Seul admite entrega de armas à Ucrânia em resposta ao envolvimento de soldados norte-coreanos

por Andreia Martins - RTP
O presidente russo, Vladimir Putin, com o líder norte-coreano, Kim Jong-un, em Pyongyang, na Coreia do Norte, em junho de 2024. Sputnik/Vladimir Smirnov/Pool via Reuters

A Coreia do Sul ameaçou esta terça-feira mudar o posicionamento adotado e passar a enviar armas para Kiev caso a Rússia e a Coreia do Norte continuem a cooperação militar em curso, nomeadamente com o envio de militares norte-coreanos para a frente de combate na Ucrânia.

É a resposta da Coreia do Sul ao envolvimento crescente do vizinho a norte na guerra em curso no leste da Europa há quase três anos. Um alto funcionário do gabinete do presidente sul-coreano, Yoon Suk-yeol, adiantou hoje que o país está a preparar medidas diplomáticas, económicas e militares para responder ao envio de tropas pela Coreia do Norte.

No início da guerra, Seul optou por não participar no envio de armas para apoiar Kiev. O país estava, até agora, concentrado no envio de ajuda não letal, nomeadamente ajuda humanitária e ferramentas de desminagem.

Mas o responsável da presidência revelou hoje, em declarações aos jornalistas, que a Coreia do Sul poderá agora reverter a decisão inicialmente adotada.

“Consideraríamos o fornecimento de armas para fins defensivos como parte dos cenários passo a passo, e se nos parecer que estão a ir longe demais, também poderemos considerar [armas] de uso ofensivo”
, afirmou o alto funcionário do gabinete do presidente sul-coreano.

Também esta terça-feira, o Conselho de Segurança Nacional da Coreia do Sul considerou que “o envio de tropas para a guerra de agressão ilegal da Rússia na Ucrânia é uma ameaça significativa à segurança, não só do nosso país, mas também para a comunidade internacional”.

“Após o envio de tropas de combate pela Coreia do Norte, o Governo [sul-coreano] irá implementar contramedidas faseadas”
, acrescentou ainda o Conselho de Segurança Nacional.

Na segunda-feira, a Coreia do Sul convocou o Embaixador russo no país, depois de ter acusado Pyongyang do envio de pelo menos 1.500 soldados para combater ao lado das tropas russas na Ucrânia, segundo a agência de espionagem de Seul.

De acordo com a agência de espionagem da Coreia do Sul, o vizinho do norte já enviou 1.500 forças especiais para o extremo-leste da Rússia, com o objetivo de treinar e preparar o futuro combate ao lado das tropas de Moscovo na Ucrânia. A imprensa sul-coreana avança, no entanto, que o número total de tropas a enviar pela Coreia do Norte possa chegar a 12 mil soldados.

A Coreia do Norte rejeitou estas acusações, considerando que estão em causa “rumores infundados”. Já o Embaixador da Federação russa na Coreia do Sul, Georgy Zinoviev, garantiu que a cooperação entre Moscovo e Pyongyang está “dentro do enquadramento do Direito Internacional”.

“A respeito da alegada cooperação militar com a Rússia, a minha delegação não sente qualquer necessidade de comentar esses rumores infundados e estereotipados”, afirmou um representante norte-coreano durante uma reunião na Assembleia Geral da ONU.

O responsável acrescentou que as acusações de Seul “visam manchar a imagem da Coreia do Norte” e “minar as relações legítimas, amigáveis e de cooperação entre dois Estados soberanos”.

Da sua parte, a Rússia não confirmou em nenhum momento o envio de tropas por Pyongyang, mas defendeu o direito à “cooperação militar” com o país e que esta “não está contra os interesses de segurança da Coreia do Sul”.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse na segunda-feira que a cooperação entre os dois países “não é dirigida contra países terceiros” e “não deve preocupar ninguém”.
“Não fechem os olhos a isto”
Este novo foco de tensão entre as Coreias surge numa altura em que Kim Jong-un está a ordenar a destruição de ligações ferroviárias entre os dois países, uma “ação legítima contra um Estado hostil” que faz parte da estratégia de Pyongyang para a “separação completa e gradual do território do Norte”.

Em junho último, Moscovo e Pyongyang intensificaram a cooperação com a assinatura de um pacto de segurança por Vladimir Putin e Kim Jong-un. Nesse pacto, os dois países prometem ajudar-se mutuamente caso enfrentem uma “agressão”.

Em Kiev, o presidente ucraniano apelou esta terça-feira para que os aliados e parceiros “não fechem os olhos” perante estes novos desenvolvimentos.

Numa mensagem publicada nas redes sociais, Volodymyr Zelensky adiantou que a Ucrânia tem informações sobre a preparação em curso por parte de duas brigadas norte-coreanas, cada uma com cerca de seis mil solados.

“É um desafio, mas sabemos como lhe responder. O importante é que os nossos parceiros não fechem os olhos a isto”, vincou.

O líder ucraniano agradece “a todos os países e lideres” que condenaram o envolvimento da Coreia do Norte na guerra encetada pela Rússia.

“É óbvio que, em Pyonyang, tal como em Moscovo, não se valoriza a vida humana. Mas estamos interessados em acabar com esta guerra e não em prolongá-la. É por isso que devemos deter a Rússia e os seus aliados. Se a Coreia do Norte consegue intervir numa guerra na Europa, então é óbvio que não tem havido pressão suficiente sobre este regime”, vincou Zelenlsky.

O presidente ucraniano considerou ainda que “todos os que não estão a ajudar a forçar a Rússia à paz estão, de facto, a ajudar Putin nesta guerra”.

“Os agressores devem ser detidos. Esperamos uma resposta firme e concreta do mundo. Esperamos que não apenas em palavras”, concluiu.

Para o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, o envio de tropas norte-coreanas para lutar ao lado dos russos na Ucrânia “marcaria uma escalada significativa” no conflito, pelo que promete a cooperação da Aliança Atlântica com a Coreia do Sul.

"Conversei com o Presidente sul-coreano [Yoon Suk Yeol] sobre a estreita parceria entre a NATO e Seul, a cooperação da indústria da defesa e a segurança interligada das [regiões] Euro-atlântica e Indo-Pacífico", afirmou Rutte esta segunda-feira na rede social X.
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