Associação critica silêncio de Portugal sobre detenção de repórteres em Macau
O líder de uma associação de profissionais da comunicação social disse hoje à Lusa que Portugal deveria ter feito "um gesto discreto ou uma expressão de preocupação" face à detenção de duas jornalistas em Macau.
Em 17 de março, a polícia deteve duas repórteres do jornal `online` All About Macau, com uma versão mensal em papel, quando tentavam entrar no salão da Assembleia Legislativa para assistir à apresentação do programa político do Governo para 2025.
"Consideramos o silêncio de Portugal preocupante, dados os seus profundos laços históricos e culturais com Macau", lamentou o presidente da Sociedade de Jornalistas e Profissionais da Comunicação Europeus na Ásia (JOCPA), Josep Solano.
Macau, que esteve sob controlo português durante mais de 400 anos, passou em 1999 para a administração chinesa, sob um acordo que previa que a região deveria manter os direitos e liberdades fundamentais, incluindo a liberdade de imprensa, durante os primeiros 50 anos.
"Acreditamos que tal silêncio não pode ser visto como neutro, especialmente num contexto em que a liberdade de imprensa está ameaçada", sublinhou Josep Solano.
"É importante lembrar a Portugal --- um país democrático com ligações de longa data a Macau --- que tem a responsabilidade moral de defender e promover as liberdades fundamentais", defendeu o catalão.
"Mesmo um gesto discreto ou uma expressão de preocupação reafirmaria o compromisso de Portugal com os valores democráticos e a liberdade de imprensa", disse Solano.
Nas redes sociais, o All About Macau escreveu que a polícia foi chamada para retirar as jornalistas, "alegando serem suspeitas de `perturbar o funcionamento das autoridades` de Macau e de `gravação ilegal de vídeo`".
"A justificação oficial (...) é profundamente preocupante. Reflete um ambiente cada vez mais repressivo, no qual os meios de comunicação independentes enfrentam restrições arbitrárias, exclusão de eventos públicos e, agora, criminalização", alertou a JOCPA, num comunicado divulgado na terça-feira.
Solano disse esperar "sinceramente que este lamentável incidente não marque uma nova deterioração do ambiente de liberdade de imprensa em Macau. No entanto, os acontecimentos recentes na região levantam preocupações".
Na sexta-feira, a Associação de Jornalistas de Macau (AJM) declarou que "lamenta profundamente" a detenção das duas repórteres, incluindo a presidente da organização, Ian Sio Tou.
A JOCPA, criada em janeiro e com sede na Estónia, manifestou solidariedade com a AJM, "que corajosamente denunciou este incidente alarmante".
"A situação inédita ocorrida é triste e preocupa-nos, pois consideramos que abre um precedente -- no mínimo -- constrangedor", disse hoje à Lusa o presidente da Associação de Imprensa em Português e Inglês de Macau (AIPIM).
José Miguel Encarnação pediu ao Ministério Público "que haja ponderação na avaliação dos factos, por forma a que não haja consequências de maior".
A JOCPA pediu ao Governo que retire todas as acusações contra as jornalistas e que levante as restrições aos meios de comunicação social, "independentemente do formato ou da frequência de publicação".
Em 13 de abril, a AJM tinha questionado a "exclusão injustificada" de "revistas mensais locais e meios de comunicação `online`" - como é o caso da All About Macau - da cobertura de eventos oficiais com "justificações que não convencem" - como a limitação de espaço.
Também José Miguel Encarnação defendeu ser "essencial garantir que os direitos dos jornalistas sejam salvaguardados e que a liberdade de informar não seja condicionada sob pretextos pouco claros".
Ainda assim, o presidente da AIPIM admitiu que a associação decidiu não fazer qualquer comunicado sobre o incidente.
Uma posição que Josep Solano compreende: "Dadas as circunstâncias complexas e delicadas que atualmente prevalecem em Macau, (...) entendemos que a prudência é uma consideração importante".
No entanto, o dirigente alertou que "um número significativo de jornalistas não chineses que trabalham em Macau são europeus, e qualquer erosão das liberdades fundamentais pode ter um impacto direto na sua capacidade de operar de forma segura e eficaz".