Clima, conflitos e liderança. O que se espera do G20 no Rio de Janeiro?

por Inês Moreira Santos - RTP
Ricardo Moraes - Reuters

A cimeira do G20 começa esta segunda-feira no Rio de Janeiro, onde se espera que sejam discutidas reformas das instituições internacionais, a transição energética e a adesão a uma aliança contra a fome. A pouco mais de dois meses da tomada de posse de Donald Trump, os conflitos na Ucrânia e no Médio Orientes e as alterações climáticas também estarão em debate entre os chefes de Estado e de governo das maiores economias do mundo, incluindo o ainda presidente norte-americano Joe Biden e o líder chinês Xi Jinping.

Os líderes do grupo do G20 e dos países convidados, incluindo Portugal, debatem esta segunda-feira a entrada numa aliança global contra a fome e reformar nos organismos internacionais. O Rio de Janeiro acolhe a cimeira de dois dias, que decorrerá no Museu de Arte Moderna da cidade e será presidida pelo chefe de Estado brasileiro.O primeiro-ministro português estará também no Brasil e intervém na cimeira já esta segunda-feira, na qual Portugal participa como país convidado.

Luís Montenegro vai intervir na primeira sessão de trabalho da cimeira, dedicada à inclusão social. De acordo com o programa, o chefe de Governo chegará ao Rio de Janeiro horas antes do arranque da cimeira.

Em entrevista ao jornal brasileiro Folha de São Paulo, divulgada no sábado, o primeiro-ministro manifestou apoio às três prioridades definidas pelo Brasil para a cimeira - o combate à fome e à pobreza, a transição energética e a promoção do desenvolvimento sustentável, e a reforma da governação global –, “que convergem com as prioridades da participação portuguesa”.

“Tal é evidente no apoio que demos, desde a primeira hora, à criação da Aliança contra a Fome e a Pobreza, da qual somos membros fundadores e para a qual decidimos contribuir financeiramente”, acrescentou, dizendo esperar que o G20 no Brasil se consagre como “um momento crucial” na “construção de um mundo mais justo e sustentável".

Acompanhado pelo ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, o chefe do Governo português participará precisamente no lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza – iniciativa que visa coordenar parcerias técnicas e financeiras para apoiar a implementação de programas nacionais nos países que aderirem e o financiamento de políticas públicas para a erradicação da fome e da pobreza no mundo. De seguida, Luís Montenegro participará na primeira sessão de trabalho da reunião G20, dedicada também à “Inclusão Social e Luta Contra a Fome e a Pobreza”.

Recorde-se que, no início deste mês, Rangel declarou que Portugal se associa à Aliança do G20 Contra a Fome e a Pobreza como membro fundador e que o faz "com grande empenho e entusiasmo".

Montenegro tem previstos ainda encontros bilaterais, antes da receção oferecida aos chefes de Estado e de Governo pelo presidente da República Federativa do Brasil, Lula da Silva. E na terça-feira, após terminar a cimeira do G20, o primeiro-ministro tem agenda no Rio de Janeiro centrada na comunidade e na língua portuguesas, programa idêntico ao de quarta-feira em São Paulo, regressando ainda nesse dia a Portugal.

Portugal participou durante este ano em mais de 100 reuniões do G20 a convite do Brasil, a nível ministerial e nível técnico, culminando com a cimeira de chefes de Estado e de Governo, no Rio de Janeiro.
Aliança contra a fome e reformas nas instituições
Depois de receber os chefes de Estado e de Governo, ao início da manhã (hora local), Lula da Silva vai lançar oficialmente a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza e apresentar lista de países que já aderiram ao plano.

A iniciativa prevê a criação de uma plataforma global onde os países poderão incluir os próprios programas de erradicação da fome e da pobreza, estabelecendo planos e metas, e os membros da Aliança ajudarão a atingir esses objetivos com contribuições financeiras. A plataforma tem como finalidade também poder partilhar experiências, tecnologias e conhecimentos sobre os planos bem-sucedidos.

Mais de 700 milhões de pessoas enfrentaram a fome em 2023, um em cada 11 habitantes no mundo e um em cada cinco em África, de acordo com as Nações Unidas.

Ao início da tarde, o tema da cimeira passa para outro dos grandes objetivos da presidência brasileira no G20: a reforma da governança global.

Lula da Silva tem reivindicado a presença de países do chamado Sul Global no Conselho de Segurança da ONU e reformas das instituições financeiras como o Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Organização Mundial do Comércio (OMC).
Encontros bilaterais, conflitos e clima
Entre os principais líderes presentes destaca-se o presidente cessante dos Estados Unidos, Joe Biden, e o líder chinês, Xi Jinping.

O presidente norte-americano já está no Brasil e fez uma visita histórica à Amazónia, tendo sobrevoado a floresta, no domingo, depois de ter aterrado em Manaus. Biden esteve também reunido com organizações não-governamentais que têm trabalhado na defesa da região amazónica.

Antes da viagem para o Rio de Janeiro, Joe Biden quis tornar-se o primeiro presidente em exercício dos EUA a visitar a Amazónia e fez questão de o dizer no discurso depois da visita.

“Orgulho-me de estar aqui hoje, o primeiro presidente dos EUA a visitar a floresta tropical amazónica, com o compromisso de preservar esta floresta tropical”, afirmou, anunciando ainda medidas em defesa do ambiente e disse que deixa bases fortes ao sucessor Donald Trump.

O secretário-geral da ONU apelou no domingo aos líderes do G20 para que assumam a sua “liderança” e façam “compromissos” para permitir “um resultado positivo na COP29”, a conferência sobre o clima em Baku onde as negociações sobre o assunto estão suspensas há uma semana. Segundo António Guterres, os objetivos para o desenvolvimento sustentável descarrilaram.
Os membros do G20 (19 países, mais a União Europeia e a União Africana) representam 85 por cento do PIB global e 80 por cento das emissões de gases com efeito de estufa. Nos últimos dias na COP29, contudo, ficou a incerteza quanto à atitude que o presidente argentino Javier Milei, ultraliberal e cético climático, irá adoptar.

Buenos Aires levantou algumas objeções e não assinará “necessariamente” o texto
, esclareceu à AFP o chefe da delegação argentina Federico Pinedo, sem acrescentar mais detalhes.

Já o presidente chinês afirmou esta segunda-feira que quer "melhorar ainda mais" as relações entre a China e o Brasil, onde chegou no domingo para uma visita de Estado e para a cimeira do G20.

Xi Jinping planeia abordar com o homólogo brasileiro formas de "melhorar ainda mais as relações entre a China e o Brasil, para promover complementaridades entre as estratégias de desenvolvimento dos dois países e questões internacionais e regionais de interesse comum", informou a agência noticiosa oficial chinesa Xinhua.

"A visita vai reforçar ainda mais a confiança mútua estratégica entre os dois países e aprofundar os intercâmbios e a cooperação em vários domínios", disse Xi, citado pela agência.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil, absorvendo 30 por cento do total das exportações brasileiras. Semicondutores, telemóveis e medicamentos são os principais produtos chineses exportados para o país sul-americano. E desde que regressou ao poder em 2023, Lula da Silva tem-se empenhado num delicado ato de equilíbrio, procurando aprofundar os seus laços com a China ao mesmo tempo que melhora as relações com os Estados Unidos.
Temas fraturantes
A invasão russa da Ucrânia e o conflito no Médio Oriente também continuam a fraturar a comunidade internacional. Brasil e China, por exemplo, estão a tentar mediar o conflito na Ucrânia, mas recusam-se a condenar a Rússia pela invasão.

A cimeira do G20 começa precisamente um dia depois de a Administração de Biden ter dado autorização à Ucrânia para atacar o território russo com mísseis de longo alcance fornecidos por Washington.

O principal ausente será o presidente russo, Vladimir Putin, que estará representado pelo chefe da diplomacia russa, Sergei Lavrov, já que o Tribunal Penal Internacional emitiu um mandado de prisão contra Putin por crimes de guerra no conflito na Ucrânia.

Ao canal GloboNews, o anfitrião do G20 admitiu que quer deixar os conflitos de lado, "porque senão não vamos discutir as outras coisas que são importantes" para "os pobres, as pessoas invisíveis do mundo”.

Lula pretende destacar o lançamento da Aliança Global contra a fome e a pobreza e pressionar pela tributação dos mais ricos. Os ministros das Finanças do G20 comprometeram-se a “cooperar” neste assunto no Rio de Janeiro, em julho, e em Washington, em outubro.

As reuniões no Rio de Janeiro vão ser presididas pelo chefe de Estado, Lula da Silva.


Para além dos representantes dos países membros do grupo, mais a União Europeia e a União Africana, são ainda esperados representantes de 55 países ou organizações internacionais.

O Brasil assumiu a 1 de dezembro de 2023, e até 30 de novembro deste ano, pela primeira vez, a presidência do G20 sob o tema “Construindo um Mundo Justo e um Planeta Sustentável”. Na sua presidência convidou 19 países, incluindo Portugal, Angola, Moçambique e Espanha, e organizações como a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Os membros do G20 – EUA, China, Alemanha, Rússia, Reino Unido, França, Japão, Itália, Índia, Brasil, África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Canadá, Coreia do Sul, Indonésia, México, Turquia e, ainda, a União Europeia e a União Africana – representam as maiores economias, cerca de 85 por cento do Produto Interno Bruto mundial, mais de 75 por cento do comércio mundial e cerca de dois terços da população mundial.
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