China pode registar um milhão de mortes com fim da política "zero covid"

por Joana Raposo Santos - RTP
Na segunda-feira, a China registava um total acumulado de 5.242 mortes associadas à covid-19 Aly Song - Reuters

O fim abrupto da política de zero casos de covid-19 na China está a levantar preocupações sobre a propagação da doença entre a população mais vulnerável e sem vacinas. Caso este cenário se confirme, as mortes por SARS-CoV-2 podem chegar a um milhão neste país asiático, concluiu um estudo da Universidade de Hong Kong.

Quarentenas obrigatórias, rastreamento minucioso dos contactos e testagens em massa foram as principais medidas adotadas pelo Governo chinês ao longo dos últimos três anos para conter a disseminação da covid-19.

Foi apenas este mês que Pequim decidiu pôr fim à chamada “política de zero covid”, após intensos protestos da população contra as apertadas regras.

Agora, porém, vários especialistas estão preocupados com as consequências do fim abrupto das restrições, alertando para o facto de a população da China estar pouco preparada para lidar com a possível explosão de casos de covid-19.

Apesar de cerca de 90 por cento dos chineses terem já a vacinação completa, o país tem falhado em dar doses de reforço à população mais idosa, em aumentar a capacidade hospitalar e em adquirir suficientes medicamentos antivirais, usados para tratar pessoas infetadas.
Um estudo lançado na semana passada por três professores da Universidade de Hong Kong prevê que o fim da política de zero covid possa resultar em 684 mortes por milhão de habitantes. Na população de 1,4 mil milhões da China, esta previsão aponta para um total de 964.400 mortes.

Segundo o estudo, o eventual aumento das infeções após o levantamento de restrições iria “provavelmente sobrecarregar muitos sistemas de saúde locais por todo o país”. Além disso, os peritos preveem que as hospitalizações seriam 1,5 a 2,5 vezes superiores à capacidade hospitalar.

Este cenário pode, no entanto, ser evitado. Para isso, basta que a China forneça rapidamente doses de reforço da vacina e abasteça o stock de medicamentos antivirais, de acordo com os especialistas da Universidade de Hong Kong.

Caso uma quarta dose da vacina alcançasse 85 por cento da população e a medicação antiviral chegasse a 60 por cento, o número de mortes poderia ser reduzido em 26 a 35 por cento, alerta o estudo, que foi parcialmente financiado pelo Centro Chinês para o Controlo e Prevenção de Doenças e pelo Governo de Hong Kong.
Trabalhadores de crematórios falam em sobrelotação
Na segunda-feira, a China registava um total acumulado de 5.242 mortes associadas à covid-19 desde o início da pandemia, o que representa uma pequena fração da sua população de 1,4 mil milhões.

Nesse dia foram registadas duas novas mortes, ambas em Pequim, que enfrenta agora um dos piores surtos desde o início da pandemia, em 2019. Estes dois óbitos foram os primeiros registados oficialmente desde 7 de dezembro, quando começou o levantamento das rígidas restrições.

O número pode, no entanto, ser superior ao divulgado pelas autoridades. Na semana passada, trabalhadores de crematórios na China expuseram uma situação de sobrelotação, que os obriga a trabalhar sem descanso e mesmo doentes, devido a uma vaga sem precedentes de casos de covid-19, que deverá atingir áreas rurais em breve.

"Cremamos 20 corpos por dia, a maioria idosos. Muitas pessoas ficaram doentes recentemente", disse à France-Presse um funcionário de um crematório em Pequim.

O organismo chinês responsável pela luta contra a pandemia já apelou aos governos locais a aumentarem a vigilância e a atenção médica para as pessoas que estão a começar a viajar para visitar as famílias nas zonas rurais, devido ao Ano Novo Chinês, em janeiro.

As indicações são para essas pessoas usarem máscara e evitarem o contacto com idosos e para as autoridades locais monitorizarem os seus movimentos, mas não é mencionada a possibilidade de isolamento ou quarentena.

c/ agências
PUB