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"Tesouros resgatados de Gaza - 5.000 anos de história". Exposição sobre o património arqueológico palestiniano

por Carla Quirino - RTP
Pavimento de mosaico de uma igreja bizantina em Gaza Julien de Rosa - AFP

Paris tem uma nova exposição dedicada aos testemunhos de diversas civilizações que se sucederam no território de Gaza, durante cinco milénios, desde a Idade do Bronze até à era otomana. Pela primeira vez, esta seleção de 130 obras-primas e de artefactos arqueológicos salvos da catástrofe em Gaza está apresentada ao público. "Tesouros resgatados de Gaza - 5.000 anos de história", que aborda a resiliência na Palestina, acabou de ser inaugurada e está patente no Institut du Monde Arabe (Instituto do Mundo Árabe).

Com a ajuda do Museu de Arte e História de Genebra (MAH) e o apoio da Autoridade Nacional Palestina, o Institut du Monde Arabe (IMA), sediado na capital francesa, apresenta uma exposição intitulada “Tesouros resgatados de Gaza – 5000 anos de história”.

Quem visitar a mostra poderá ver 130 peças selecionadas , onde se destaca o mosaico de Abu Baraqeh resgatado nas escavações franco-palestinianas iniciadas em 1995, ou ainda a coleção particular de Jawdat Khoudery, doada em 2018 à Autoridade Nacional Palestina e apresentada agora, pela primeira, vez em França.

Desde 2007, MAH tornou-se o museu-refúgio de uma coleção arqueológica de quase 529 obras pertencentes à Autoridade Nacional Palestiniana e que nunca puderam regressar a Gaza. 

Esta longa história dos povos que se instalaram no enclave é contada através de ânforas, estatuetas, estelas funerárias, lucernas (lamparinas a óleo), estatuetas, mosaicos, etc., que datam da Idade do Bronze (segundo milénio antes de Cristo) até a era otomana

Existe uma “extraordinária densidade arqueológica" num território que foi habitado sem interrupção desde a Idade do Bronze, no qual a herança assíria, grega e romana coexiste com artefatos das eras bizantina, mameluca e otomana, descreve Elodie Bouffard, curadora do IMA, à France 24.
Herança da guerra
Este património constitui uma coleção que se tornou uma referência, perante a destruição atual de Gaza, explica o IMA.

O conflito na Faixa de Gaza é abordada nesta exposição como um dos “os desafios urgentes da preservação do património em tempos de guerra, já que mais de dois terços das áreas com edificação de Gaza foram destruídos nos últimos meses”, aponta o Instituto.

“Este segmento da exposição apresentará uma avaliação atualizada do património em risco de Gaza, conduzida por vários grupos de investigação, juntamente com um levantamento de descobertas arqueológicas recentes e fotografias inéditas de Gaza no início do século XX, extraídas da coleção da École Biblique et Archéologique Française de Jérusalem”, acrescentou o IMA.


Cabeça de cavaleiro persa, Khan Yunis, séc. VI-V a.C. | Foto: Philippe Maillard/IMA

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) afirma que, até março de 2025, foram verificados danos em 94 sítios culturais e arqueológicos, que incluem 12 sítios religiosos, 62 edifícios de interesse histórico e/ou artístico, três depósitos de bens culturais móveis, nove monumentos, um museu e sete sítios arqueológicos.
Testemunho do passado de Gaza
O presidente do Instituto para o Mundo Árabe, Jack Lang, classifica esta mostra como "uma coleção excecional com 130 obras-primas arqueológicas, cada uma testemunhando a história vibrante e milenar deste enclave palestiniano". 


Detalhe de mosaico bizantino do sítio de Jabaliya | Foto: Philippe Maillard/IMA 

“Hoje mais do que nunca, especialmente desde 7 de outubro e a destruição que se seguiu, Gaza merece ter a sua história contada” sublinhou Lang, numa declaração no site oficial do IMA.

“Porque a guerra brutal está a destruir, às vezes apagando, faixas inteiras da identidade desta terra outrora florescente, uma verdadeira encruzilhada de civilizações entre a Ásia, a Arábia, a África e o Mediterrâneo”, acentua.

Em Gaza, cruzavam-se grandes rotas de caravanas de outros tempos diz Elodie Bouffard.

“Ao escavarmos, podemos encontrar mais de oito camadas de civilizações sucessivas
”, realça.

Coleção de Khoudary
A maioria dos sítios arqueológicos em Gaza foi escavada na década de 1990, após os Acordos de Oslo.

O empresário e colecionador palestiniano, Jawdat Khoudary, esteve envolvido nos trabalhos arqueológicos, e tornou-se próximo da equipa de arqueólogos da École Biblique, sediada em Jerusalém.

Constituiu um museu particular onde acumulou um tesouro de centenas de artefactos.

No final de 2006, cerca de 260 objetos da coleção de Khoudary deixaram Gaza em direção a Genebra para serem exibidos no MAH. Em 2007, o Hamas tomou o poder em Gaza.

Apesar de várias tentativas para devolução dos artefatos ao território palestiniano, nunca se materializaram as condições de segurança para isso, alegou Khoudary.

“Eu queria mostrar as nossas raízes, a prova da nossa existência nesta terra”, declarou à publicação Le Monde, falando do Cairo, para onde ele e a família fugiram em dezembro de 2023.

O colecionador observou ainda que o facto da coleção estar no MAH foi “vital para salvar pelo menos parte da coleção”, já que o seu museu foi destruído durante a guerra. “É um milagre”, disse Khoudary, na altura.

Estela funerária, séc. XII-XIII, Calcaire | Foto: Philippe Maillard/IMA
Resposta através da cultura
Até 2 de novembro de 2025,  esta herança arqueológica pode ser conhecida no Institut du Monde Arabe,  apresentando-se assim como um testemunho de uma história milenar que resiste ao cenário de guerra e devastação.

Esta exposição também tem uma nuance política, insiste Jacl Lang: "Nós queremos dizer ao povo de Gaza para se manterem firmes, e esta mostra é a nossa forma de mostrar solidariedade para com eles. É uma resposta, não através de violência, mas através da cultura, ciência, do saber, da arte".
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