Especialistas defendem que causa de morte de George Floyd foi a falta de oxigénio e a "atuação dos agentes"
O julgamento de Derek Chauvin, o ex-agente da polícia de Minneapolis acusado de homicídio em segundo e terceiro grau do afro-americano George Floyd, entrou esta sexta-feira no décimo dia de audiências. O julgamento está agora centrado na causa de morte de Floyd. Especialistas defendem que Floyd morreu por falta de oxigénio e rejeitam a teoria defendida pela equipa de defesa de que o consumo de drogas e os problemas de saúde subjacentes foram a causa de morte. Uma patologista forense testemunhou que “as ações dos agentes policiais resultaram na morte de Floyd”.
“A causa do baixo nível de oxigénio foi a respiração débil”, explicou Martin Tobin, médico no Hospital Edward Hines Jr. VA e na escola de medicina da Universidade Loyola, nos EUA.
O perito, que se apoiou em gráficos e imagens de vídeo, sublinhou que a forma como Floyd foi algemado e a posição em que Chauvin o imobilizou no solo criou uma espécie de torniquete que afetou a respiração.
“Pequenas respirações. Respirações pouco profundas que não foram capazes de levar o ar através dos seus pulmões até às áreas cruciais dos pulmões que levam oxigénio ao sangue e se libertam do dióxido de carbono”, acrescentou o especialista.
A falta de oxigénio, por sua vez, “causou danos ao cérebro e também provocou uma arritmia, que fez o seu coração parar”.
Enquanto os procuradores apresentavam repetidamente as imagens do momento da detenção do afro-americano, o especialista identificou aquele que foi o último suspiro de Floyd, que aconteceu cerca de cinco minutos depois de a polícia o ter pressionado contra o asfalto. “No início, podem ver que ele está consciente, podem ver uns ligeiros tremores, e depois desaparecem. Esse é o momento em que a vida sai do seu corpo”, explicou Tobin perante o tribunal.
Durante o vídeo da detenção, que circulou por todo o mundo, é possível ouvir-se Floyd a repetir mais de 20 vezes que não conseguia respirar, ouvindo-se a certa altura Chauvin responder: “Se consegues falar, consegues respirar”. Tobin testemunhou que uma vez que Floyd estava a falar, isso não significava que estava a respirar adequadamente. O especialista explicou ainda que o movimento involuntário de uma das pernas de Floyd, que é possível ver-se no vídeo, era um sinal de uma lesão cerebral, quando o cérebro deixa de receber oxigénio.
O especialista esclareceu ainda que a relação de Floyd com as drogas não foi relevante para a sua morte. “Uma pessoa saudável submetida ao que o Sr. Floyd foi submetido teria morrido”, defendeu Tobin, rejeitando a teoria defendida pela equipa de defesa de Chauvin de que a morte de Floyd teria sido provocada pelo alegado consumo de drogas e os problemas de saúde subjacentes.
Atuação dos agentes foi “a causa imediata da morte”
Lindsey Thomas, uma patologista forense, foi uma das primeiras a testemunhar esta sexta-feira. Os depoimentos de Thomas foram ao encontro dos de Tobin, tendo defendido que o “mecanismo primário” da morte de George Floyd foi “asfixia ou pouco oxigénio”. A patologista forense acrescentou que a "subjugação, contenção e compressão" do pescoço de George Floyd foi, "em última instância", a causa imediata da morte.
“Esta não é uma morte cardíaca súbita, uma arritmia cardíaca súbita. Esta é uma morte em que o coração e os pulmões deixaram de funcionar. E a questão é que isso deveu-se à subjugação, contenção e compressão por parte dos agentes. Essa é, em última instância, a causa imediata da morte”, explicou Thomas.
Questionada pelos procuradores para explicar o que entende pelos termos de “contenção, subjugação e compressão”, a patologista forense respondeu que essas foram as ações praticadas pelos agentes policiais envolvidos na detenção de Floyd. “O que significa para mim é que essas operações das forças policiais resultaram na morte do Sr. Floyd. E que essas ações foram a subjugação, contenção e compressão do pescoço”, reiterou Thomas.
A patologista forense descartou também as drogas como um fator relevante na morte de George Floyd, afirmando que os vídeos da detenção minam a defesa de Chauvin. Segundo explicou Thomas, a morte do afro-americano não foi “repentina” como ocorreria devido ao consumo de metanfetamina e também não foi lenta como seria de esperar com o fentanil, duas substâncias que foram detetadas na autópsia.
"Stress fisiológico" foi um "golpe duplo" para Floyd
Lindsey Thomas acrescentou que um “mecanismo secundário” na morte de Floyd foi o que apelidou de “stress fisiológico”, derivado do sentimento de medo. “Começamos a precisar de mais oxigénio nos nossos músculos, de respirar mais e de mais oxigénio para a frequência cardíaca, porque o nosso coração está a bater mais rápido”, explicou a patologista forense.
“Todos esses fenómenos físicos, coisas químicas, podem causar reações no corpo que dão origem a um stress adicional, principalmente no coração, mas também em todos os sistemas do corpo”, acrescentou. Todo este stress foi um “golpe duplo” para Floyd, concluiu Thomas. O médico legista que realizou a autópsia de Floyd, Andrew Baker, também deverá testemunhar esta sexta-feira.
O ex-polícia está acusado dos crimes de assassínio em segundo grau, punido com pena até 40 anos de prisão, assassínio em terceiro grau, com uma pena máxima de 25 anos, e homicídio em segundo grau, que implica até 10 anos de privação da liberdade.
No entanto, como não tem antecedentes penais, só poderá ser condenado a um máximo de 12 anos e meio de prisão pelos primeros dois crimes e a quatro anos de prisão pelo terceiro.
Na segunda-feira, foi a vez de o chefe da polícia de Minneapolis testemunhar, tendo acusado Derek Chauvin de violar as regras e os princípios de atuação.
Estão convocadas mais de 400 testemunhas e o julgamento tem já mais de um mês de sessões agendadas. O veredicto é esperado para o final de abril ou início de maio, sendo que os 12 jurados terão de decidir por unanimidade, sob pena de o julgamento ser considerado nulo.
Os outros três polícias envolvidos na morte de Floyd (Alexander Kueng, Thomas Lane e Tou Thao) só serão julgados por “cumplicidade no homicídio” em agosto, devido à pandemia da Covid-19.
c/agências