Após um longo debate na noite de segunda-feira, o primeiro-ministro britânico sofreu uma nova derrota depois de ter sido rejeitado, pela segunda vez, o pedido de eleições antecipadas. Esta foi a última sessão após a suspensão de cinco semanas do Parlamento. A oficialização da prorrogação foi recebida com protestos por parte dos deputados da oposição.
Para que a legislação avançasse, era necessário o apoio de dois terços do total dos membros da Câmara dos Comuns, ou seja, 434 votos. Apenas foram recolhidos 293, depois de os partidos da oposição se terem unido contra Johnson e se absterem.
Na passada quarta-feira, a moção para a marcação de eleições antecipadas para 15 de outubro tinha sido igualmente rejeitada, com o executivo a recolher apenas 298 votos a favor.
O debate foi ainda marcado por uma intensa troca de argumentos entre Boris Johnson e Jeremy Corbyn, líder dos trabalhistas. Num discurso centrado no ataque ao líder da oposição, o primeiro-ministro britânico, num tom irónico, acusou Corbyn de ser o “primeiro líder da oposição da história da democracia do nosso país a recusar o convite para uma eleição”. Johnson insinuou que o Partido Trabalhista votou contra as eleições antecipadas porque tem consciência que sairá derrotado enquanto estiver sob a liderança de Corbyn.
Apesar de já ter anunciado publicamente que quer eleições gerais, o líder do Partido Trabalhista reiterou que só votará favoravelmente num cenário de eleições quando estiver afastada a hipótese da saída do Reino Unido da União Europeia sem acordo.
“Eu quero uma eleição, estamos ansiosos por uma eleição, mas, por mais que desejemos, não estamos preparados para impor o desastre de um não acordo à nossa sociedade, nossos empregos, nossos serviços ou mesmo nossos direitos”, afirmou Corbyn durante a sessão parlamentar.
“Já uma vez instei a câmara a confiar no povo, mas mais uma vez a oposição acha que ela é que sabe”, afirmou Johnson. No final, o primeiro-ministro lamentou que a oposição, "por duas vezes, tenha negado ao povo britânico uma palavra no que vai acontecer".
“Não vou pedir um adiamento do Brexit”
O adiamento da data da saída do Reino Unido da UE não podia faltar na agenda desta reunião parlamentar.
Boris Johnson admitiu estar “farto” deste impasse e garantiu, mais uma vez, que não irá pedir um adiamento da data à UE. “Este Governo não adiará mais o Brexit. Não permitiremos que o enfático veredito do referendo seja lentamente sufocado por mais adiamentos calculados”, declarou Johnson.
Por sua vez, o líder trabalhista alegou que o discurso de Johnson é “uma indicação clara” de que o primeiro-ministro não vai cumprir a lei, promulgada durante a tarde de segunda-feira, que determina que peça um adiamento da saída a Bruxelas caso não seja aprovado um acordo, nem autorizado um “no-deal” Brexit até 19 de outubro.
Parlamento suspenso em cenário caótico
O debate parlamentar só terminou depois da uma da manhã com a oficialização da suspensão do parlamento até 14 de outubro.
Assim que se iniciaram os procedimentos para a prorrogação do parlamento, com um discurso de Sarah Clarke, funcionária e representante da rainha Isabel II, vários deputados da oposição gritavam “não” e “vergonha” enquanto seguravam folhas de papel onde se lia “silenciados”.
— Rosie Duffield MP (@RosieDuffield1) 10 de setembro de 2019
Os deputados da Câmara Baixa são chamados a deslocarem-se à Câmara Alta. Quando John Bercow, speaker da Câmara dos Comuns, se levantava para se deslocar à Câmara dos Lordes, vários deputados tentavam impedi-lo.De acordo com os registos históricos, esta é a mais longa suspensão em mais de 40 anos do parlamento.
Bercow, que durante a sessão já tinha anunciado que irá cessar funções, acabaria por quebrar o protocolo ao fazer um discurso onde demonstrou o seu descontentamento com o processo e deixou claro que “esta não é uma suspensão normal”.
"É uma das mais longas [suspensões] em décadas e representa, não só na opinião de muitos colegas, mas de inúmeras pessoas lá fora, um ato arbitrário de poder", afirmou Bercow, aplaudido pela oposição.
"Eu entendo perfeitamente porque grande números de deputados estão muito mais confortáveis permanecendo onde estão", acrescentou.
Esta foi, assim, a última sessão parlamentar após a suspensão de cinco semanas. A atividade parlamentar será retomada a 14 de outubro, duas semanas antes da data prevista para a saída do Reino Unido da UE. A oposição encara a suspensão do parlamento como uma manobra para obrigar a uma saída a 31 de outubro, ao limitar o tempo de debate.
“Espero que o primeiro-ministro reflita sobre a suspensão do parlamento para evitar que o Governo seja confrontado, porque é isso que ele está a fazer hoje", acusou Jeremy Corbyn.
Durante o debate de segunda-feira foi ainda aprovada uma moção que obriga o Governo a divulgar mensagens e documentos sobre a decisão da suspensão do parlamento.
c/Lusa