A invasão de apoiantes pró-Trump ao Capitólio na quarta-feira está a provocar reações por parte de vários líderes mundiais. Descrevem as cenas de violência vividas na capital norte-americana como "vergonhosas", "chocantes" e um "ataque à democracia" e apelam a uma transição "pacífica e ordeira" do poder. Este será um dia que “ficará para a história” pelos piores motivos, consideram.
“Hoje foi um dia sombrio na história da capital dos Estados Unidos”, disse Mike Pence, vice-presidente dos EUA, quando os trabalhos no Congresso foram retomados. “Condenamos a violência que teve lugar aqui nos termos mais fortes possíveis”, acrescentou.
O presidente eleito Joe Biden, cuja vitória foi certificada esta quinta-feira pelo Congresso norte-americano, afirmou que os violentos protestos foram “um ataque sem precedentes à democracia” e acusou Donald Trump de incitar à violência.
"Trata-se de um ataque àquilo que é mais sagrado para os norte-americanos", afirmou. "Ser americano é ter honra e tolerância", vincou o futuro Presidente norte-americano.
“A história vai recordar a violência no Capitólio, incitada por um Presidente em exercício que continua a mentir infundadamente sobre os resultados de uma eleição legal, como um momento de grande desonra e vergonha para a nossa nação”, escreveu o antigo Presidente norte-americano na sua conta do Facebook. “Mas estaríamos a mentir a nós próprios se tratássemos isto como uma completa surpresa”, disse Obama, explicando que o que o mundo está a testemunhar hoje são “as consequências de uma escalada de violência”.
Outros antigos Presidentes também já reagiram. Bill Clinton escreveu no Twitter que o ataque ao Capitólio é consequência de “quatro anos de política venenosa e de desinformação deliberada, semeando desconfiança no nosso sistema e colocando os americanos uns contra os outros”. George W. Bush fala em “república das bananas” e Jimmy Carter em “tragédia nacional”.
Reações na Europa
Do outro lado do Atlântico também chegam reações aos protestos que são já descritos como a maior ameaça à democracia dos EUA desde a guerra civil.
Boris Johnson condenou as “cenas vergonhosas” a que o mundo assistiu na quarta-feira. “Os Estados Unidos representam a democracia em todo o mundo e agora é vital que haja uma transferência de poder pacífica e ordeira”, escreveu o primeiro-ministro britânico no Twitter.
“Quando, numa das democracias mais antigas do mundo, os apoiantes de um Presidente cessante pegam em armas para desafiar os resultados legítimos de uma eleição, a ideia universal de ‘uma pessoa, um voto’ é prejudicada”, disse o presidente francês num vídeo publicado no Twitter.
“O que aconteceu em Washington DC não é a América, definitivamente. Acreditamos na força das democracias. Acreditamos na força da democracia norte-americana”, acrescentou Emmanuel Macron.
O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, disse ter “confiança na força da democracia norte-americana. A nova presidência de Joe Biden vai superar esta fase tensa, unindo o povo americano”.
O ministro nos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Heiko Maas, disse que Trump e os seus apoiantes “devem aceitar a decisão dos eleitores norte-americanos e deixar de pisar a democracia”.
A chanceler alemã Angela Merkel disse estar "triste" e "zangada" com a invasão do Capitólio em Washington por apoiantes de Donald Trump, considerando que o Presidente cessante tem uma parcela de responsabilidade.
"Lamento profundamente que o Presidente Donald Trump não tenha admitido a sua derrota desde novembro e ontem [quarta-feira]", disse a chanceler alemã aos jornalistas.
Angela Merkel considera que "as dúvidas sobre o resultado da eleição foram alimentadas e criaram a atmosfera que tornou possíveis os acontecimentos de quarta-feira em Washington".
Também os principais líderes da União Europeia deram a conhecer as suas opiniões. O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, disse confiar nos EUA para garantir uma transferência pacífica de poder para Joe Biden. “O Congresso dos EUA é um templo da democracia. Testemunhar as cenas desta noite em Washington DC é um choque”, acrescentou Charles Michel.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse esperar trabalhar com o democrata que "venceu as eleições".
O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, descreveu como “chocantes” as imagens que chegavam na quarta-feira da invasão ao Capitólio e reiterou que o resultado das eleições “deve ser respeitado”.
Por sua vez, o secretário-geral da ONU, António Guterres, disse estar “triste” e lembrou a importância de cumprir os processos democráticos.
Outros exigem medidas mais drásticas, já que muitos congressistas democratas estão a sugerir artigos de impeachment contra Donald Trump, pela segunda vez na sua presidência.
O eurodeputado e antigo ministro dos Negócios Estrangeiros da Polónia, Radek Sikorski, escreveu no Twitter: “O Gabinete dos EUA deve imediatamente, de acordo com a 25ª Emenda da Constituição, declarar Donald Trump irresponsável e suspender a sua presidência”.
Em Portugal, o primeiro-ministro António Costa escreveu na quarta-feira na sua conta do Twitter estar a acompanhar “com preocupação os desenvolvimentos em Washington”, sublinhando que “o resultado das eleições deve ser respeitado, com uma transição pacífica e ordeira do poder”.
Também o ministro dos Negócios Estrangeiros mostrou-se “estupefacto” com as imagens que chegavam de Washington na tarde de quarta-feira. "Isto não são os Estados Unidos, não são as instituições democráticas norte-americanas. É a primeira vez que uma transição entre dois presidentes não se faz de uma forma ordeira e coordenada como a Constituição e as leis americanas preveem", disse Augusto Santos Silva à agência Lusa.
“Trump explodiu com a democracia americana”
Nem todos os líderes mundiais condenaram os acontecimentos na capital norte-americana.
O Presidente brasileiro Jair Bolsonaro continua a apoiar Donald Trump e reiterou as alegações infundadas de fraude eleitoral. “Há muitas denúncias de fraude eleitoral”, disse Bolsonaro.
“Trump explode com a democracia americana”, disse Eliane Cantanhêde, uma conhecida comentadora política brasileira. “Um dia que ficará para a história. Um Presidente a ser deitado no caixoto do lixo da história”, acrescentou a comentadora.
Em Israel, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu descreveu as cenas de violência do Capitólio em Washington como "um ato escandaloso" e defendeu que devem ser "vigorosamente condenadas".
"Não tenho nenhuma dúvida de que a democracia norte-americana vai triunfar", acrescentou Netanyahu.
Na Rússia, o Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros do Senado considera que a democracia norte-americana anda à deriva.
"O partido que perdeu [Partido Republicano] tem razões mais do que suficientes para acusar os vencedores de falsificações. É evidente que a democracia americana 'anda de um lado para o outro'", disse Konstantin Kosatchev, em Moscovo.
O Irão encara a invasão no Capitólio como uma demonstração da “frágil e vulnerável” democracia ocidental. O Presidente iraniano Hassan Rouhani criticou ainda o "populismo", referindo-se aos apoiantes do chefe de Estado norte-americano.
No final da cerimónia formal no Congresso, o Presidente cessante prometeu uma “transição ordeira” a 20 de janeiro, mas continuou a desacreditar o resultado eleitoral.