Emissão da televisão estatal russa interrompida por protesto contra a guerra em estúdio
"Não à guerra", "Eles estão a mentir-vos", "Não acreditem na propaganda", são algumas frases que se liam no cartaz empunhado por uma editora de notícias da televisão estatal russa. Marina Ovsyannikova, entrou no estúdio durante a transmissão em direto e gritou "parem com a guerra", sobrepondo-se à voz da apresentadora de notícias do Channel One. Foi a primeira trabalhadora dos media russos a denunciar a guerra publicamente. A ONU pede para a jornalista não ser punida, mas Kremlin diz que foi um ato de "vandalismo"
Em nome de todos os russos que estão contra a guerra, Marina Ovsyannikova, editora de notícias do canal estatal marcou a emissão em direto do telejornal russo do Channel One, no dia 14 de março, segunda feira.
Entrou no estúdio com um cartaz para expressar indignação contra a guerra. Durante segundos a emissão permaneceu com a imagem no estúdio, onde Ovsyannikova segurou a placa onde se liam mensagens : "Não à guerra", "Eles estão a mentir-vos" , "Não acreditem na propaganda", "russos contra a guerra", por trás da pivot do noticiário.
A voz da manifestante misturou-se com a da apresentadora mas ainda se ouviu "Parem a guerra. Não à guerra".
O canal mudou o sinal para uma reportagem para retirarem Marina Ovsyannikova do estúdio.
Vergonha, acrescenta em vídeoHoras antes deste incidente, Marina Ovsyannikova divulgou um vídeo previamente gravado através de um grupo de direitos humanos OVD-info, onde expressa vergonha por ter trabalhado num canal que transmite "propaganda do Kremlin".
"Infelizmente, por vários anos, trabalhei no Channel One e na propaganda do Kremlin, estou muito envergonhada disso. Vergonha por me permitirem contar mentiras no ecrãn da televisão. Vergonha por ter permitido a zumbificação do povo russo. Ficamos em silêncio em 2014, quando isto estava apenas a começar. Não saímos para protestar quando o Kremlin envenenou [o líder da oposição Alexei] Navalny", observou Ovsyannikova.
"Estamos apenas a observar silenciosamente este regime anti-humano. E agora o mundo inteiro afastou-se de nós e as próximas dez gerações não vão conseguir limpar-se da vergonha desta guerra fratricida", continuou.
Marina usava um colar nas cores azul e amarelo da bandeira ucraniana e explicou que é filha de pai ucraniano e mãe russa.
Marina exortou os russos a se juntarem aos protestos contra a guerra para pôr fim ao conflito: "Só nós temos o poder de parar toda essa loucura. Vão para os protestos. Não tenham medo de nada. Eles não nos podem prender a todos.”
ElogiosO presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, dedicou palavras de agradecimento a Marina Ovsyannikova no discurso noturno.
Kira Yarmysh, porta-voz do líder da oposição preso, Alexei Navalny, elogiou Ovsyannikova no twitter: "Uau, essa rapariga é incrivel".
Entretanto, a conta da jornalista desapareceu do Twitter. A página de Marina Ovsyannikova aparece com erro.
Twitter de Marina Ovsyannikova
No Facebook, e a ser a conta verdadeira, a imagem de perfil conta com mais de 45 mil comentários e 6,3 mil partilhas, muitos elogiando-a pela coragem.
"És uma heroína. Muito obrigado", diziam numa partilha.
https://www.facebook.com/profile.php?id=100011086090322
A agência de notícias estatal, Tass, adiantou que Marina pode enfrentar acusações por desacreditar as forças armadas, citando a lei aprovada a 4 de março, que proíbe a "disseminação de notícias falsas".
A TV estatal continua a ser a principal fonte de notícias para muitos milhões de russos e segue de perto a linha do Kremlin. Marina Ovsyannikova foi a primeira funcionária dos media a enfentá-los, denunciando publicamente a guerra.
Outros meios de comunicação social russos tingiram a mensagem na placa de Ovsyannikova ao noticiarem o incidente.
De acordo com a Reuters, Ravina Shamdasani, porta-voz de direitos humanos da ONU, pediu às autoridades russas para que a manifestante do canal estatal russo não seja punida por exercer o direito à liberdade de expressão: "As autoridades russas deveriam garantir que Marina Ovsyannikova não enfrente represálias por exercer o seu direito à liberdade de expressão", observou numa conferência de imprensa.
O Kremlin veio afirmar já hoje, terça-feira, que as ações de uma mulher que interrompeu o noticiário transmitido em direto na TV estatal russa Channel One na noite de segunda-feira para denunciar a guerra na Ucrânia equivalem a um ato de "vandalismo".