O especialista em eleições David Levine defendeu, em entrevista à agência Lusa, que os Estados Unidos têm de permanecer vigilantes até à inauguração do próximo Presidente, dia 20, porque apoiantes de Trump podem voltar a causar desordem.
O especialista da Alliance for Securing Democracy (Aliança para Proteção da Democracia), iniciativa do German Marshall Fund nos Estados Unidos, qualificou o cerco ao Capitólio, na quarta-feira, como "inaceitável, antidemocrático e imoral" e que "sem dúvida, marca um nadir [ponto mais baixo] na democracia americana".
"Temos de estar atentos à possibilidade de haver pessoas que viram o que aconteceu ontem e que podem pensar em tentar fazer algo igual", alertou David Levine em entrevista à agência Lusa.
"Existe um segmento da população americana que é obediente, cativado por e extremamente leal ao Presidente e, particularmente para esse segmento, as palavras e ações do Presidente importam", explicou o especialista, acrescentando que Donald Trump devia condenar claramente os acontecimentos violentos e mandar que os perpetradores sejam chamados à justiça.
"Para o bem-estar dos cidadãos e para o bem da nossa democracia, é importante que o Presidente condene o terrorismo doméstico e qualquer forma de protesto que não é pacífica", declarou.
David Levine assegurou que permanece confiante na resiliência da democracia e nos esforços da polícia e forças de segurança, mas sublinhou que "é importante, como sociedade, permanecermos vigilantes e que todos os esforços sejam feitos para assegurar que não há uma repetição do que aconteceu" até ao dia da inauguração do próximo Presidente, a 20 de janeiro.
A insurreição em Washington, na quarta-feira, foi o "culminar de várias semanas de desinformação sobre as eleições", informações incorretas e desinformações reforçadas por vários políticos norte-americanos e outros países, considerou o investigador de processos eleitorais internacionais, inclusive interessado nas eleições portuguesas a 24 de janeiro.
Por isso, o especialista defendeu a criação de uma comissão presidencial para a integridade das eleições e combate à desconfiança no sistema pela próxima administração do Presidente Joe Biden e vice-presidente Kamala Harris.
"Desde as eleições de 2000, (...) em cada eleição presidencial tem havido menos confiança no processo democrático, inclusive eleições, pelo partido perdedor e seus apoiantes. Temos visto esse problema tornar-se mais proeminente", declarou Levine.
"Há definitivamente trabalho para fazer nos Estados Unidos para que nos próximos anos, se houver eleições renhidas e esforços de pessoas para subverter os resultados das eleições com base em alegações falsas, estarmos melhor preparados e capazes de lidar", disse.
O antigo diretor de eleições do condado de Ada, do estado de Idaho, declarou à Lusa que os acontecimentos de quarta-feira foram um lembrete "forte" e "trágico" de que a democracia tem de ser "nutrida constantemente".
"Embora a eleição presidencial de 2020 tenha sido conduzida com um tremendo grau de integridade por funcionários eleitorais, voluntários e outros parceiros, os eventos de ontem [quarta-feira] são um forte lembrete de que administrar uma eleição legítima não garante, por si só, uma eleição bem-sucedida, uma transição pacífica de poder, ou uma democracia saudável", disse David Levine.
Um dos fatores que levou aos confrontos de quarta-feira, na visão do especialista, é o facto de haver indivíduos com um grande número de seguidores que tentam explorar as vulnerabilidades do sistema eleitoral.
No total, para o especialista, existem atualmente três fatores que fragilizam a democracia norte-americana: "Informação incorreta e desinformação difundida por pessoas com muitos seguidores, até aos altos níveis da governação", a amplificação de desinformações por "adversários estrangeiros, como Rússia e Irão" e a exploração e exagero de vulnerabilidades do sistema.
David Levine concluiu que "é importante ter um debate saudável na democracia" e manter a união em "tempos difíceis para assegurar que a democracia é vibrante e forte".
Apoiantes do Presidente cessante dos EUA, Donald Trump, entraram em confronto com as autoridades e invadiram o Capitólio, em Washington, na quarta-feira, enquanto os membros do congresso estavam reunidos para formalizar a vitória do Presidente eleito, Joe Biden, nas eleições de novembro.
Pelo menos quatro pessoas morreram na invasão do Capitólio, anunciou a polícia.
Já hoje o Congresso dos Estados Unidos ratificou a vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais de novembro, na última etapa antes de ser empossado em 20 de janeiro.
A sessão de ratificação dos votos das eleições presidenciais dos EUA foi interrompida quarta-feira, mas quatro horas depois as autoridades declararam que o edifício do Capitólio estava em segurança.
O Presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou que os violentos protestos foram "um ataque sem precedentes à democracia" do país e instou Donald Trump a pôr fim à violência.
Pouco depois, Trump pediu aos seus apoiantes e manifestantes que invadiram o Capitólio para irem "para casa pacificamente", mas repetindo a mensagem de que as eleições presidenciais foram fraudulentas.