Entre polémica sobre ex-colónias. Marcelo em visita de três dias a Cabo Verde
O presidente da República inicia esta terça-feira uma visita de três dias a Cabo Verde, onde vai participar nas comemorações dos 50 anos da libertação dos prisioneiros do campo de concentração do Tarrafal. A presença neste local, símbolo da violência da ditadura colonial portuguesa, acontece após declarações polémicas de Marcelo Rebelo de Sousa sobre eventuais reparações a ex-colónias.
O campo do Tarrafal, também conhecido como "campo da morte lenta", funcionou irregularmente entre 1936 e 1974 e recebeu, no total, mais de 500 pessoas. Inicialmente, recebia opositores portugueses ao regime.
Entre 1936 e 1956, 36 pessoas morreram neste local, 32 das quais eram portugueses que contestavam o regime ditatorial.
Numa segunda fase, em 1962, reabriu com o nome de Campo de Trabalho de Chão Bom e recebeu os guerrilheiros dos grupos de libertação dos países africanos. Neste período morreram dois angolanos e dois guineenses.
A Revolução dos Cravos permitiu o fim deste campo de concentração, hoje Museu da Resistência. Cinquenta anos depois, será este o palco central das comemorações, que contam com o presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, o seu homólogo cabo-verdiano, José Maria Neves, e ainda o presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, e um representante do presidente de Angola, completando assim o leque de quatro países de origem dos presos políticos.
"Pagar os custos" do passado colonialA visita do chefe de Estado português acontece numa altura em que as suas declarações sobre as ex-colónias têm causado alvoroço. Marcelo Rebelo de Sousa defendeu, num jantar com jornalistas estrangeiros, que Portugal deve "assumir a responsabilidade total" pelo que fez no período colonial e "pagar os custos".
Mesmo após criticado, o presidente veio insistir na sua tese. "Não podemos meter isto debaixo do tapete ou dentro da gaveta. Temos obrigação de pilotar, de liderar este processo, porque se nós não o lideramos, assumindo, vai acontecer o que aconteceu com países que, tendo sido potências coloniais, ao fim de x anos perderam a capacidade de diálogo e de entendimento com as antigas colónias", alertou no último sábado.
Marcelo Rebelo de Sousa deu como exemplos o perdão de dívidas, a cooperação ou a concessão de linhas de crédito e de financiamento. E defendeu que o atual Governo deveria continuar com o processo de levantamento dos bens patrimoniais das ex-colónias em Portugal, iniciado pelo anterior Governo, para posteriormente os devolver.
"É uma questão que tem que ser tratado pelo novo Governo, em respeito com as funções executivas do Governo e tem que ser tratada em contacto com esses Estados", declarou.
Além do património das ex-colónias, o chefe de Estado lembrou que falta resolver os problemas dos antigos combatentes e dos "espoliados" dos seus bens nas ex-colónias e obrigados a regressar a Portugal.
A agenda de Marcelo
As celebrações no Campo de Concentração do Tarrafal acontecem a 1 de maio e incluem o descerramento de uma placa comemorativa, uma sessão especial com os chefes de Estado e uma conferência sobre o campo do Tarrafal pelo historiador Victor Barros.
À tarde, os presidentes realizam uma visita guiada ao campo e as comemorações do dia terminam com um concerto com Mário Lúcio (Cabo Verde), Teresa Salgueiro (Portugal), Paulo Flores (Angola) e Karyna Gomes (Guiné Bissau), com entrada livre.
Antes disso, esta terça-feira, Marcelo Rebelo de Sousa visita a Feira do Livro na capital, Praia, onde é recebido pelo homólogo cabo-verdiano. De seguida, os dois visitam a exposição "50 Anos de Abril - Antes e Depois", no Arquivo Histórico Nacional de Cabo Verde.
Marcelo Rebelo de Sousa termina o dia com uma receção à comunidade portuguesa.
c/ Lusa