Era um dos mais conhecidos criminosos nos Estados Unidos e liderou uma espécie de culto, responsável por vários e hediondos homicídios nos finais da década de 60. Morreu este domingo ao fim de quase meio século de prisão.
No obituário de Charles Manson, que morreu este domingo de causas naturais, aos 83 anos, o jornal The Guardian fala de “um fascínio mórbido” que permanece.
Charles Manson esteve na origem de um dos crimes mais aterradores em solo norte-americano. Não tendo cometido nenhum homicídio em termos práticos, promoveu uma espécie de culto hippie e racista, a “Família Manson”.
Com a ajuda de drogas pesadas, motivou o grupo de 12 seguidores a cometer vários homicídios durante o verão de 1969, incluindo a atriz Sharon Tate, mulher do realizador Roman Polanski, grávida de oito meses naquela altura. No total, Manson é considerado responsável pelo assassinato de pelo menos seis pessoas, não havendo no entanto qualquer prova de que tivesse estado no local dos crimes.
“Nas paredes, a escrita bizarra com sangue de palavras como RISE, HELTER SKELTER, e PIGGIES. Foram encontradas várias balas no local – bem como cordas, fronhas de almofada, garfos e facas”, conta o extenso artigo especial então publicado pela Rolling Stone. Na porta, a palavra PIG (porco) surgia escrita com sangue.
Nesse mesmo dia, a 9 de agosto de 1969, acabariam por morrer mais quatro pessoas nas proximidades. Na noite seguinte, o casal Rosemary e Leno LaBianco foram assassinados. Ao culto de Manson foi também atribuída a morte de Gary Hinman, um músico ligado ao mundo da droga assassinado no mês anterior.
Várias entrevistas e trabalhos documentais realizados após os crimes revelam que Manson terá tentado através destes crimes a eclosão de uma guerra apocalíptica nos Estados Unidos, numa década de enormes tensões raciais. A morte de Martin Luther King, no ano anterior, tinha levado a luta pelos direitos das comunidades afro-americanas até um novo expoente.
A profecia, defendia Manson, era inspirada pela música Helter Skelter, dos Beatles. Através da música de 1968, o psicopata antevia um conflito em larga escala, pretendendo que os crimes cometidos no verão seguinte fossem atribuídos ao Partido das Panteras Negras, um partido revolucionário e nacionalista de defesa dos negros.
O obituário da BBC recorda que Manson chegou a convencer os seus seguidores, sobretudo mulheres, de que era a reencarnação de Jesus Cristo.
Se a magnitude e a abominação destes crimes projetava grandes consequências, a sua origem terá estado em algo tão simples como a perceção de uma carreira falhada enquanto músico e uma desavença com Dennis Wilson, baterista do grupo Beach Boys, sobre a autoria do título de uma música, Never Learn Not to Love.
Na verdade, a vida de Charles Manson desde o nascimento, em 1934, no Estado do Ohio, até aos homicídios da década de 60, tinha percorrido várias prisões, centros de detenção e de correção.
Obsessão pela música
Criado no seio de uma família problemática, a mãe, Kathleen Maddox, tinha apenas 16 anos quando Manson nasceu. O primeiro nome com que foi batizado foi “No Name Maddox”, recebendo algumas semanas depois o nome Charles.
Rejeitado pela família, foi colocado em várias instituições durante a infância e aos 13 anos já cometia os primeiros crimes, desde pequenos roubos em lojas ao roubo de carros, alguns anos mais tarde.
Depois de uma fuga da prisão, um casamento falhado e o prolongamento de pena, Manson chega a 1967, com 32 anos, tendo vivido mais de metade da sua vida em prisões ou instituições. Em 1968, Manson foi rejeitado por um produtor que residia na casa que viria a estar ocupada pela família Polanski em agosto.
Dada a natureza e magnitude dos crimes, Charles Manson e a sua seita são condenados à morte em 1971. No ano seguinte, o estado da Califórnia suspende a aplicação da capital e a pena dos criminosos passa a perpétua.
Desde então, passou por várias prisões em quase meio século de vida, incluindo onze anos em solitária. A obsessão pela música não esmoreceu e ainda em 2009 tentou contactar Phil Spector, um produtor a cumprir pena na mesma prisão. Todos os contactos foram rejeitados.
Nos anos 80, Manson tinha contactado Henry Rollins, músico e produtor que também esteve detido. Décadas depois, Rollins admitia que concordou em ajudar o criminoso, tendo gravado em parceria um álbum que nunca viria a ser editado.
Os Guns N’ Roses chegaram mesmo a gravar uma música composta por Charles Manson. Look at Your Game, Girl, escrita pelo criminoso em 1967, foi incluída no álbum Lie: The Love and Terror Cult.
Perante a possibilidade de Manson enriquecer à custa dos direitos de autor, Bartek Frykowski, filho de uma das vítimas de 1969 – o pai fora esfaqueado 51 vezes – amealhou os direitos com o pagamento de 62 mil dólares por cada milhão de álbuns vendidos.
Charles Manson teve dois filhos. Charles Manson Junior, nascido do primeiro casamento, suicidou-se em 1993. O segundo filho, Valentine, nasceu da relação com Mary Brunner, que viria a ser a primeira mulher a integrar o culto assassino. Em 2015, Charles Manson pediu licença para casar com Afton Elaine Burton, uma seguidora do culto com 26 anos, mas o matrimónio não foi autorizado.