Crónica de bastidores. Biles em Paris

por Inês Geraldo - RTP (enviada especial a Paris)
Simone Biles não deu hipóteses à concorrência RTP

Sempre ouvi que não devemos conhecer os nossos heróis... mas ao menos podemos vê-los ao vivo. E aqui entra Simone Biles. Depois de três anos na sombra a tentar recuperar a chama do Rio de Janeiro, a ginasta deu prioridade à saúde mental e apostou todas as fichas num regresso, literalmente, olímpico.

Na Arena Bercy os franceses fizeram a festa, apoiando até ao último segundo os seus próprios atletas e puxando por aqueles que têm menor apoio mas por quem sentem simpatia.

Mas o fenómeno Simone Biles não se define pela nacionalidade. Define-se pela excecionalidade dos predestinados.

Não é preciso ser-se americano, não é preciso ser-se francês e receber do maior evento desportivo do mundo. Não é preciso ser-se de qualquer outro país. Basta reconhecer a qualidade técnica e a execução espetacular que a ginasta coloca em todas as suas rotinas.

Numa prova que contava para a qualificação do All Around individual, de equipas e para provas individuais, Biles decidiu que não era tempo para haver e deixar dúvidas, tal como aconteceu em Tóquio.

Logo que a equipa americana entrou na Arena Bercy a comoção do público fez-se ouvir mais alto do que qualquer outro atleta ou evento. Ela pode não ser a estrela mas é uma das estrelas destes Jogos Olímpicos, mesmo que ainda não tenha competido. As expectativas são e sempre foram altas.

A histeria coletiva em Bercy começou na trave. De regresso ao palco Olímpico, Simone Biles alcançou logo uma marca de respeito: 14.733. No solo, a americana foi a melhor das cinco subdivisões mas o melhor viria para os saltos.

Com um valor de dificuldade mais alto do código da Federação Internacional de Ginástica, Simone Biles avançou e executou quase na perfeição um Yurchenko com duplo mortal encarpado, tendo apenas soçobrado na aterragem.

Mesmo assim, a Arena Bercy levantou-se numa ovação ensurdecedora e a pontuação acabou por ser monstruosa: uns incríveis 15.800.

No fim, Biles conquistou uma pontuação agregada de 59.566 e é, sem grandes dúvidas, a grande favorita para a final de All Around.

Três anos depois, Biles volta para ser ela própria. Depois de ter tido a coragem de falar de saúde mental, mostrando que até os melhores sentem a pressão da perfeição e podem cair no marasmo, a americana retirou-se das luzes da ribalta depois de Tóquio, tratou de si própria e voltou para ser implacável onde quase sempre o foi: na competição de ginástica artística.

Talvez não devamos conhecer os nossos heróis e, de facto, não a conheci. No entanto, valeu bem a pena estar nas bancadas da Arena Bercy e ver o que uma das melhores de sempre nesta modalidade teve para oferecer. Depois do Rio Janeiro, é a vez de Paris vislumbrar a excecionalidade do fenómeno Biles.
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