O colombiano Alex Saab, considerado pelos Estados Unidos como um testa-de-ferro de Nicolás Maduro, queixa-se de ter sido torturado na cadeia cabo-verdiana onde está detido, numa cela com duas horas de eletricidade por dia.
A denúncia é feita pelo empresário em entrevista escrita à Lusa a partir da cadeia da ilha do Sal, onde se encontra desde junho, quando foi detido, a pedido dos Estados Unidos da América (EUA), que o querem julgar por alegados atos de corrupção e branqueamento de capitais associados ao Presidente venezuelano, Nicolás Maduro.
"Obviamente não me sinto bem, perdi mais de 26 quilogramas de peso. E, acima de tudo, como é que você se sentiria se saísse descalço de um avião diplomático e fosse sequestrado por outro país, que está violando leis internacionais de longa data?", questionou Alex Saab.
Retomando uma denúncia anterior que fez sobre tortura naquela cadeia, o empresário colombiano afirma que está detido "em condições que até mesmo o Departamento de Estado dos EUA descreveu como `risco de vida`".
"As condições não atendem aos padrões mínimos exigidos pela convenção contra tortura e tratamento desumano e degradante, e outros regulamentos internacionais sobre direitos humanos. Desde que cheguei, eles torturaram-me sete vezes. Isto nunca foi documentado clinicamente nem investigado pelas autoridades cabo-verdianas por motivos que só elas podem explicar, no entanto, a minha fé é forte, e sei que Deus está comigo", afirmou.
Em setembro último, a Procuradoria-Geral da República (PGR) cabo-verdiana anunciou que realizou uma "visita surpresa" à cadeia onde está detido Alex Saab, através de dois procuradores, não tendo encontrado indícios de tortura, como alegava o empresário colombiano, por parte de "quatro empregados" norte-americanos naturais de Cabo Verde.
"Não entendo como isso [alegados atos de tortura] pode acontecer num país alegadamente democrático, que supostamente é o campeão do cumprimento do Estado de Direito", retorquiu Alex Saab.
Alex Saab, de 49 anos, foi detido em 12 de junho pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, com base num mandado de captura internacional emitido pelos EUA, quando regressava de uma viagem ao Irão.
O Governo da Venezuela afirmou que Saab viajava com passaporte diplomático daquele país, enquanto "enviado especial", pelo que não podia ter sido detido, e continua a exigir a sua libertação.
"Só tenho eletricidade duas horas por dia. Passar tantas horas no escuro está a fazer-me perder a visão e agora preciso de usar lentes. De segunda a sexta, tenho apenas 20 minutos pela manhã e 20 minutos à tarde para falar com o meu advogado local. Essa é toda a comunicação que posso ter", descreveu, acrescentando que recentemente passou a poder falar cinco minutos por semana com a família, telefonicamente.
"Não tenho permissão para falar com outras pessoas e elas não podem falar comigo. Situação que em outros casos, como o de Julian Assange, levou um tribunal britânico a negar recentemente a sua extradição para os EUA, devido ao grave risco de vida que o seu regime carcerário acarreta e à enorme pena desproporcional, como no meu caso, o que o torna equivalente a uma sentença de prisão perpétua", enfatizou.
Alex Saab descreve ser um doente oncológico, que necessita de tratamento, tendo a sua equipa de defesa recorrido para várias instâncias, incluindo o Tribunal de Justiça da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que lhe deu razão em 02 de dezembro, pedindo para aguardar o desfecho do processo em prisão domiciliária.
Queixa-se que o pedido para ser examinado por um médico especialista independente "em quem possa confiar", foi sempre recusada pelo Ministério da Justiça cabo-verdiano.
"Psicologicamente, estou profundamente perturbado com a grave injustiça que está a ser cometida no meu caso", assume, insistindo que não cometeu qualquer crime e criticando as autoridades de Cabo Verde por alegados limites colocados à sua equipa de defesa.
"Seis semanas depois, ainda estou à espera que Cabo Verde cumpra a ordem do ilustre Tribunal da CEDEAO", criticou ainda.
Insiste que como "enviado especial" tinha "imunidade e inviolabilidade" previstas na Convenção de Viena, na Convenção das Nações Unidas sobre Missões Especiais e no direito internacional, pelo que "nunca podia ter sido preso". Além disso, nesse momento, afirma, tinha consigo a "documentação necessária" para provar a sua imunidade diplomática e o "propósito da viagem".
"Entretanto, as autoridades policiais retiveram essas provas. Os meus advogados denunciaram isso e levaram a tribunal. E o tribunal ignorou completamente esse facto. Porquê?", questionou.
"Cabo Verde nunca deveria ter-me prendido, considerando que sou uma pessoa protegida internacionalmente. O Presidente e o primeiro-ministro nunca deveriam ter deixado isso acontecer", afirmou ainda.
Entretanto, a equipa internacional de defesa de Alex Saab, liderada pelo antigo juiz espanhol Baltasar Garçón, tem até 09 de janeiro para apresentar o anunciado recurso para o Supremo Tribunal de Justiça da decisão de 04 de janeiro, do Tribunal da Relação do Barlavento, favorável à extradição de Alex Saab para os EUA.
Neste processo, os EUA, que pedem a extradição do colombiano, acusam Alex Saab de ter branqueado 350 milhões de dólares (295 milhões de euros) para pagar atos de corrupção do Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, através do sistema financeiro norte-americano.
"Na verdade, tudo o que pedimos é que o devido processo legal seja respeitado", concluiu Alex Saab.