"Estamos a afundar-nos". Recrutamento de soldados é cada vez mais difícil em Israel
Mais de um ano após o início da guerra contra o Hamas em Gaza, o exército israelita enfrenta dificuldades crescentes para recrutar soldados e os reservistas estão a ficar exaustos devido às missões. É o que se pode ler em vários testemunhos recolhidos pela agência France Presse.
Há cerca de 170 mil soldados no ativo no exército e o serviço militar é obrigatório para rapazes e raparigas de 18 anos, embora alguns estejam isentos de várias formas. Israel está a travar uma guerra em várias frentes, nomeadamente contra o Hamas em Gaza e o Hezbollah no Líbano, que já causou as mortes de 777 soldados e 4.500 feridos.
Os períodos de reserva foram prolongados e alguns reservistas protestam contra estas medidas, que os privam de uma vida familiar, por vezes durante mais de seis meses consecutivos.
“Estamos a afundar-nos”, escreveu Ariel Seri-Levy na rede social Facebook, numa mensagem partilhada milhares de vezes nas redes sociais.
Ariel Seri-Levy foi chamado quatro vezes desde o ataque de 7 de outubro e denuncia aqueles que querem que Israel “fique no Líbano e em Gaza”.
“Temos de acabar com esta guerra porque não temos mais soldados”, frisa. O reservista continua a acreditar na importância de servir o seu país, mas considera que “as concessões se tornaram demasiado grandes”.Muitos trabalhadores independentes deixaram de trabalhar por causa da guerra, apesar de o Governo conceder uma pensão mínima aos reservistas.
À France Presse, outro militar israelita, pai de dois filhos, que pediu anonimato, afirmou que para além do esforço físico e do esgotamento moral, há ainda o facto de ter perdido o emprego que tinha antes da guerra.
“O coletivo é sempre melhor do que o individual, mas o preço é demasiado elevado para a minha família”, conclui o reservista, lembrando que passou quase seis meses em Gaza nos últimos 12 meses.Judeus ortodoxos parcialmente isentos do serviço militar
O recrutamento dos judeus ultraortodoxos, que estão parcialmente isentos do serviço militar, está no centro do debate público.Segundo o Instituto Israelita para a Democracia (IDI), representam cerca de 14 por cento da população judaica de Israel, ou seja, quase 1,3 milhões de pessoas.
Cerca de 66 mil homens em idade militar beneficiam desta isenção, porque se dedicam ao estudo dos textos sagrados do judaísmo, segundo o exército, de acordo com uma regra introduzida aquando da criação de Israel em 1948.
Mas, em junho, o Supremo Tribunal ordenou o recrutamento dos estudantes das yechivot (escolas talmúdicas), considerando que o Governo não tinha o direito de os isentar “na ausência de um quadro jurídico adequado”.
Os partidos políticos ultraortodoxos, membros-chave da coligação do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, exigiram que o Governo aprovasse uma lei que tornasse esta isenção permanente antes da votação crucial do orçamento do Estado no final do ano.
O líder do partido Shass (ultraortodoxo sefardita), Arié Déry, declarou numa entrevista que esperava “resolver o problema dos pedidos” do exército para os estudantes das yechivot.
O realizador Hagai Luber, cujo filho Yeonatan foi morto em combate na Faixa de Gaza, respondeu numa carta aberta.
“O problema é o meu querido filho Yeonatan, que morreu em Gaza há 10 meses, o meu maravilhoso filho Itamar, que está a combater em Gaza neste momento, o meu dedicado filho Elad, que em breve entrará em Gaza (...) o problema é não conseguir dormir com medo de outro anúncio, como uma nuvem negra a pairar sobre nós”, escreveu.
Outra carta aberta, assinada por mais de duas mil esposas de reservistas do movimento sionista-religioso, que concilia a vida religiosa com a participação no exército, apela a “um alívio do fardo para aqueles que servem”.
“Não há oposição entre o estudo da Torah e o serviço militar, os dois andam juntos”, declarou Tehila Elitzour, académica e esposa de reservistas, ao diário israelita Yediot Aharonot. Entre 22 e 28 de outubro de 2023, seis homens que estavam isentos do serviço na reserva, mas que se tinham apresentado como voluntários, morreram em combate, incluindo um pai de dez filhos.
Para David Zenou, um rabino de 52 anos que passou mais de 250 dias de uniforme este ano, incluindo várias semanas no Líbano como combatente, “é um mérito servir o meu país e, enquanto puder, continuarei a fazê-lo”.
“Mas, sobretudo, não esqueçamos que se trata de uma guerra e que temos falta de soldados”, declarou à AFP este pai de sete filhas e seis vezes avô.
Combates prosseguem em Gaza e no Líbano O exército de Israel anunciou, na madrugada de quarta-feira, a realização de bombardeamentos contra a "zona humanitária" de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza, que, segundo a imprensa palestiniana, causou vítimas mortais.
Aviões de guerra realizaram bombardeamentos precisos contra membros da organização islamita palestiniana Hamas, “que realizavam atividades terroristas na zona humanitária de Khan Younis”, revelou o exército israelita.
Em comunicado, as Forças de Defesa de Israel denunciaram a “utilização sistemática por parte de organizações terroristas” de centros civis, “incluindo espaço humanitário” na Faixa de Gaza.
A agência de notícias oficial palestiniana Wafa indicou que os bombardeamentos israelitas provocaram numerosas mortes e feridos nas tendas onde se refugiavam os habitantes de Gaza deslocados pelo conflito, no noroeste de Khan Yunys.
A agência acrescentou que o exército israelita atacou também uma área de deslocados na cidade de Deir al-Balah, no centro da Faixa de Gaza.
Líbano
Na outra frente de batalha do exército israelita, os tanques entraram nos arredores da aldeia libanesa de Khiam, na mais profunda incursão de Telavive no sul do Líbano durante a sua operação terrestre, noticiaram os meios de comunicação libaneses, enquanto o Ministério da Saúde afirmou que pelo menos 14 pessoas foram mortas em ataques israelitas no sul do país.
A agência noticiosa nacional oficial noticiou na terça-feira a entrada de um “grande número” de tanques israelitas na periferia oriental da cidade de Khiam, a cerca de seis quilómetros da fronteira com Israel.As forças israelitas efetuaram uma série de ataques aéreos a Khiam no final da tarde de terça-feira e lançaram uma operação de limpeza em grande escala “utilizando armamento pesado e médio”, noticiou a Agence France-Presse (AFP).
O Hezbollah disse ter destruído dois tanques com mísseis teleguiados e atacado as tropas israelitas a sul e sudoeste de Khiam com foguetes e artilharia.
Entretanto, um ataque israelita à cidade de Sarafand, no sul do Líbano, matou pelo menos oito pessoas, informou o Ministério da Saúde libanês na terça-feira.
O Ministério libanês da Saúde libanês informou ainda que seis pessoas morreram num ataque anterior em Haret Saida, perto da principal cidade de Sidon, no sul do país.
c/ agências