O chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, considerou hoje que o Presidente do Brasil, Lula da Silva, cultivou na sua recente visita a Pequim "a mesma ambiguidade estratégica da China" relativamente à agressão da Rússia à Ucrânia.
Discursando perante o Parlamento Europeu, em Estrasburgo, num debate sobre "a necessidade de uma estratégia coerente para as relações UE-China", o alto representante da União para a Política Externa e de Segurança reiterou que uma das grandes questões que separa as partes é o seu posicionamento sobre a guerra na Ucrânia, notando que não é só Pequim que tem uma posição complacente relativamente à Rússia, "o agressor".
Borrell lembrou que, já este mês, o Presidente francês, Emmanuel Macron, "foi a Pequim e disse ao Presidente [chinês] Xi [Jinping] que espera que ele ajude a chamar [o Presidente russo, Vladimir] Putin à razão, mas a verdade é que o Presidente Xi não pensa que o Presidente Putin tenha perdido a razão", e não é o único a pensar dessa forma.
"Pelo contrário, ele [Xi] acha que Putin tem razões, que partilha. Com ele [Putin] e com muitos dos seus visitantes, como o Presidente Lula, que esteve recentemente em Pequim e cultivou a mesma ambiguidade estratégica que a China" relativamente ao conflito, sem fazer distinção entre agressor e agredido, disse então o chefe da diplomacia europeia.
O alto representante, que discursou em representação do Conselho -- dado presidir aos trabalhos dos 27 na área dos Negócios Estrangeiros -- lembrou que a mensagem da União Europeia, que não teve oportunidade de transmitir em Pequim na semana passada, dado ter tido de cancelar a viagem prevista à China por ter contraído covid-19, "é clara" e sem ambiguidades.
Defendendo uma vez mais que "a China deve usar a sua influência junto da Rússia para convencer Moscovo" a por fim a uma agressão que viola todas as regras internacionais, Josep Borrell salientou que "qualquer neutralidade que não faça uma distinção entre o agressor e o agredido é posicionar-se do lado do agressor".
"Dissemo-lo muitas vezes e vamos continuar a dizê-lo", declarou o responsável espanhol.
Luiz Inácio Lula da Silva defendeu no sábado, depois de uma visita a Pequim, que os Estados Unidos devem parar de "encorajar a guerra" na Ucrânia e a União Europeia deve "começar a falar de paz" e deixar de fornecer armas, "que encorajam a guerra", declarações que suscitaram várias críticas, incluindo em Portugal, onde o Presidente brasileiro estará na próxima semana, por ocasião do 25 de abril.
Na segunda-feira, a Comissão Europeia já rejeitara as acusações feitas pelo Presidente do Brasil.
"Não é verdade que os EUA e a UE estejam a ajudar a prolongar o conflito. A verdade é que a Ucrânia é a vítima de uma agressão ilegal, uma violação da Carta das Nações Unidas", sustentou o porta-voz do executivo comunitário para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, Peter Stano, em conferência de imprensa, em Bruxelas.
O porta-voz acrescentou que "é verdade que a UE, os EUA e outros parceiros estão a ajudar a Ucrânia na sua legítima defesa", pois a outra opção seria "a destruição da Ucrânia".
"No que diz respeito a iniciativas de paz, a UE apoiou-as muito antes de [Presidente russo, Vladimir] Putin decidir lançar esta carnificina contra a população ucraniana (...), a resposta foi a agressão infortuna de fevereiro do ano passado", frisou o porta-voz da Comissão Europeia.
Também os Estados Unidos consideraram na segunda-feira que o Brasil está a repetir a propaganda russa e chinesa "sem ter em conta os factos".
"Neste caso específico, o Brasil está a repetir a propaganda russa e chinesa, sem ter em conta os factos", realçou John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, órgão diretamente ligado ao Presidente norte-americano.
A ofensiva militar russa no território ucraniano, lançada a 24 de fevereiro do ano passado, mergulhou a Europa naquela que é considerada a crise de segurança mais grave desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Na sua intervenção no hemiciclo de Estrasburgo, Borrell defendeu, ainda assim, que a UE deve manter o diálogo com a China, até porque "a China não é a Rússia, é um superpoder, que cresce e está presente em todas as partes do mundo", sendo a sua influência "considerável" e o seu poder político "crescente".
"Mesmo que não seja uma democracia, não podemos deixar de falar com a China e buscar em conjunto soluções para os grandes problemas globais. Os desafios atuais obrigam-nos a trabalhar juntos. Há que continuar a falar com a China devido à sua influência colossal no mundo", disse.