empresa de logística Maersk.

“Para a minoria das 25 empresas avaliadas, os principais compromissos servem como uma visão útil a longo prazo e são fundamentados por metas específicas de redução de emissões a curto prazo. Embora nenhuma das promessas tenha um alto grau de integridade geral, a Maersk ficou no topo, com integridade razoável”, lê-se no relatório.

A Apple, a Sony e a Vodafone foram as três únicas empresas avaliadas pelo monitor como tendo integridade "moderada".

A análise concluiu ainda que a maioria das empresas com compromissos climáticos não apresenta metas ambiciosas. Grande parte das promessas das organizações “são prejudicadas por planos contenciosos para reduzir emissões noutras áreas, informações críticas ocultas e truques de contabilidade”.

O relatório concluiu que “as principais promessas da Amazon, Deutsche Telekom, Enel, GlaxoSmithKline, Google, Hitachi, IKEA, Vale, Volkswagen e Walmart têm baixa integridade e as da Accenture, BMW Group, Carrefour, CVS Health, Deutsche Post DHL, E .ON SE, JBS, Nestlé, Novartis, Saint-Gobain e Unilever têm integridade muito baixa”.

Além disso, as 13 empresas que apoiaram as próprias promessas climáticas com “compromissos explícitos de redução de emissões” comprometem-se em média, “a reduzir as emissões de toda a cadeia de valor a partir de 2019 em apenas 40 por cento”. As restantes 12 “não têm compromissos específicos de redução de emissões”.

Apenas três das 25 empresas – a Maersk, a Vodafone e a Deutsche Telekom – se comprometeram com a “profunda descarbonização de mais de 90 por cento das suas emissões”. E pelo menos cinco destas conseguiam reduzir “efetivamente as emissões em menos de 15 por cento".

Para a equipa do New Climate Institute, que estava "genuinamente otimista" com a análise foi uma deceção não terem encontrado "muito mais criatividade".
Promessas “enganam” consumidores
O relatório aponta mais um fator que pode estar a prejudicar a integridade destas empresas: as abordagens de compensação.

A maioria das empresas analisadas “provavelmente contam com créditos de compensação, de qualidade variável”. Pelo menos dois terços das empresas “dependem de remoções de florestas e outras atividades biológicas, que podem ser facilmente revertidas por, por exemplo, um incêndio florestal”.

A Nestlé e a Unilever, por exemplo, “distanciam-se da prática de compensação no nível da empresa-mãe, mas permitem e incentivam as suas marcas individuais a procurar a compensação para vender produtos rotulados como neutros em carbono”.

Para além do mais, algumas metas aparentemente ambiciosas “podem levar a pouca ação a curto prazo”.

“Os anúncios enganosos das empresas têm impactos reais nos consumidores e legisladores. Somos enganados ao acreditar que estas empresas estão a tomar medidas suficientes, quando a realidade está longe disso”
, explicou Gilles Dufrasne da Carbon Market Watch.

“Sem mais regulamentação, isto vai continuar. Precisamos que os governos e os órgãos reguladores intensifiquem e acabem com esta tendência de lavagem verde”.

No entanto, nem tudo é mau. A investigação identificou exemplos promissores de liderança climática. A Google está a desenvolver “ferramentas inovadoras para adquirir energia renovável de alta qualidade em tempo real”, o que começa a motivar outras empresas a fazer o mesmo. Já a Maersk e a Deutsche Post estão a investir em tecnologias de descarbonização para transporte e logística.

“As empresas devem enfrentar a realidade de um planeta em mudança. O que parecia aceitável há uma década já não é suficiente”, disse Dufrasne.

“Estabelecer metas vagas não nos vai levar a lado nenhum sem ações reais, e pode ser pior do que não fazer nada se continuarem a enganar o público. Os países mostraram que precisamos de um novo começo ao adotar o Acordo de Paris, e as empresas precisam de refletir isso nas próprias ações”.

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