Avanço talibã. Profissionais de sucesso em risco no Afeganistão

por Carla Quirino - RTP
Fatimah Hossaini - exposição de fotografia de moda "Beauty amid war", junho 2021 Facebook

A atriz de 24 anos, Hasiba Ebrahimi já partiu de Cabul. Hamid Haidari é jornalista e dirige a informação no canal privado de televisão, 1TV. Diz: "Se fecharmos, ninguém saberá que tipos de crimes estarão a acontecer no Afeganistão". Fatimah Hossaini, fotógrafa de moda, revela a liberdade, a beleza e a resiliência das mulheres afegãs, e por isso quer continuar a trabalhar no país. Todos partilham a dúvida sobre o futuro em solo afegão com o avanço talibã.

Sob o escudo protetor das forças da NATO e norte americanas, uma renovada geração de profissionais, entre mulheres e homens, colocaram em prática planos para fazer crescer um Afeganistão moderno. Mas o avanço talibã poderá inverter a marcha.

De acordo com The Wall Street Journal, uma avaliação dos serviços de inteligência dos EUA, Cabul pode cair nas mãos dos talibã em menos de três meses, após retirada dos militares da coligação.

A jovem estrela da nova indústria cinematográfica afegã, Hasiba Ebrahimi, viajou para a Austrália no fim de 2020 depois de deixar uma mensagem aos fans para não perderem a esperança. A atriz, que personalizava uma juventude otimista no Afeganistão, conta agora que a mãe lhe diz para não regressar. "Estou a implorar-te, eu adoro-te muito, mas não posso deixar que voltes, não posso deixar que te coloques em perigo", disse Ebrahimi a partir de Sydney. E acrescenta "Todos nós temos esperança mas é muito triste pensar que não temos futuro no próprio país".
Poster do filme protagonizado por Hasiba Ebrahimi, retirado do Facebook da atriz
 
Hamid Haidari trabalha na rede de televisão privada afegã 1TV. Dirige os noticiários a partir de Cabul e diz que quer ficar no país o máximo tempo que puder mas reconhece que não sabe o que vai acontecer. "É o Afeganistão. No futuro, haverá derramamento de sangue, haverá assassinatos e talvez guerra civil. Mas se não houver comunicação social livre, se fecharmos, ninguém saberá que tipos de crimes estarão a acontecer no Afeganistão" declara Haidari à publicação The Wall Street Journal.
Hamid Haidari | retirada da página Linkedin

Fazila Zamir tem 26 anos, é professora de música e foi uma das primeiras mulheres afegãs a tocar rubab, um instrumento tradicional de cordas. Zamir deseja que os pais deixem o Afeganistão, mas não coloca essa hipótese para si própria.
"Não há outras professoras de música aqui e, se eu for embora, ninguém mais preencherá a lacuna", sublinha Zamir, que dá aulas a mulheres na Universidade em Cabul. "Música é a minha vida". Diz já ter rejeitado várias propostas de casamento de pretendentes que queriam que ela deixasse de se apresentar em público.

O espírito de missão na luta por um Afeganistão moderno também enquadra a atitude de Fatimah Hossaini. Artista, curadora e fotógrafa de moda, diz retratar a beleza e a resistência da mulher afegã escondida por trás da burca.

Hossaini declara à BBC que o "o mundo não vê esse lado do Afeganistão. O que conhecem daqui é só guerra, pobreza, assassinatos, explosões e tragédia". Por isso, a fotógrafa quer mostrar um outro lado da sociedade, expondo os rostos das mulheres e desafiando a tradição. "Decidi colocar as minhas modelos nas ruas de Cabul e fotografá-las, uma com uma guitarra eléctrica, outra a andar de bicicleta ou mesmo usando baton vermelho", descreve Fatimah.

Mas se as conquistas na comunidade conservadora estão devagarinho a dar frutos, Fatimah Hossaini teme uma reversão perante a força talibã. "Já recebi mensagens no Twitter, que são claramente talibãs. Eles tentam seguir-me e descobrir onde estou. Eles não querem que a minha voz se oiça. Não querem que eu tire estas fotografias e mostre a liberdade por trás da burca. O sentido de moda enaltece a resiliência da mulher afegã".
 
 Hossaini pretende  continuar a contribuir para mudar a condição feminina no país, mas paira no ar a dúvida quanto ao futuro.
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