Foi um encontro raro entre dois inimigos de várias décadas. Sem relações diplomáticas desde 1980, na sequência de crise de reféns, Teerão e Washington iniciaram este sábado conversações para alcançar um novo acordo sobre o programa nuclear iraniano, depois de Trump ter abandonado o anterior, em maio de 2018.
Tal como nesse entendimento, firmado há dez anos, também neste caso as conversações foram facilitadas pela mediação da diplomacia de Omã.
Este sábado, em Muscat, o ministro iraniano dos Negócios Estrangeiros, Abbas Araghchi, e o enviado do presidente norte-americano, Steve Witkoff, estiveram envolvidos nas discussões para "lançar um processo de diálogo e negociação com o objetivo comum de chegar a um acordo justo e vinculativo".
De acordo com um comunicado do Ministério iraniano dos Negócios Estrangeiros, Abbas Araghchi e Steve Witkoff "concordaram em continuar as discussões na próxima semana", mais concretamente "no próximo sábado".
O ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão afirmou mesmo que as diplomacias iraniana e norte-americana estão "muito próximas" de chegar a um acordo sobre o conteúdo das negociações. e que as conversações de hoje decorreram numa atmosfera "cordial" e "construtiva", "baseada no respeito mútuo".
"O Irão e os Estados Unidos querem um acordo no curto prazo. Não queremos negociar por negociar", afirmou o MNE iraniano em declarações à televisão estatal, citado pela agência Reuters.
Em comunicado, Teerão adianta que os dois responsáveis conversaram
diretamente por "alguns minutos". Na antecâmara da reunião, Donald Trump
tinha anunciado negociações "diretas" com Teerão, que por sua vez tinha
mostrado disponibilidade apenas para negociações indiretas.
De acordo com a agência Reuters, que cita o porta-voz do MNE iraniano, as conversações deste sábado decorreram de forma indireta, tal como o Irão pretendia. Cada delegação esteve na sua respetiva sala e trocava mensagens através do ministro dos Negócios Estrangeiros de Omã.
No final de duas horas e meia de negociações indiretas, à saída das conversações, os chefes das delegações iraniana e norte-americana "conversaram durante alguns minutos" na presença do Ministro dos Negócios Estrangeiros de Omã.
"Quero que o Irão seja um país maravilhoso"
Karim Bitar, académico e professor da Sciences Po, em Paris, considera que a abertura por parte do Irão se deve em muito à intenção de assegurar "a sobrevivência do regime".
Em declarações à agência France Presse, Teerão pretende com estas negociações "conseguir algum oxigénio, um alívio de sanções" para dar fôlego à economia, uma vez que o regime "se tornou bastante impopular" nos últimos anos.
Nos últimos meses, o presidente norte-americano ameaçou com o recurso a ações militares caso não fosse alcançado nenhum acordo. "Quero que o Irão seja um país maravilhoso, grandioso e feliz. Mas não pode ter uma arma nuclear", afirmou Donald Trump na sexta-feira.
O clima de tensão entre os dois países tem sido recorrente ao longo das últimas décadas. Desde que tomou posse como presidente do Estados Unidos. Logo em fevereiro, o novo líder norte-americano anunciou a sua política de "pressão económica máxima" sobre o Irão, incluindo sanções,
seguindo a orientação que adotada no primeiro mandato, entre 2017 e 2021, quando Trump tomou a decisão de retirar os Estados Unidos do acordo sobre o programa nuclear do Irão (também conhecido por Joint Comprehensive Plan of Action - JCPOA).
O entendimento, assinado em julho de 2015, ainda durante a Administração Obama, previa o levantamento de sanções em troca de um maior controlo do programa nuclear iraniano. À data da saída dos Estados Unidos, Teerão cumpria com os termos do acordo, mas acabou por ultrapassar os limites do mesmo um ano após a retirada de Washington, e foi-se afastando progressivamente do texto.
Esta semana, a poucos dias das negociações de hoje em Omã, o Irão ameaçou mesmo a
expulsão de inspetores da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), a entidade da ONU a quem foi atribuída a responsabilidade de supervisionar as instalações nucleares iranianas aquando da assinatura do acordo há dez anos.