Conflito armado entre islamitas e milícias do general Haftar ameaça a Líbia

por Graça Andrade Ramos, RTP
O general Kalifa Haftar pegou em armas na semana passada para enfrentar as milícias extremistas islâmicas acusando o Governo líbio de passividade e até mesmo de usar os extremistas Esam al-Fetori

O grupo islamita Leões do Monoteísmo, inspirado na al Qaida, ameaçou retaliar contra o general Haftar, comandante no exército regular que pegou em armas contra o extremismo islâmico no país. O general Kalifa Haftar diz ter tido, nos anos 90, o apoio norte-americano para derrubar Kadaffi. Afirma ainda que o seu grupo, o auto-denominado Exército Nacional da Líbia, está a enfrentar o extremismo islâmico, uma vez que o Governo não se esforça por o fazer. Esta segunda-feira o general recebeu o apoio das tropas da base da força aérea de Tobruk.

Perante a passividade do Governo, a situação na Líbia ameaça degenerar rapidamente num conflito armado declarado.

Kalifa Haftar acusa aliás o Governo de usar "extremistas islâmicos" e iniciou sexta-feira uma ofensiva unilateral contra grupos armados em Bengazi que terá feito pelo menos 70 mortos.

Domingo agiu contra o próprio Parlamento. Governo líbio sem reação

O Governo interino da Líbia condenou o ataque ao Parlamento mas de resto ignorou as ações do Coronel Fernana contra o Parlamento e a sua declaração ao final do dia de domingo.
A agência líbia de notícias, LANA, citou mesmo o ministro da Educação que negou que os exames do final do ano estivessem suspensos. O ministro instou ainda os alunos a ir esta segunda-feira às aulas como todos os dias.


Haftar contesta a escolha do empresário Ahmed Miitig, designado primeiro-ministro no dia quatro de maio, numa sessão agitada que dividiu o Parlamento líbio.

Domingo dia 18, horas depois de Miitig apresentar o seu executivo, o coronel Mohktar Fernana, comandante da polícia militar com ligações a Haftar, entrou em Tripoli à frente de uma coluna armada e tomou de assalto o edifício parlamentar, pondo em fuga os deputados.

Durante o resto do dia a cidade foi palco de tiroteios.

As tropas de Fernana terão ainda atacado milícias islamitas na capital. Há relatos de que as milícias de al-Qaaqaa e Sawaaq, as maiores em Tripoli, apoiaram Haftar, apesar de estarem sob mandato governamental.
Ameaça islamita
Os Leões do Monoteísmo prometeram fazer os apoiantes de Heftar pagar pelos ataques.

"Começaram uma guerra que vão perder," ameaçou um militante mascarado que se identificou como Abu Musab al-Arabi, num vídeo publicado no website do grupo.

No comunicado, os Leões do Monoteísmo prometeram igualmente lutar ao lado de outros grupos extremistas islâmicos alvo de Heftar.

Um responsável do Comando de Operações da Revolução Líbia, um organismo que coordena e supervisiona os grupos de milícias na capital, afirmou sob anonimato à agência APTN, que as tropas de Haftar "raptaram" cerca de 20 deputados e responsáveis governamentais. Não foi possível confirmar a informação.
Parlamento "suspenso"
Ao fim do dia de domingo, Fernana anunciou na televisão e em nome do exército, que o CNG estava suspenso e que o poder legislativo passava para as mãos do Comité dos 60, eleito em fevereiro para escrever a nova Constituição da Líbia.

Fernana garantiu também que não estava a realizar um golpe de estado e que o governo interino liderado por Abdallah Al-Thinni se mantinha em funções. Afirmou ainda ter o apoio do povo, o que foi de imediato contestado.

"O coronel Fernana está ligado às milícias de Zenten (cidade do sudoeste da Líbia) e ao general Haftar. Não representam ninguém e não têm autoridade para suspender o Parlamento" reagiu o deputado Ala Mgaryef ao jornal Le Monde.
Ofensiva de Heftar
Sexta-feira o Exército Nacional da Síria, do general Haftar, atacou grupos islamitas que procuravam controlar Bengazi, a segunda cidade líbia, numa operação que, de acordo com as autoridades, durou dois dias e se saldou por 70 mortos. Alguns relatórios apontam para o apoio da força aérea líbia à ofensiva de Haftar. Centenas de civis foram convidados a abandonar Bengazi.

Segunda-feira a violência regressou à cidade com o disparo de vários obuses na zona do aeroporto, encerrado por razões de segurança desde sexta-feira.

Dois dias depois de Bengazi foi o assalto ao Parlamento e o anúncio da sua dissolução. Até agora é impossível perceber quem, entre as milícias e exército, apoia o general Haftar.A ofensiva de Haftar ecoa um descontentamento latente na sociedade líbia, com a ineficácia do seu Governo para impor a ordem e dominar os diferentes grupos armados. Estes governam regiões inteiras como autênticos feudos, divididos ao longo de linhas étnicas, tribais e religiosas, sem serem molestados pelo exército.

A tentativa dos islamitas de impor as suas leis e a ação dos seus grupos armados, que impede a estabilização do país, tem estado a exarcebar os secularistas líbios e grupos armados rivais que pretendem criar os seus próprios feudos.
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