Médio Oriente. Acordo de paz comprometido devido a divulgação de documentos confidenciais

por Inês Moreira Santos - RTP
Amir Cohen - Reuters

O fracasso nas negociações para um acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas pode dever-se à divulgação e alegada falsificação de documentos oficiais à comunicação social. A informação foi avançada pelo Hareetz depois de um tribunal israelita apontar como suspeito um antigo assessor e porta-voz de Benjamin Netanyahu, entretanto já detido.

O Exército e os serviços de inteligência e informação de Israel, o Shin Bet, abriram uma investigação depois de, em setembro deste ano, o jornal britânico Jewish Chronicle e o alemão Bild terem publicado artigos baseados em documentos militares confidenciais, precisamente numa altura em que decorriam negociações de cessar-fogo e de libertação de reféns.

Os documentos falsificados alegavam que o Hamas pretendia contrabandear reféns israelitas para o Egito, o que punha em risco qualquer acordo de paz. E, segundo a BBC, os documentos foram publicados em jornais europeus, supostamente para contornar as leis de censura militar em Israel.

Um dos artigos detalhava um alegado plano de Yahya Sinwar, o líder político do Hamas, para fugir da Faixa de Gaza com os reféns em direção ao Egito através do "Corredor Filadélfia", uma zona tampão ao longo da fronteira. O outro baseava-se em notas apresentadas como provenientes da liderança do Hamas sobre a estratégia do líder para frustrar as negociações sobre a libertação dos reféns.

De acordo com o tribunal israelita, estas informações eram, em parte, falsas e terão “prejudicado a capacidade dos órgãos de segurança em alcançar o acordo para libertar reféns”.
Quatro pessoas, incluindo membros do aparelho de segurança israelita e Eliezer Feldstein, um antigo colaborador de Benjamin Netanyahu, estão atualmente detidas, fez saber o tribunal de Rishon LeZion (centro).

Mais de uma centena de pessoas, dos 251 reféns feitos pelo Hamas a 7 de outubro de 2023, ainda estão em cativeiro e com paradeiro incerto.

Os opositores de Netanyahu suspeitam que o primeiro-ministro tenha utilizado as fugas de informação para se recusar a abdicar do controlo do corredor entre o Egipto e o sul de Gaza, apesar de a questão ser um grande obstáculo nas negociações de tréguas com o Hamas, que estão paralisadas desde o verão. Os mais críticos também apontam a possibilidade de os documentos terem sido falsificados e divulgados para proteger o primeiro-ministro israelita, que pode vir a ser acusado de supostamente aceitar subornos.

Benny Gantz, que integrou o gabinete de guerra de Netanyahu, considerou que se informações de cariz confidencial tiverem sido usadas para uma “campanha de sobrevivência política”, isso seria não apenas uma infração criminal mas também “um crime contra a nação”.

Já o líder da oposição, Yair Lapid, argumentou que, se o primeiro-ministro estava ciente da divulgação dos documentos, então “é cúmplice de uma das mais graves ofensas à segurança” e que, se não estava a par do sucedido, não deveria estar no cargo.

Benjamin Netanyahu negou, entretanto, qualquer irregularidade cometida pelo Governo, mas as famílias dos reféns acusaram o Executivo de sabotar as negociações.

Um porta-voz de Netanyahu rejeitou também, em resposta à comunicação social, que tenha havido emissão ilegal de documentos do Gabinete do Primeiro-Ministro (PMO, na sigla em inglês) e que a “pessoa em questão nunca participou de discussões relacionadas com a segurança”, referindo-se a Feldstein. A mesma fonte descartou a possibilidade de que a divulgação destas informações tenha afetado as negociações com o Hamas para a libertação de reféns de Gaza, considerando tal alegação “ridícula”.
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