Covid-19 na China. Câmaras de vigilância apontadas às portas de quem está em quarentena
A China está a instalar câmaras de vigilância no exterior das residências de pessoas que estão em quarentena obrigatória devido à Covid-19. Apesar de o Governo desse país asiático não ter anunciado oficialmente a adoção desta medida, vários dirigentes locais admitiram estar a usar câmaras para economizar gastos com funcionários e para melhor controlarem a pandemia. Alguns habitantes afetados consideram esta decisão uma invasão de privacidade.
“Ter uma câmara à porta é uma enorme invasão de privacidade”, declarou Lahiffe à CNN. “Parece-me um massivo apoderamento de informação. E não sei até que ponto isso é legal”.
Este não é o único relato de cidadãos que viram câmaras a serem instaladas junto às suas portas de casa. De acordo com testemunhos a órgãos de comunicação social e publicações em redes sociais, a prática está a acontecer pelo menos desde fevereiro em várias cidades da China, apesar de o Governo nunca ter anunciado oficialmente que esta medida ia ser adotada para quem fosse obrigado a cumprir quarentena.
Alguns autarcas locais admitiram estar a avançar com este sistema. Responsáveis da cidade de Nanjing explicaram que os habitantes em quarentena estavam a ser monitorizados 24 horas por dia e que o uso de câmaras ajuda a “economizar gastos com funcionários e aumentar a eficiência do trabalho”.
População na China já lida há muito com a videovigilância
Atualmente não existe uma lei específica na China que regule o uso de câmaras de vigilância, mas estes dispositivos são já parte do dia a dia da vida pública nesse país asiático. São normalmente encontradas em passadeiras, à entrada de centros comerciais, em restaurantes, escolas ou transportes públicos.
Mais de 20 milhões destas câmaras foram instaladas por toda a China em 2017, de acordo com a estação de televisão pública chinesa CCTV. Outras fontes sugerem, porém, que o número terá sido muito superior. Um relatório da empresa IHS Markit Technology afirma que, em 2018, foram instalados 349 milhões de câmaras – número quase cinco vezes superior ao de câmaras existentes nos Estados Unidos, por exemplo. Segundo a empresa de tecnologia britânica Comparitech, é na China que se encontram oito das dez cidades mais vigiadas do mundo, com base no número de câmaras por cada mil pessoas.
O professor académico e perito no tema da privacidade Jason Lau explicou à CNN que, na China, a maioria da população já está habituada, desde muito antes do aparecimento do novo coronavírus, a viver na presença de sistemas de vigilância.
“As pessoas provavelmente assumem que o Governo já tem acesso a muitos dos seus dados, de qualquer das formas”, argumentou. “Se acreditarem que as medidas as vão manter a si próprias e à comunidade em segurança e que são do melhor interesse do público, não vão preocupar-se muito com a existência das mesmas”.
Câmaras instaladas no interior das casas
Na China há ainda quem tenha denunciado casos de instalação de câmaras de vigilância dentro das suas próprias habitações. William Zhou, funcionário público, regressou a casa na cidade de Changzhou depois de ter ido visitar a sua cidade natal no fim de fevereiro. No dia seguinte, um agente da polícia e um técnico terão ido ao seu apartamento instalar uma câmara que apontava para a porta de entrada, mas que ficou montada numa parede do interior da sua casa.
De acordo com o relato de Zhou à CNN, o polícia terá explicado que a câmara não seria instalada no exterior pois poderia ser vandalizada. Dois dias depois de Zhou ter apresentado queixa ao presidente da Câmara e ao centro local de controlo de epidemias, dois agentes do governo local foram a sua casa e pediram-lhe que compreendesse e cooperasse com os esforços de controlo da Covid-19.
Os funcionários garantiram ainda que a câmara apenas captaria imagens quando a porta do apartamento fosse aberta e que não seria gravado qualquer áudio. Ainda assim, Zhou diz ter sentido o “impacto psicológico” causado pelo dispositivo e considerou a medida uma invasão da sua privacidade.
As câmaras de videovigilância não são a única ferramenta tecnológica utilizada pela China para controlar a pandemia. O país desenvolveu uma aplicação para smartphones que fornece a cada utilizador um código QR com uma cor específica conforme os sintomas que registou ou as pessoas com quem esteve em contacto: verde para quem não precisa de se isolar, amarelo para quem deve cumprir sete dias de isolamento e vermelho se forem necessários 14 dias de isolamento.
O novo coronavírus começou na cidade chinesa de Wuhan em dezembro do ano passado e propagou-se por todo o mundo. Até ao momento já foram infetadas mais de três milhões de pessoas, das quais 211 mil morreram. O número de recuperados fixa-se agora nos 868 mil.