Afeganistão. Talibãs desfilam com equipamento norte-americano e reclamam "lição" para o mundo

por Raquel Ramalho Lopes - RTP

Os talibãs asseguraram, esta terça-feira, o controlo total do aeroporto internacional de Cabul. Os líderes do movimento extremista islâmico afirmam que deram uma "lição" ao mundo, após o último avião norte-americano ter descolado, marcando o fim de 20 anos de guerra, a mais longa dos Estados Unidos. Numa ação simbólica, os talibãs caminharam pela pista do aeroporto vestidos com a farda militar americana, assinalando a vitória, flanqueados por combatentes da unidade de elite dos rebeldes Badri.

"O mundo deve ter aprendido a sua lição e este é o momento de apreciar a vitória", disse o porta-voz dos talibãs, Zabihullah Mujahid.

Aos combatentes, Mujahid disse esperar "que sejam muito cautelosos ao lidarem com a nação". "A nossa nação sofreu guerra e invasão e o povo não tem mais tolerância", acrescentou o porta-voz.

Mais tarde, em declarações à Al-Jazeera, na pista do aeroporto, Mujahid afirmou que "haverá segurança em Cabul e as pessoas não se devem preocupar".

Numa outra entrevista, desta vez à televisão estatal afegã, o porta-voz talibã também referiu o reinício das operações no aeroporto, que continua a ser uma saída importante para os que querem deixar o país.

"A nossa equipa técnica irá verificar as necessidades técnicas e logísticas do aeroporto", explicou. "Se formos capazes de resolver tudo por nós próprios, então não precisaremos de qualquer ajuda. Se houver necessidade de ajuda técnica ou logística para reparar a destruição, então poderemos pedir ajuda ao Catar ou à Turquia", afirmou.

Durante a noite, o Pentágono confirmava que o último avião americano tinha partido de Cabul, deixando no país milhares de afegãos em desespero.

O general da Marinha Frank McKenzie, o chefe do Comando Central do Exército dos EUA, já tinha afirmado que as tropas "desmilitarizaram" o sistema para que nunca mais pudesse ser utilizado. Neste sentido, os EUA desativaram 27 viaturas blindadas e 73 aviões.

De acordo com outros oficiais norte-americanos, as tropas não explodiram determinados equipamentos para garantir que deixavam o aeroporto operacional para futuros voos.

Uma das imagens da noite é a do último soldado norte-americano a abandonar Cabul, ”pondo fim à missão” no Afeganistão. De acordo com o departamento da Defesa, o último soldado é o major general Chris Donahue.

Foguetes em Cabul

A saída das tropas americanas foi celebrada com foguetes na capital do Afeganistão.

Os talibãs também dispararam para o ar como forma de comemoração. Os guardas de serviço mantiveram afastados os curiosos e os que de alguma forma ainda esperavam apanhar um voo para fora.


Mohammad Naeem, porta-voz do gabinete político dos talibãs no Qatar, saudou igualmente o momento num vídeo `online`.

"Graças a Deus todos os ocupantes deixaram completamente o nosso país", disse, felicitando os combatentes, apelidando-os de guerreiros santos. "Esta vitória foi-nos dada por Deus. (...) Foi devido a 20 anos de sacrifício", destacou.

"O Afeganistão está finalmente livre", disse um outro alto militante talibã, Hekmatullah Wasiq. "O lado militar e civil está connosco e no controlo. Esperamos agora anunciar o nosso Gabinete. Tudo é pacífico. Tudo é seguro", insistiu.

Wasiq apelou aos civis para que voltem ao trabalho e reiterou a promessa de uma amnistia geral. "As pessoas têm de ser pacientes", disse. "Lentamente voltará tudo ao normal. (...) Vai levar tempo", garantiu.

Zalmay Khalilzad, o representante especial dos EUA que supervisionou as conversações dos Estados Unidos com os talibãs, escreveu na rede social Twitter que "os afegãos enfrentam um momento de decisão e oportunidade" após a retirada norte-americana

 

"É claro o que queremos. (...) Queremos a sharia [lei islâmica], paz e estabilidade", disse Mohammad Islam, guarda talibã no aeroporto, oriundo da província de Logar, empunhando uma espingarda Kalashnikov. "Eles partiram e agora o nosso país está livre", afirmou Mohammad Islam.

O aeroporto foi cenário de cenas caóticas e mortíferas desde que os talibãs começaram a conquistar cidades no Afeganistão, até tomarem Cabul a 15 de agosto.

Milhares de afegãos sitiaram o aeroporto, alguns caindo para a morte depois de se terem pendurado desesperadamente num avião de carga militar norte-americano. Na semana passada, um ataque suicida do Estado islâmico numa entrada do aeroporto matou pelo menos 169 afegãos e 13 operacionais dos EUA.
Ministros europeus reunidos 
Os ministros da Justiça e da Administração Interna dos 27 Estados membros da União Europeia reúnem-se esta terça-feira à hora de almoço, para debater a saída da coligação do Afeganistão. Os ministros devem aprovar uma declaração conjunta, podendo ainda revelar número de refugiados afegãos que cada estará disposto a acolher.
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