"Era inevitável". Demissão de Hernâni Dias vista com bons olhos pela oposição

por Joana Raposo Santos - RTP
Esta é a primeira demissão do Executivo de Luís Montenegro. Foto: Pedro A. Pina - RTP

A oposição reagiu em uníssono à demissão do até agora secretário de Estado Hernâni Dias, considerando-a adequada tendo em conta a polémica em que está envolvido. O PS vê a saída como "inevitável" e o próprio PSD acredita que, por ter existido uma "suspeita ética", a decisão foi acertada. O governante saiu do cargo na terça-feira, depois de uma investigação da RTP ter avançado que Hernâni Dias criou duas empresas que poderiam vir a beneficiar com a nova Lei dos Solos.

“Hernâni Dias não é acusado de nenhum ato ilegal, mas ‘à mulher de César não basta ser séria, tem de o parecer’. Portanto, houve aqui uma suspeita ética” que deveria ter sido “esclarecida cinco minutos depois de a notícia ser conhecida, explicada, até às vezes com um pedido de desculpa”, considerou o social-democrata Duarte Pacheco.

Também do lado do Governo, o primeiro-ministro veio anunciar que aceitou o pedido de demissão do secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, acrescentando que este será “oportunamente substituído no cargo”.

“O primeiro-ministro expressa reconhecimento ao Dr. Hernâni Dias pelo empenho na concretização do Programa do Governo em áreas de particular importância e sublinha o desprendimento subjacente à decisão pessoal tomada”, acrescentou o chefe de Governo numa nota.Esta é a primeira demissão do Executivo de Luís Montenegro.

O principal partido da oposição notou, por sua vez, que “houve um silêncio ensurdecedor, desde logo da parte do próprio primeiro-ministro, que, enquanto líder da oposição, foi sempre muito vocal a explorar casos”.

“O Partido Socialista pediu esclarecimentos e há mais de 48 horas que eles não eram dados”, declarou o deputado socialista Miguel Cabrita. “Passadas estas 48 horas, passada uma intervenção do presidente da República, há uma demissão. Não houve explicações, mas há uma demissão e, provavelmente, isso significa que essa demissão era inevitável”, acrescentou.

Já antes do anúncio da demissão, o líder socialista Pedro Nuno Santos tinha desafiado o primeiro-ministro a dizer se Hernâni Dias era “um peso político negativo”.
“Cem mil vezes mais grave”
O partido de André Ventura declarou, antes de anunciada a demissão, que este era “o momento que o primeiro-ministro tem de garantir que está mesmo a sério no combate à corrupção”.

O presidente do Chega considerou este caso “cem mil vezes mais grave” do que a polémica das malas em que se viu envolvido o deputado Miguel Arruda, já que “envolve contrapartidas no exercício de funções públicas” e “o benefício próprio do processo de legislação”.

A Iniciativa Liberal reagiu à demissão dizendo, pela voz do deputado Mário Amorim Lopes, que “um governante, num órgão de soberania, a colocar-se a jeito desta maneira, e depois de todo o espólio nos oito anos que tivemos de casos e casinhos, é de facto incompreensível”.

No Bloco de Esquerda, foi a deputada Joana Mortágua a reagir, considerando que “a alteração à lei que ele próprio ajudou a escrever e a criar é uma suspeita legítima”.

“A dúvida é legítima. É legítimo perguntar porque é que o secretário de Estado criou aquelas duas sociedades imobiliárias numa altura em que uma lei vai criar verdadeiras fortunas imobiliárias ou vai pelo menos permitir essa valorização do território”, declarou.

Alfredo Maia, deputado do PCP, afirmou que “Hernâni Dias extraiu as consequências deste caso e da nebulosa que o envolve”, já que “este caso confirma a suspeita de que há algo de errado na alteração do regime jurídico dos instrumentos de gestão do território”.

Em nome do Livre, o deputado Paulo Muacho vincou que “havia demasiadas suspeitas, demasiadas coisas por esclarecer relativamente a este secretário de Estado” e considerou que “há toda a questão também em torno da própria lei dos solos que também é importante que o Governo perceba que é necessário rever”.
Primeira demissão do Governo Montenegro
O programa A Prova dos Factos, da RTP, noticiou na sexta-feira que Hernâni Dias criou duas empresas que poderiam vir a beneficiar com a nova Lei dos Solos, legislação criada sob alçada da secretaria de Estado liderada pelo próprio.

O até agora responsável pela Administração Local e do Ordenamento do Território criou uma sociedade com a mulher e os filhos já enquanto governante. As atividades da empresa estão no setor imobiliário, construção civil e gestão de património.

A empresa fundou depois uma outra sociedade com os mesmos fins, juntamente com uma menor de idade.

A RTP já havia antes anunciado que Hernâni Dias estava a ser investigado pela Procuradoria Europeia e era suspeito de ter recebido contrapartidas. Em causa o uso de um apartamento, quando foi autarca de Bragança, o que o secretário de Estado rejeitou num comunicado enviado há uma semana à agência Lusa.
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