Duplo impacto dos incêndios. Mais carbono e menor capacidade de absorção

por Carla Quirino - RTP
Bombeiros trabalham para extinguir incêndio florestal na área da Reserva Biológica de Contagem, em Brasília, no Brasil, 24 de setembro de 2024. Adriano Machado - Reuters

Cada incêndio florestal tem um impacto duplo no clima global, aponta o mais recente estudo liderado pelo Serviço Nacional de Meteorologia do Reino Unido, divulgado esta quinta-feira. A investigação sublinha que os incêndios florestais estão a acelerar a emissão de carbono dos ecossistemas, reduzindo a capacidade do planeta para armazenar dióxido de carbono. O que complica os esforços para atingir as metas climáticas globais.

“Os incêndios estão a reduzir a capacidade das florestas e outros ecossistemas de armazenar carbono, estreitando a nossa janela para manter o aquecimento global sob controlo”, afirma Chantelle Burton, principal autora do estudo, publicado na Nature Geoscience.

De acordo com a investigação liderada pelo Met Office - Serviço Nacional de Meteorologia do Reino Unido -, os incêndios florestais e a consequnte morte da vegetação já estão a afetar a forma de absorver o carbono do planeta, tornando mais difícil a capacidade para desacelerar o aquecimento global, antes de a Terra atingir os 1,5 °C de aquecimento.

“Com 1,3°C de aquecimento, já estamos a antecipar os impactos que os fogos estão a ter no armazenamento de carbono nos ecossistemas", disse Chantelle. Burton adverte que estes eventos “tornam a meta de 1,5°C do Acordo de Paris ainda mais crítica para evitar impactos crescentes”.
Dura realidade do presente
O estudo destaca como o fogo não é apenas um desafio futuro, mas uma realidade atual, isto porque os incêndios já estão a reduzir a capacidade das florestas e de outros ecossistemas de armazenar carbono das muitas fontes poluentes.

Os investigadores usaram modelos avançados de clima numa dimensão planetária para “explorar como os incêndios afetam a capacidade dos ecossistemas de armazenar carbono”.

Esses modelos pretendem simular como as plantas crescem, competem por recursos e respondem a mudanças ambientais, ao mesmo tempo em que levam em consideração os nutrientes de que precisam e como as mudanças climáticas impulsionam o comportamento do fogo, explicaram os especialistas.

Douglas Kelley, coautor e investigador do UK Centre for Ecology & Hydrology, sublinha que preocupação é imediata. 

“As nossas descobertas ressaltam uma realidade gritante: os incêndios não são apenas um problema para o futuro, eles estão a afetar o nosso planeta, já. Agora. À medida que as temperaturas aumentam, os incêndios estão cada vez mais a transformar os agentes naturais que captam carbono em fontes de emissões de carbono”.

Ao examinar os dados históricos e cenários futuros, os cientistas identificaram “limites críticos de temperatura onde os incêndios causam mudanças significativas na cobertura de árvores e no armazenamento de carbono”.

Os impactos nos armazenamentos de carbono podem acontecer mais cedo quando contabilizamos os processos de incêndio ausentes, e esses retornos adicionais já estão a enfraquecer os escoadores de carbono da terra”, insiste Burton.
Quente, seca e inflamável
A transformação em cinzas de florestas no Brasil, nos EUA, na Grécia, em Portugal, por exemplo, vem aclarar a aceleração da tendência do “limite crítico de temperatura” após o qual os incêndios causam mudanças significativas na cobertura de árvores e biosfera geral e no armazenamento de carbono.

Até mesmo o Círculo Polar Ártico registou as mais altas temperaturas nos dois anos últimos anos considerados os mais quentes da história da Terra, desde que há dados estudados.

Os autores advertem que essa tendência acelerada não só está a aproximar-se do “limite crítico de temperatura” como pode já ter ultrapassado, após o aumento de incêndios florestais e a acumulação do CO2.

De acordo com o estudo do Met OfficeSe, se o sistema da Terra já estava a ser afetado pelo uso do petróleo e carvão colocando as temperaturas globais a 1,3ºC mais altas do que na era pré-industrial, agora à medida que as temperaturas aumentam, as secas estão a tornar-se mais frequentes, as estações chuvosas ficam mais curtas e as florestas tornam-se mais vulneráveis ao fogo.

Em poucas palavras, a Terra está a tornar-se mais quente, mais seca e mais inflamável, reiteram os cientistas.

Os climatologistas deixam ainda mais um recado sobre a situação que já se revela "terrível":"Irá piorar até que a humanidade, particularmente no rico norte global, pare de queimar combustíveis fósseis”.
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