Procuradora do TPI ameaçada pela Mossad devido a investigação de crimes de guerra
Uma investigação do jornal britânico The Guardian, publicada esta terça-feira, revela que a antiga procuradora do Tribunal Penal Internacional (TPI) Fatou Bensouda terá sido ameaçada e pressionada pelo ex-diretor da agência de inteligência israelita, Yossi Cohen, para cancelar a investigação sobre crimes de guerra na Palestina.
A decisão de Bensouda despertou a atenção de Israel e Yossi Cohen, na altura chefe do Conselho de Segurança Nacional de Israel, coordenou um esforço entre várias agências contra o TPI.
Em janeiro de 2016, Yossi Cohen foi nomeado diretor da Mossad, a agência de inteligência israelita, e intensificou as pressões sobre a procuradora do TPI. Várias fontes confirmaram ao Guardian que Bensouda foi alvo de “ameaças, manipulação e perseguição” por parte de Cohen, com o objetivo de fazer cair a investigação sobre crimes de guerra na Palestina.
Quatro fontes confirmaram que Bensouda informou um pequeno grupo de altos funcionários do TPI sobre as tentativas de Cohen para influenciá-la, ao mesmo tempo que se mostrava preocupada com a natureza cada vez mais persistente e ameaçadora do seu comportamento.
De acordo com relatos partilhados com funcionários do TPI, Cohen terá dito a Bensouda: “Você deveria ajudar-nos e deixar-nos cuidar de si. Você não se quer envolver em coisas que possam comprometer sua segurança ou a da sua família”.
"Campanha de difamação"
Em dezembro de 2019, a procuradora anunciou que tinha motivos para abrir uma investigação criminal completa sobre alegações de crimes de guerra em Gaza, na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental.
A partir dessa altura, Cohen intensificou as ameaças e as tentativas de persuadir a procuradora a não prosseguir com uma investigação completa caso os juízes dessem luz verde. A família de Bensouda passou também a ser alvo de investigações e pressão por parte da Mossad.
Fontes com conhecimento direto da situação revelaram que a agência de inteligência israelita obteve transcrições de gravações secretas do marido de Bensouda e tentaram usá-las para desacreditar a procuradora. No entanto, não tiveram sucesso.
Três fontes próximas descreveram os esforços como parte de uma “campanha de difamação” mal sucedida contra Bensouda. “Eles foram atrás de Fatou”, disse uma fonte, mas isso “não teve impacto” no trabalho da procuradora. Nestes esforços de intimidação e conspiração contra Bensouda, Israel recebeu o apoio de Joseph Kabila, o antigo presidente da República Democrática do Congo.
Em março de 2021, após ter recebido a confirmação de que o TPI tinha jurisdição nos territórios palestinianos ocupados, Bensouda anunciou a abertura de uma investigação sobre os crimes de guerra cometidos por Israel.
Três meses depois, Bensouda concluiu o seu mandato de nove anos no TPI e deixou ao seu sucessor, Karim Khan, a tarefa de assumir a investigação.
Esta investigação culminou num mandado de detenção para o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, e dirigentes do Hamas por crimes de guerra e crimes contra a humanidade em Gaza.
"Com base nas provas recolhidas e examinadas pelo meu Gabinete, tenho motivos razoáveis para acreditar que Benjamin Netanyahu, o primeiro-ministro de Israel, e Yoav Gallant, o ministro da Defesa de Israel, têm responsabilidade criminal por crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos no território do Estado da Palestina (na Faixa de Gaza) a partir de, pelo menos, 8 de outubro de 2023", afirmou Karim Khan em comunicado.
“O facto de terem escolhido o chefe da Mossad para ser o mensageiro não oficial do primeiro-ministro para Bensouda foi para intimidar, por definição. Mas falhou”, disse uma fonte informada sobre a operação de Cohen ao jornal The Guardian.
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