Os Estados Unidos estão a ser pressionados pelos seus aliados para atrasar a retirada do Afeganistão para dar mais tempo para retirar todos os que querem abandonar o país, que é agora comandado pelos talibãs. As tropas norte-americanas que controlam o aeroporto internacional Hamid Karzai – o único em funcionamento - devem partir dia 31 de agosto.
Para esta terça-feira está marcada uma reunião do G7, organizada pelo Reino Unido, para debater a situação.
Na reunião dos líderes dos sete países mais industrializados do mundo, também será debatida a relação futura com o grupo fundamentalista islâmico e o acolhimento de refugiados do Afeganistão.
França, Alemanha e Reino Unido estão a pressionar Washington para manter as forças militares durante mais tempo no Afeganistão.
O ministro alemão dos Negócios Estrangeiros, Heiko Maas, revelou que tinha colocado em cima da mesa a possibilidade de manter o aeroporto de Cabul aberto além do prazo estabelecido entre a NATO e os talibãs.
Já o Reino Unido defende que nenhuma presença militar estrangeira pode permanecer em Cabul sem as tropas norte-americanas.
No entanto, o embaixador do Reino Unido no Afeganistão, Sir Laurie Bristow, advertiu o Parlamento britânico de que tentar manter por mais tempo as forças militares no aeroporto da capital afegã “seria repleto de riscos”.
Segundo o jornal The Guardian, Bristow deixou claro que os talibãs não tolerariam que as forças ocidentais permanecessem em setembro.
“Os sinais que estamos a receber dos talibãs são bastante inflexíveis. Eles querem que a operação de retirada das forças ocidentais concluída até ao final do mês”, acrescentou o diplomata.
Os talibãs já alertaram para as consequências se as forças estrangeiras permanecerem no país após o prazo acordado com os EUA. Telefonema entre Londres e Washington Antes da reunião do G7, Boris Johnson e Joe Biden falaram na noite de segunda-feira, pela primeira vez em quase uma semana, Os dois líderes debateram a forma como está a decorrer a ponte aérea de emergência, segundo fontes da Casa Branca e de Downing Street.
Fonte de Downing Street avançou ao The Guardian que: “os dois líderes concordaram em continuar a trabalhar juntos para garantir que os que são elegíveis para abandonar o Afeganistão o possam fazer, mesmo após o fim da fase final de retirada”.
Boris e Biden “notaram a importância do compromisso diplomático combinado para assegurar o progresso feito no Afeganistão e prevenir uma crise humanitária”.
Para esta terça-feira está também marcada uma reunião de emergência do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Um encontro que vai decorrer numa altura em que surgem avisos das organizações humanitárias sobre o agravamento da crise humanitária no Afeganistão e a preocupação com os direitos humanos, especialmente das mulheres.
Aproximadamente 48 mil pessoas retiradas
Segundo a Casa Branca, desde 14 de agosto – dia em que o movimento islâmico chegou à capital afegã – os EUA retiraram ou facilitaram a partida a aproximadamente 48 mil pessoas.
Segunda-feira, chegaram aos Estados Unidos 10.900 pessoas.
Outros que querem abandonar o país permanecem amontoados dentro ou nas imediações do aeroporto de Cabul.
Muitos dos afegãos que tentam abandonar o país trabalharam com as forças estrangeiras e temem represálias dos talibãs, um grupo que impôs uma dura versão da lei islâmica enquanto esteve no poder entre 1996 e 2001.
Os talibãs tentam pintar um quadro conciliatório para que os afegãos permaneçam no país. O porta-voz do movimento, Suhail Shaheen, afirmou à BBC que as pessoas com passaportes válidos poderão deixar o país em voos comerciais depois de 31 de agosto.
“Queremos que eles fiquem no país, mas se pretenderem partir, podem”, afirmou. Suhail Shaheen.
Pelo menos 20 mortos no aeroporto
A correspondente da BBC relata que pelo menos 20 pessoas morreram em tiroteios e tumultos no aeroporto desde a passada semana. Mais de 10 mil foram retirados na segunda-feira, mas o tempo está a esgotar-se.
Numa outra zona do Afeganistão, a BBC falou com habitantes que se esconderam com medo de serem assassinadas pelos talibãs e que afirmam que não têm meios para abandonar o país.
No entanto, há milhões de afegãos que apoiam o movimento islâmico, com a esperança que coloquem um ponto final na violência.
Os talibãs têm mantido discussões sobre a formação de um novo Governo. As lojas e os locais de trabalho, exceto os bancos, estão lentamente a reabrir. Nas ruas do país são visíveis menos mulheres.
Sentenças de morte
Os talibãs condenaram à morte o irmão de um tradutor afegão que trabalhou para as forças militares norte-americanas, segundo cartas a que a CNN teve acesso, acusando-o de ajudar os EUA.
Um ex-militar para quem o intérprete trabalhou confirmou a situação.
As missivas são a apenas um exemplo da forma como os talibãs estão a ameaçar diretamente os cidadãos afegãos que trabalharam com os EUA ou os seus parentes.
“Foi acusado de ajudar os norte-americanos”, lê-se na primeira carta enviada ao afegão, acrescentando que “é também acusado de fornecer segurança ao seu irmão que era intérprete”.
A primeira carta, escrita à mão, ordena ao irmão do tradutor que compareça a uma audiência.
A segunda carta, também manuscrita, é um aviso de que não compareceu.
Na terceira missiva, já datilografada, os talibãs advertem o homem que, por rejeitar as advertências anteriores para parar a “sua servidão aos cruzados invasores” e ignorar uma intimação para permanecer a uma audiência, era “culpado à revelia” e seria condenado à morte.
“Estas decisões judiciais são finais e não terá o direito de se opor”, acrescenta a terceira missiva. “Escolheu esse caminho e a sua morte é eminente [sic], se Deus quiser”.
As cartas que foram escritas em pashto e traduzidas para inglês pela CNN, têm selos que correspondem aos das cartas de arquivo dos talibãs.
As missivas contradizem as garantias dadas pelo porta-voz do movimento islâmico, Zabiullah Mujahid, que na passada semana durante uma conferência de imprensa, afirmou que os talibãs querem tentar passar uma imagem mais moderada para o mundo.
“Ninguém será prejudicado no Afeganistão”, declarou Zabiullah Mujahid. “Há uma grande diferença entre nós agora e há 20 anos”.
Mas, os aliados afegãos dos EUA duvidam dessas declarações, e essas cartas e numerosos relatórios dos talibãs em busca de retaliação explicam porque muitos afegãos temem que o movimento islâmico volte a impor o seu regime brutal e opressor.