Balanço anual. Putin reitera que Ocidente "não tem hipóteses" em cenário de guerra nuclear

por Inês Moreira Santos - RTP
O presidente russo reconheceu que a inflação galopante na Rússia é um “sinal preocupante” Yuri Kochetkov - EPA

Como acontece todos os anos, Vladimir Putin falou esta quinta-feira ao país e ao mundo. O presidente russo insistiu que o seu país tem conseguido avanços "ao longo de toda a linha da frente" na Ucrânia, embora não tenha referido se conta rechaçar a breve trecho as forças ucranianas de Kursk. O chefe de Estado voltou a referir o uso de armas nucleares, reafirmando que o Ocidente "não tem hipóteses" num eventual "duelo" balístico.

Cerca das 11h00 locais, Vladimir Putin deu início à conferência de imprensa com jornalistas acreditados em Moscovo, começando por se sentar de frente para o público. A economia da Rússia foi o primeiro tema e é uma das principais preocupações do presidente - e da população.O presidente russo reconheceu que a inflação galopante na Rússia é um “sinal preocupante”, mas procurou tranquilizar os russos sobre as perspetivas da economia do país em guerra há quase três anos.


“A inflação é um sinal preocupante”
, admitiu Putin nos primeiros minutos da grande conferência de imprensa anual. “O que é desagradável e mau é a subida dos preços. Mas espero que, se os indicadores macroeconómicos se mantiverem, consigamos fazer face à situação”.

A inflação na Rússia é alimentada, em particular, pela explosão das despesas militares com a guerra contra a Ucrânia, pelos efeitos das sanções ocidentais e pelo aumento dos salários.

Esta rara confissão de Putin ocorre na véspera de uma reunião muito aguardada do Banco Central da Rússia (BCR), que poderá aumentar a sua taxa diretora, que já está em 21 por cento, um máximo de 20 anos. Sara Araújo de Almeida - Antena 1

Na conferência anual desta quinta-feira, transformada num programa de televisão visto por milhões de pessoas, o presidente tentou tranquilizar os russos, referindo que os salários subiram e que a situação é, de um modo geral, estável.

“A situação da economia russa no seu conjunto é estável, apesar das ameaças externas e das tentativas de a influenciar”, afirmou, aludindo às sanções ocidentais por causa da guerra contra a Ucrânia.

O evento consistiu numa sessão pública de perguntas e respostas combinada com uma entrevista, que Putin realiza anualmente para mostrar o domínio que tem sobre todos os temas referentes ao país.

Depois das questões sobre a economia nacional, Putin foi questionado sobre a chamada "operação militar especial" na Ucrânia. Pergunta à qual o presidente disse que "a situação está a mudar drasticamente", à medida que a guerra se aproxima do terceiro ano.

"A guerra é complicada, mas estamos mais perto de resolver as nossas principais tarefas da operação especial", afirmou.
“Há avanços a acontecer em toda a linha de frente, todos os dias".

Mas apesar desses avanços, Putin admitiu não saber quando é que o exército conseguirá expulsar as forças ucranianas da região russa de Kursk, parte da qual ainda está ocupada após uma ofensiva surpresa em agosto.

“Vamos absolutamente derrotá-los”, afirmou Putin, que considerou que "não faz sentido militar para a Ucrânia entrar na região de Kursk". “Mas quanto à questão de uma data exata, lamento, mas não posso dizer neste momento”.

A Rússia tem tentado expulsar o exército ucraniano do território, mas ainda não o conseguiu fazer, apesar de ter recebido a ajuda de soldados enviados pela Coreia do Norte nos últimos meses.

Segundo o líder russo, Moscovo sempre este pronto "para negociações e compromissos, só que o outro lado, literal e figurativamente, recusou-se a negociar".

"Em breve, os ucranianos que querem lutar vão acabar, na minha opinião, em breve não sobrará ninguém que queira lutar", comentou ainda. "Estamos prontos, mas o outro lado precisa de estar pronto para negociações e compromissos".
Ocidente sem hipóteses de derrotar armas russas 

Questionado sobre o Oreshnik, o novo míssil balístico russo usado contra a Ucrânia em novembro, Putin insistiu que a tecnologia ocidental "não tem hipótese" de o intercetar.

Putin propôs-se mesmo organizar “uma experiência ou um duelo”, que consistiria em selecionar um alvo em Kiev, levar as defesas aéreas ocidentais até lá e ver se estas consegueriam intercetar o projétil russo.

“Será interessante para nós”, atirou o líder russo.
 
Desafiando os Estados Unidos, Vladimir Putin sugeriu uma espécie de duelo em Kiev entre o novo armamento hipersónico russo e os sistemas de defesa antimíssil ocidentais.

"Deixem que os especialistas ocidentais nos desafiem, e que proponham àqueles no Ocidente e nos EUA que lhes pagam, a conduzir algum tipo de experiência tecnológica, digamos, um duelo de alta tecnologia do século XXI".“Que escolham qualquer instalação para atacarmos, digamos, em Kiev. Que concentrem aí todos os seus sistemas antiaéreos e antimísseis. E nós atacaremos com [um míssil] Oreshnik”, reafirmou.

“Veremos o que acontece. Estamos prontos para essa experiência”, disse Putin.

"Nós estamos prontos", repetiu. "Mas o outro lado estará?".

Ainda questionado sobre a doutrina nuclear, cujas alterações foram anunciadas no mês passada pelo Kremlin, Putin respondeu que a pergunta devia ser direcionada aos líderes ocidentais.

"Deviam perguntar-lhes a eles", disse.

"Nós referimos potenciais ameaças, como a criação dos sistemas antimísseis", explicou, voltando a enfatizar que acredita que a Rússia tem o direito de usar armas nucleares caso se sinta ameaçada pelo Ocidente.
Putin pronto para se encontrar com Trump

O presidente russo afirmou também estar pronto para se encontrar “a qualquer momento” com o próximo presidente norte-americano, que recentemente apelou a um cessar-fogo e a negociações entre Rússia e Ucrânia.

“Não sei quando é que o vou ver. Ele [Donald Trump] não está a dizer nada sobre isso. Não falo com ele há mais de quatro anos. Estou pronto para o fazer, claro. Em qualquer altura”, respondeu Putin.“E também estarei pronto para me encontrar com ele [Donald Trump], se ele quiser”, acrescentou.

Trump tem dito repetidamente que quer falar com Putin e com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, para pôr “fim à carnificina” da guerra na Ucrânia. A indefinição em torno do plano de Trump está a causar preocupação na Ucrânia, que não quer ser forçada a aceitar condições desfavoráveis num eventual acordo de paz com a Rússia.

Já Putin considerou que a Rússia se tornou “muito mais forte nos últimos dois ou três anos”, depois de ter invadido a Ucrânia em fevereiro de 2022.

“Se alguma vez nos encontrarmos com o Presidente eleito Trump, tenho a certeza que teremos muito que falar”
, acrescentou durante a conferência.

E repetiu que Moscovo está pronto para as conversações com Kiev, desde que se baseiem nas “realidades no terreno”, onde as forças russas têm estado em vantagem desde o início do ano.
Putin nega que queda de Assad seja derrota russa
Sobre a situação na Síria e o acolhimento do antigo presidente sírio por Moscovo, o presidente russo recusou a ideia de que a queda de Bashar al-Assad, um aliado próximo da Rússia, possa ser vista como uma derrota para o país.

“As pessoas estão a tentar apresentar o que aconteceu na Síria como uma derrota para a Rússia. Asseguro-vos que não é esse o caso”
, declarou Putin, acrescentando que o exército russo, destacado na Síria desde 2015, atingiu os objetivos no país onde mantém uma base naval e uma base aérea.

“Fomos para a Síria há cerca de dez anos para impedir a criação de um enclave terrorista, como no Afeganistão. De um modo geral, atingimos o nosso objetivo”, afirmou.

A Rússia e o Irão eram os dois grandes aliados de Bashar al-Assad, que foi derrubado a 8 de dezembro por uma coligação de forças rebeldes, após uma ofensiva que durou apenas 12 dias.

Assad fugiu com a família para a Rússia, que lhe concedeu asilo político, mas o líder russo garantiu que ainda não viu Bashar al-Assad, mas que tenciona falar com o ex-presidente.


“Ainda não vi o Presidente Assad desde a sua chegada a Moscovo, mas tenciono fazê-lo. Vou certamente falar com ele”, afirmou, em resposta a uma pergunta de um jornalista norte-americano.
Tópicos
PUB