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A França de Emmanuel Macron: que mudanças para eles e para nós?

Os franceses votaram e a decisão está tomada. Emmanuel Macron sucede a François Hollande no Eliseu, tendo derrotado Marine Le Pen na segunda volta das eleições presidenciais. Ex-banqueiro e ministro da Economia, o líder do movimento Em Marcha! recusa a dicotomia esquerda – direita e apresenta um pensamento económico mais liberal. Olhamos para o que o próximo Presidente pode trazer à França e à Europa.

Sem surpresas, sem ruturas, cumprindo o que as sondagens indicavam. Com mais de 60 por cento dos votos, Emmanuel Macron venceu a segunda volta das eleições presidenciais e vai suceder a François Hollande no Eliseu.

A Frente Nacional conseguiu aumentar a votação em relação a 2002, mas ficou ainda muito longe de aceder à chefia do Estado francês. Será Emmanuel Macron, o mais jovem Presidente francês de sempre, e quase desconhecido há três anos, a dar a cara pelo país que é um dos motores da construção europeia.

Emmanuel Macron tenta fugir à dicotomia direita e esquerda, apresenta-se do lado do PS no que diz respeito às liberdades individuais e sociais mas apresenta uma visão liberal da economia. Era desde o princípio o mais europeísta dos candidatos.

Chega ao Eliseu agitando a bandeira da renovação política, mas muitas das políticas que apoiou durante o executivo de François Hollande foram fortemente contestadas nas ruas. 



Europa
A vitória de Emmanuel Macron é aquela que mais convém aos diretórios europeus. Não só porque do outro lado se encontrava Marine Le Pen, mas também por ser o mais europeísta de todos aqueles que se candidataram ao Eliseu. O líder do Em Marcha! rejeita que a União Europeia seja responsável de “todos os males” mas considera serem necessárias mudanças para que Bruxelas “não tenha como missão gerar uma burocracia” mas sim “proteger o nosso presente e preparar o nosso futuro”.

A eleição de Emmanuel Macron promete fortalecer o eixo franco-alemão na construção europeia. O líder do Em Marcha! tem sido elogiado tanto pelos socialistas germânicos de Martin Schulz como pelos conservadores de Angela Merkel. Macron reuniu-se mesmo com a chanceler alemã em março, ainda era um dos 11 pretendentes ao Eliseu.

Será então hora de avançar com as suas propostas – na certeza que grandes mudanças na União Europeia dificilmente ocorrerão antes das eleições alemãs de setembro. Macron defende a manutenção do acordo CETA de livre-comércio com o Canadá e o estabelecimento de novos acordos com a China, que abordem temas como o comércio, a segurança e o ambiente.

O líder do Em Marcha! aposta na luta contra a optimização fiscal, querendo garantir que os grandes grupos internacionais ligados às novas tecnologias são taxados sobre as suas receitas – e não sobre os lucros apresentados. A luta faz-se também contra os Estados que estabeleçam acordos fiscais vantajosos com multinacionais.

Macron aposta ainda nas mudanças em relação à Zona Euro: quer um orçamento próprio para os 19, a criação de um Parlamento dos países da moeda única e do cargo de ministro da Economia e das Finanças do euro. O Presidente eleito aposta ainda na coesão, querendo trabalhar para uma harmonização dos direitos sociais – nomeadamente as regras do subsídio de desemprego e salário mínimo.

Pretende ainda que sejam alteradas as regras dos trabalhadores destacados, que permitem que trabalhadores europeus trabalhem noutro Estado-membro. Uma questão que a França considera motivar situações de concorrência desleal, uma vez que os trabalhadores destacados têm custos sociais inferiores aos dos funcionários franceses.

Macron pretende ainda avançar com o Buy European Act, recordando as medidas adotadas por Barack Obama na sequência da crise de 2008. O objetivo é que os concursos públicos europeus sejam reservados a empresas cujo pelo menos metade da produção seja feita na Europa.

A Europa de Emmanuel Macron passa ainda pela criação de convenções da cidadania nos Estados-membros. O objetivo é que cada país discuta internamente a Europa que pretende. Estas discussões darão lugar a um guião para o futuro da União que será adotado pelos países que o desejem.


Reforma Laboral

A lei laboral foi dos principais impulsionadores de conflitos durante o mandato de François Hollande. Emmanuel Macron promete ir mais além e logo no início do seu mandato. A ação de Macron promete irritar sindicatos e trabalhadores, tanto pelas medidas em si, como pela forma de as levar adiante.

O líder do Em Marcha! pretende avançar com “ordonnances”, um mecanismo através do qual o Parlamento atribui ao Governo competência para legislar em matérias que são da responsabilidade da própria Assembleia da República. O diploma é depois votado no Parlamento, mas não é discutido nem pode ser alterado pelos deputados.

O método é contestado e as medidas também o serão por sindicatos e trabalhadores. Afinal, Emmanuel Macron já disse querer ir além da reforma laboral adotada no verão de 2016 e conhecida sob o nome de lei El-Khomri. Uma mudança legislativa que motivou meses e meses de protesto e que foi aprovada sem voto no Parlamento, com o Governo a recorrer ao já famoso artigo 49.3 – que permite passar um diploma sem voto no Parlamento. 

A lei El-Khomri pretende aumentar a competitividade das empresas, facilitando os despedimentos e a alteração da carga horária. Estabelece ainda o primado dos acordos de empresa sobre os acordos setoriais, mesmo que o acordo setorial seja mais favorável, em alguns temas.

Emmanuel Macron propõe-se agora a alargar o primado dos acordos de empresa. Pretende ainda manter a idade da reforma e o modelo geral das 35 horas de trabalho semanal, mas quer facilitar o aumento da carga laboral através de acordo nas próprias empresas.

A seguir em frente com estas medidas fica desde já prometida muita contestação social. A reforma laboral foi uma das grandes lutas que marcaram o fim do mandato de François Hollande e contribuíram para o desgaste da sua presidência. Um conflito que fraturou a esquerda e o próprio Partido Socialista.


Economia e Finanças

O próximo chefe de Estado francês pretende avançar com um plano de investimentos públicos de 50 mil milhões de euros, reduzir a taxa de imposto sobre as empresas e o peso das contribuições sociais. Macron promete reduzir as contribuições pagas pelos trabalhadores de forma a que quem ganhe 2200 euros brutos consiga mais 500 euros ao fim do ano.

O Presidente eleito aposta ainda na criação de um 13º mês para quem menos recebe. Promete ainda aumentar o combate à fraude fiscal e à segurança social e avançar com a redução do número de funcionários públicos: menos 120 mil até 2022. Quer manter o modelo das 35 horas semanais mas dar mais espaço à negociação no seio das empresas.

Os gastos em defesa deverão ser aumentados, com o objetivo de chegar aos dois por cento do Produto Interno Bruto. Emmanuel Macron prevê uma redução de despesa na ordem dos 60 mil milhões de euros durante o seu mandato, comprometendo-se a conseguir o défice de três por cento exigido pelas autoridades europeias.


Reforma das instituições
Candidato fora do tradicional quadro partidário francês, Emmanuel Macron promete algumas mudanças pontuais no sistema, mantendo-se longe da revolução que era proposta por Marine Le Pen. Pretende reduzir em um terço o número de deputados e senadores e aprovar uma “grande lei da moralização da vida pública”.

As propostas do Em Marcha! incluem a proibição dos deputados empregarem familiares e impedir que os parlamentares exerçam atividades de aconselhamento – tentando impedir conflitos de interesses. Pretende aumentar a fiscalidade sobre os rendimentos obtidos pelos deputados e alterar o funcionamento do Parlamento – para que passe menos tempo a legislar e mais a controlar o Executivo. 

Emmanuel Macron pretende ainda reduzir o número de departamentos franceses (estrutura administrativa que se encontra entre as cidades e as regiões). O objetivo é que haja menos um quarto dos departamentos, nomeadamente agrupando-os às grandes metrópoles. 

No quadro institucional importa ainda saber que tipo de apoio parlamentar terá Emmanuel Macron. É uma das grandes incógnitas, sendo que a resposta apenas será dada depois das eleições legislativas de junho. Será o movimento Em Marcha! capaz de conseguir uma maioria absoluta, apesar de ser recente e não estar regionalmente implementado?

Precisará Emmanuel Macron de procurar uma aliança e com quem? Reina assim a incógnita sobre a necessidade de uma eventual aliança com a direita ou com a esquerda socialista e o que ela implicará na orientação das políticas de Emmanuel Macron.


Sociedade

Acusado de se encontrar demasiado à direita no que diz respeito à economia, Emmanuel Macron alinha mais à esquerda no que diz respeito à sociedade. O Presidente eleito quer alargar o acesso à Procriação Médica Assistida aos casais homossexuais e às mulheres solteiras. Apresenta-se no entanto contra as barrigas de aluguer. 

Na educação, Macron aposta na redução do número de alunos por turma na primária, naquelas que são consideradas zonas problemáticas. O líder do Em Marcha! quer reduzir a dependência francesa da energia nuclear, atribuir subsídios de mil euros para que os franceses comprem carros menos poluentes e duplicar a aposta na produção de energia eólica e solar.

Macron quer avançar com a construção de mais 15 mil lugares nas cadeias francesas. Abre a porta ao recrutamento de mais dez mil agentes policiais e à criação de uma polícia de proximidade. O Presidente eleito é ainda defensor da criação de um serviço militar obrigatório de um mês para todos os franceses.