A vitória da extrema-direita nas eleições legislativas dos Países Baixos insere-se numa tendência que varre os países europeus, onde estão a cair os `cordões sanitários` aos extremistas, alertaram analistas consultados pela Lusa.
"A vitória de [Geert] Wilders não pode ser interpretada individualmente como apenas uma vitória da extrema-direita nos Países Baixos", frisou à Lusa Dharmendra Kanani, porta-voz do grupo de reflexão Friends of Europe.
Na opinião do analista, a extrema-direita está a crescer em todos os países da União Europeia (UE) a um ritmo sem precedentes nas últimas décadas e "o tempo em que os partidos convencionais conseguiam fazer um `cordão sanitário` para encapsular os partidos extremistas há muito que acabou".
"É altura de levar a sério este movimento e perceber que é mais do que simplesmente cidadãos descontentes com as `políticas do costume`", alertou Dharmendra Kanani.
Nos Países Baixos, o "panorama político fragmentado" ainda pode impedir a chegada ao governo do Partido para a Liberdade (PVV), mas a `paisagem política` de um país pode alterar-se em pouco tempo.
"Está longe dos 76 deputados necessários para uma maioria. Isto significa que a maioria da população é contra um extremista no poder, mas está dividida sobre quem colocar lá. Contudo, um sucesso de Wilders [nas negociações para conquistar uma maioria e chegar ao Governo] não está livre de consequências por toda a Europa", perspetivou o analista.
As posições de Geert Wilders coincidem com algumas das difundidas pelo primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, como a redução do apoio à Ucrânia (na sequência da invasão russa), e o líder da extrema-direita neerlandesa também é favorável à abolição da legislação climática do país, à saída do Acordo de Paris (para redução das emissões) e quer avançar com um referendo à permanência dos Países Baixos na UE.
Elizabeth Kuiper, diretora do European Policy Centre, advertiu que a vitória de Wilders nas eleições legislativas neerlandesas "deve servir de aviso para toda a União Europeia".
"Depois do resultado das eleições na Polónia, onde um liberal, um partido pró-europeu, venceu, as pessoas pensaram que o jogo tinha virado", considerou a analista.
As posições de Wilders podem representar problemas para a coesão europeia, somadas a outras contrárias ao caminho seguido pela UE, por exemplo de Itália, Hungria e Eslováquia.
"Mas isso vai depender muito da capacidade de Wilders para formar Governo", advogou, sendo uma coligação necessária e incerto "que os outros partidos querem arriscar governar com um partido que nunca esteve no poder".
Mais preocupante pode ser o número de países que tem eleições legislativas no próximo ano, como Portugal, Bélgica e a Áustria, advogou Elizabeth Kuiper: "Há um risco de que estes países se tornem mais fechados e que as trajetórias mudem por alterações no Governo. Isto, normalmente, não resulta bem para a UE".
Com a incerteza a ser a único elemento certo quanto à trajetória política da UE nos próximos anos, Dharmendra Kanani considerou que a Europa tem de fazer uma reflexão e agir antes que seja tarde demais.
"Hoje na Europa a extrema-direita está a ganhar uma tração e a conseguir percentagens de votos que há dez anos seriam impensáveis. O centro, o centro-esquerda e os moderados têm de se lembrar o que aconteceu há 100 anos quando muitos ficaram simplesmente a olhar", concluiu.