O ministro português dos Negócios Estrangeiros pediu o afastamento do presidente do Eurogrupo. Desde Washington, Augusto Santos Silva apresentou a primeira reação do Governo português depois de Jeroen Dijsselbloem ter dito que os países do sul não podem "gastar o dinheiro todo em álcool e em mulheres".
A resposta lusa surge depois de o Presidente do Eurogrupo, em declarações ao jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung, ter dito que os gastos excessivos dos países do Sul da Europa se devem a "copos e mulheres".
O também ministro holandês das Finanças resumiu desta forma uma das razões que conduziram países como Portugal à crise. O presidente do Eurogrupo conclui que não se pode gastar o dinheiro em copos e mulheres e depois vir pedir ajuda.
Augusto Santos Silva considera que estas "são declarações muito infelizes e, do ponto de vista português, absolutamente inaceitáveis."
"Há, por um lado, o aspeto de uma graçola que usa termos que hoje já não são concebíveis, essa ideia de gente que anda a gastar dinheiro com vinho e mulheres é uma forma de expressão que, com toda a certeza, não é própria de um ministro das Finanças europeu", explicou o chefe da diplomacia lusa.
Augusto Santos Silva considera que Jeroen Dijsselbloem “continua passados estes anos todos sem compreender o que verdadeiramente se passou”. “O que se passou com países como Portugal, Espanha ou Irlanda não foi termos gasto dinheiro a mais”, começou por explicar.
“O que aconteceu foi que nós, como outros países vulneráveis, sofremos os efeitos negativos da maior crise mundial desde os tempos da grande depressão e as consequências da Europa e a sua união económica e monetária não estar suficientemente habilitada com os instrumentos que nos permitissem responder a todos aos choques que enfrentamos", defendeu.
Para o chefe da diplomacia nacional, "está manifesto que o senhor Dijsselbloem não tem nenhumas condições para permanecer a frente do Eurogrupo".
"Quem pensa assim, pensa erradamente e infelizmente o presidente do Eurogrupo já nos habituou demasiado a ver erradamente as coisas e a ver menos do que devia, ou mesmo desvalorizar, o esforço que os países estão a fazer", acrescentou."Está manifesto que o senhor Djisselbloem não tem nenhumas condições para permanecer a frente do Eurogrupo"
Santos Silva disse ainda que no caso português o ajustamento que foi feito "foi à custa de muitos sacrifícios que o povo sofreu com uma resiliência e resistência absolutamente assinaláveis".
"Devemos valorizar o esforço dos países que conseguiram ultrapassar a crise e não estar a desprezá-los. Com toda a franqueza, é uma coisa que não fica bem a ninguém", concluiu o ministro português.
“Copos e mulheres”
As declarações de Jeroen Dijsselbloem foram publicadas já no passado domingo mas só esta terça-feira foram amplamente divulgadas. O Presidente do Eurogrupo foi confrontado no Parlamento Europeu e recusou desculpar-se.
Dijsselbloem tinha declarado ao diário alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung que quem exige a solidariedade “também tem obrigações". Não posso gastar todo o meu dinheiro em licor e mulheres, e depois pedir ajuda. Este princípio aplica-se a nível pessoal, local, nacional e inclusivé a nível europeu", defendeu.
A declaração, emitida num contexto em que se falava da crise das dívidas soberanas, levantou imediatamente furiosas críticas no Parlamento Europeu.
Segundo o diário El Pais, o eurodeputado do Partido Popular espanhol Esteban González Pons reclamou a demissão de Dijsselbloem como chefe do Eurogrupo. Outros dois deputados do Estado espanhol, Ernest Urtasun e Gabriel Mato, exigiram-lhe um pedido de desculpas.
Mas nem só a direita usou a declaração como arma de arremesso contra Dijsselbloem: também o seu correligionário social-democrata espanhol Javier López o acusou de ter assimilado "a mentalidade populista de Geert Wilders".
O concorrente de Dijsselsbloem ao lugar de chefe do Eurogrupo, o também espanhol Luis de Guindos, foi mais moderado mas não deixou de considerar a declaração "infeliz" e de acrescentar que certamente "o próprio Dijsselbloem está arrependido das suas palavras".
Mas, bem pelo contrário, Dijsselbloem reafirmou o que dissera, como prova de que leva "muito a sério" o cumprimento das regras orçamentais. Apenas tentou apaziguar os ânimos dizendo que não queria ofender ninguém e não se referia a nenhum país em particular.
PS exige ação dos socialistas europeus
O PS pediu já ao Partido Socialista Europeu a condenação "imediata" das declarações "ultrajantes" proferidas pelo ministro holandês Jeroen Dijsselbloem e a retirada de apoio político a uma sua recandidatura ao cargo de presidente do Eurogrupo.
Esta posição consta de uma carta enviada por Ana Catarina Mendes ao presidente do PES, Sergei Stanishev. Para a secretária-geral adjunta do PS, as declarações do presidente do Eurogrupo sobre os países do sul da Europa "são ultrajantes e contrárias aos valores fundamentais do projeto europeu".
Dijsselbloem é membro do PvDA holandês, partido de centro-esquerda que faz parte do mesmo grupo europeu que o PS.
"Merecem uma forte e imediata condenação da nossa família política. As palavras utilizadas são ofensivas, mesmo xenófobas, e não podem ser toleradas por nenhum partido político europeu e especialmente pelo nosso Partido Socialista Europeu", frisou.
Na carta, à qual a agência Lusa teve acesso, a "número dois" da direção do PS refere também que, "infelizmente, não é a primeira vez que o presidente do Eurogrupo expressa publicamente a sua visão estreita contra a solidariedade e unidade dos Estados-membros da União Europeia".
"É tempo de a nossa família política reagir, condenando estas palavras vergonhosas e distanciar o PSE e todos os nossos partidos das opiniões do senhor Jeroen Dijsselbloem", defende.
c/ Lusa