EUA enviaram a Kiev nova proposta de acordo sobre minerais, confirma Zelensky

por Graça Andrade Ramos - RTP
Volodymyr Zelensky em conferência de imprensa em Kiev dia 28 de março de 2025 Presidência da Ucrânia via Reuters

O presidente ucraniano anunciou esta sexta-feira a receção de uma nova proposta de acordo sobre as reservas de minerais, petróleo e gás da Ucrânia, por parte de Washington. Volodymyr Zelensky afirmou que se trata "de um documento completamente diferente" que ainda vai ter de ser analisado.

"O lado ucraniano", declarou Zelensky, "recebeu hoje oficialmente, através de uma nota, as propostas americanas".

Sem revelar pormenores, Volodymyr Zelensky garantiu que se trata "de um documento completamente diferente", que inclui "muitas coisas que não tinham sido debatidas e algumas que já haviam sido rejeitadas pelas partes".

Zelensky explicou que é demasiado cedo para falar sobre a proposta, que terá de ser avaliada pelo advogados ucranianos.

Repetiu também que Kiev não aceitará que a ajuda militar fornecida pelos Estados Unidos, para ajudar a Ucrânia a combater a invasão russa, seja considera um empréstimo a ressarcir através dos direitos de exploração de minérios ucranianos, como pretende a Administração Trump.

Quinta-feira, em Paris, onde se reuniu com o homólogo francês, Emmanuel Macron, e com os líderes de dezenas de países sobre novos apoios à Ucrânia, Volodymyr Zelensky dissera aos jornalistas que a nova proposta norte-americana sobre o acordo exigia "estudo detalhado", sugerindo que um acordo final ainda estava longe.

Disse igualmente na mesma ocasião que não queria "deixar os EUA com a sensação de que a Ucrânia está contra eles em geral". "Apoiamos a cooperação com os EUA", afirmou Zelensky. "Não queremos enviar quaisquer sinais que possam levar os EUA a interromper a ajuda à Ucrânia"."Inaceitável"
Apesar dos detalhes da proposta enviada esta sexta-feira não terem sido divulgados pelo governo de Kiev, a reação por parte de deputados e de orgãos de comunicação social ucranianos foi de repúdio total.

Depois de notícias de que a Administração Trump teria feito tábua rasa de todas as negociações, regressando à proposta inicial já rejeitada pela Ucrânia, uns e outros consideraram o documento "inaceitável".

De acordo com o jornal Ukrainska Pravda, "a equipa de Donald Trump abandonou todas as soluções de compromisso acordadas há um mês" e o novo documento "cruza quase todas as linhas vermelhas" da Ucrânia, que "priva de parte da sua soberania" e obriga a "reembolsar toda a ajuda americana que recebeu".

O acordo também não menciona qualquer garantia de segurança para a Ucrânia, como insiste Kiev, segundo este meio de comunicação.

O jornal norte-americano New York Times fez manchete com a notícia, sustentando ter tido acesso à nova proposta de acordo e ter verificado que "Washington enviou a Kiev uma nova proposta que reafirma as amplas exigências financeiras de um projecto de acordo inicial rejeitado pela Ucrânia e que acrescenta novas que poderão sobrecarregar as finanças do país durante anos".

Tal como nas propostas anteriores, refre, "a Ucrânia teria de contribuir com metade das suas receitas provenientes de projectos de recursos naturais e infra-estruturas relacionadas, tais como portos e oleodutos, para um fundo de investimento controlado pelos EUA. O lucro do fundo seria reinvestido em projectos de recursos naturais ucranianos, embora a percentagem exacta desse lucro permanecesse incerta".

A nova proposta é contudo "mais específica sobre a forma como os lucros seriam partilhados.

Washington reclamaria todos os lucros do fundo até que Kiev reembolsasse pelo menos o equivalente à ajuda dos EUA recebida durante a guerra, mais quatro por cento de juros anuais".

"Os Estados Unidos também manteriam um "direito de primeira oferta" em novos projetos e o poder de vetar vendas de recursos ucranianos a terceiros países. E no primeiro ano do acordo, a Ucrânia seria proibida de oferecer quaisquer projetos de investimento a terceiros com melhores termos financeiros ou econômicos do que aqueles oferecidos aos Estados Unidos", prossegue o jornal.

De acordo com o NYT, "a nova proposta também descreve as especificidades para o papel da International Development Finance Corporation, uma agência do governo dos EUA responsável por investir em empresas e projetos no exterior. A agência controlaria o fundo ucraniano, nomeando três membros do conselho, enquanto a Ucrânia teria apenas dois. A agência também supervisionaria cada projeto em que os ganhos do fundo seriam investidos".
O que querem os EUA de Trump
A administração de Donald Trump prepara há várias semanas este acordo e há uma semana Donald Trump mostrou-se confiante de que o documento irá ser assinado "em breve".

A Ucrânia chegou a dizer que estava pronta para osubscrever e Volodymyr Zelensky deslocou-se mesmo a Washington no final de fevereiro, para o concluir, mas a iniciativa acabou por falhar após uma altercação de Zelensky com Donald Trump e o vice-presidente norte-americano, JD Vance, na Sala Oval, transmitida em direto para o mundo inteiro.

O NYT baseia a notícia sobre a nova proposta no testemunho de três atuais e antigos funcionários ucranianos que analisaram o projecto, alguns dos quais falaram sob condição de anonimato por se referirem a negociações sensíveis.

De acordo com estas fontes, refere o jornal norte-americano, "a nova proposta reverte à exigência inicial do Presidente Trump, de que a Ucrânia devolva aos Estados Unidos os milhares de milhões que Kiev recebeu em ajuda militar e financeira desde a invasão em grande escala da Rússia, há três anos".

"O novo projecto também faz eco de versões anteriores, ao omitir qualquer menção a garantias de segurança para a Ucrânia, uma disposição que Kiev há muito pressionava e que conseguiu incluir num projecto no mês passado", mas que Washington terá agora enfiado de novo na gaveta, revela o NYT.

A quantidade de riqueza mineral contida no solo ucraniano permanece pouco clara, sendo a maior parte destes recursos inexplorados, difíceis de extrair ou de facto sob controlo russo, porque estão em territórios ocupados. 

O presidente russo, Vladimir Putin, já admitiu ser favorável aos investimentos americanos nas regiões ucranianas conquistadas pela Rússia.
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