Barack Obama favorável a desistência de Joe Biden

por Graça Andrade Ramos - RTP
Barack Obama, quando era presidente dos EUA Reuters

De acordo com o Washington Post, o ex-presidente norte-americano, Barack Obama, pensa que as hipóteses de vitória de Joe Biden, nas eleições de 5 de novembro próximo, são atualmente diminutas e está convencido de que o atual inquilino da Casa Branca deveria refletir seriamente sobre a viabilidade da sua candidatura.

O jornal cita várias fontes sob anonimato, com quem Obama partilhou os seus receios nos últimos dias.

Em conversas privadas, Obama terá dito que o futuro da candidatura de Biden é uma decisão que só cabe a este. Mas, acrescenta o jornal, o ex-presidente tem estado no centro de conversas sobre o futuro da campanha.

Tem por exemplo atendido telefonemas de muitos democratas ansiosos, incluindo da ex-presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi.

A notícia de hoje é mais um recado dirigido a Biden, num momento em que o presidente, de 81 anos, foi forçado a isolar-se por ter testado positivo à Covid-19, precisamente quando tentava recuperar uma imagem de firmeza e de confiança após um debate desastroso contra Donald Trump há três semanas.

Desde esse debate, 22 congressistas democratas e um senador apelaram diretamente a Biden para que desista e dê lugar a outro candidato.

O presidente tem resistido a todos os pedidos, apesar das sondagens indicarem que está a atrasar-se nas preferência face ao rival republicano. O risco de derrota já levou doadores a congelarem os seus donativos se ele mantiver a candidatura, outra questão premente para Obama e outros líderes democratas.

Sondagens publicadas quarta-feira indicavam mesmo que qualquer outro democrata teria melhores resultados do que o atual presidente face a Trump. Outra análise de opinião, da Associated Press, revelou que dois terços do Partido Democrata querem vê-lo substituído.
Desistência por dias
Vários media norte-americanos anunciaram esta semana que Biden estará finalmente mais aberto a ouvir argumentos favoráveis à sua desistência e terá mesmo perguntado sobre as possibilidades da sua vice-presidente, Kamala Harris, contra Trump. 

Alguns altos responsáveis do Partido Democrata referiram ao Axios que o presidente poderá mesmo desistir dentro de dias, o mais tardar durante o próximo fim-de-semana.

Na verdade, a pressão estará a tornar-se intolerável. Mensagens privadas de líderes, amigos e doadores têm transmitido a Biden a ideia de que ele não poderá vencer, não irá conseguir alterar a perceção do público sobre a sua idade e sagacidade e não poderá conseguir maiorias no congresso, minando a sua confiança.

O recado, dado por Pelosi e pelos líderes democratas no Senado, Chuck Schumer, e na Câmara dos Representantes, Hakeem Jeffries, é claro. Se insistir na sua candidatura, Joe Biden poderá dar a Donald Trump uma vitória esmagadora e varrer de uma só vez o seu legado e as esperanças democratas.

A angústia pelo futuro está a levar o cerco a apertar-se, de tal forma que cada esforço de Biden para se reerguer está a ser minado pelo próprio partido.

Segunda-feira passada, numa entrevista à NBC, Biden garantiu que a sua acuidade mental está "muito bem e recomenda-se".

Horas depois, David Axelrod, estrategista das duas campanhas de Obama, afirmou na CNN que o presidente está a recusar reconhecer que está a perder para Trump.

"Existem nesta vida alguns factos imutáveis e estes ficaram dolorosamente óbvios naquele palco de debate e o presidente parece que ainda não aceitou isso. Não está a ganhar a corrida. Mais provavelmente, se olharmos para os dados e falarmos com pessoas pelo país inteiro, políticos de todo o país, é mais provável de perca por grande margem do que à tangente", afirmou.

Axelrod foi uma das primeiras vozes do Partido Democrata a defender a desistência de Biden e afirmou segunda-feira que o presidente ainda não fez nada desde o debate para inspirar confiança.

Num sinal de que poderá estar prestes a atirar a toalha ao chão, em entrevista à BET News, Biden afirmou quarta-feira que reconsideraria a sua decisão de continuar em caso de problema de saúde grave.
Manobras de bastidores

Barack Obama foi uma das primeiras vozes a defender o presidente, seu antigo número dois, após o confronto deste com Donad Trump, durante o qual Biden titubeou nas respostas e falou por vezes num fio de voz, com olhar vago.

O ex-presidente remeteu-se depois ao silêncio, deixando falar antigos apoiantes, ex-membros do seu gabinete e o ator George Clooney, o maior doador do Partido Democrata em Hollywood, que apelaram a Biden que desista.

Obama e Clooney estiveram juntos numa angariação de fundos, promovida por Clooney, em Los Angeles, depois do debate e, se Barack Obama não apoiou declaradamente a crítica do ator publicada dias depois, também não se distanciou dela.

A notícia desta quinta-feira sobre o que pensa Barack Obama foi contudo a mais direta até agora sem chegar ao envolvimento expresso do ex-presidente.

A estratégia usada por Obama, de manter um silêncio eloquente enquanto apoiantes falam por ele, tem sido adotada igualmente por Bill e Hillary Clinton.

Mais vocal tem sido Nancy Pelosi, que nas últimas semanas apelou publicamente Biden a refletir sobre a sua candidatura, dando uma subtil luz verde ao motim que se tem verificado nas hostes do partido.

De acordo com várias fontes, Pelosi terá pedido apelos públicos à desistência de Biden por parte dos representantes de estados onde a eleição tanto pode cair para os republicanos como para os democratas.

Para que a revolta não fosse tão notória, aos líderes de estados onde os democratas terão a eleição garantida, Pelosi terá solicitado maior discrição e contatos diretos com a Casa Branca. Fontes do jornal Politico dizem que estes tentaram chegar ao presidente, mas em vão, motivando os contactos diretos dos principais legisladores no Congresso, esta semana.
O dilema democrata
Muitos observadores acreditam que a pressão sobre Biden só não é mais forte porque oficialmente não foi encontrado quem o substitua. 

Nas primárias, quando ainda gozava do apoio do partido, o presidente arrecadou mais votos e mais delegados, tendo por isso de ser o próprio a afastar-se antes da nomeação oficial, na Convenção Nacional Democrata de 19 de agosto.

Os democratas têm assim um mês para encontrar alternativas, debatê-las e endossar uma delas. O tempo está a passar e a teimosia de Biden poderá revelar-se fatal.

A cisão interna está a assumir tais dimensões que alguns democratas admitiram a possibilidade de uma nomeação virtual do presidente já no fim de julho ou na primeira semana de agosto, provocando protestos, com os críticos a recusarem o que consideram uma imposição da candidatura de Biden, por esta evitar um debate sério sobre escolhas alternativas.
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