Diplomacia francesa alerta que risco de guerra na Europa nunca foi "tão alto"

por Inês Moreira Santos - RTP
Abdul Saboor - Reuters

Um dia depois da cimeira em Londres e da proposta franco-britânica para uma trégua de um mês na Ucrânia, o ministro francês dos Negócios Estrangeiros assinala que o "risco de guerra no continente europeu nunca foi tão alto" como agora. Numa entrevista, esta segunda-feira de manhã, Jean-Noël Barrot admitiu que "a linha de frente [russa] está constantemente a aproximar-se de nós", apontando o dedo às "ambições imperialistas" de Moscovo, em particular com a invasão da Ucrânia.

"O risco de guerra no continente europeu, na União Europeia, nunca foi tão alto porque, durante quase quinze anos, a ameaça continuou a aproximar-se de nós, a linha da frente continuou a aproximar-se de nós", declarou Barrot na rádio France Inter, poucas horas antes de um debate no Parlamento francês sobre a guerra na Ucrânia e a segurança na Europa.

É por isso que a França, explicou o chefe da diplomacia francesa, “tem vindo a dizer há sete anos que devemos intensificar as nossas defesas para conter a ameaça”.

“O que estamos a testemunhar hoje, o que testemunhámos no domingo em Londres, é o despertar de toda uma secção de europeus que se recusou a ver a realidade das coisas”, lamentou, acrescentando que os países europeus estão agora convencidos da necessidade "de que a Europa seja capaz de garantir a própria defesa e a própria segurança”, além de ter “os meios necessários para nunca mais termos que perguntar aos Estados Unidos o que eles podem fazer pela segurança europeia". EUA não querem abandonar a Ucrânia
No domingo, o presidente francês garantiu que os participantes na cimeira em Londres estão determinados a agir por uma paz duradoura na Ucrânia e a tomar medidas para garantir a segurança coletiva. Trata-se de um plano elaborado entre Londres e Paris, que incluiria “um ou dois outros países” e aqueles que se queiram juntar, formando uma coligação de interessados, e que será posteriormente transmitido a Washington.

As palavras "Terceira Guerra Mundial" foram proferidas pelo presidente norte-americano na sexta-feira, numa discussão acesa com Volodymyr Zelensky na altura em que foi recebido na Casa Branca. Na entrevista à rádio francesa, Barrot lembrou que “não é a primeira vez que Donald Trump menciona essas palavras”.

"Teríamos preferido que esta conferência de imprensa tivesse sido diferente? A resposta é sim. Vemos em Volodymyr Zelensky um grande lutador da resistência, um herói? A resposta é sim. O nosso papel é fazer acusações ou dar lições de moral? Não”, afirmou o governante francês.

Apesar da polémica e tensa reunião entre o líder ucraniano e o homólogo norte-americano, que muitos viram como uma “humilhação” de Trump a Zelensky, o MNE francês diz acreditar que os Estados Unidos não têm interesse em abandonar a Ucrânia ou a Europa.

"Acredito que é do interesse dos Estados Unidos, é até mesmo o destino natural dos Estados Unidos, estar no campo da Ucrânia. Se a Ucrânia capitulasse, não seria apenas uma notícia terrível para este país, uma notícia terrível para os europeus, mas também uma admissão terrível de fraqueza para os Estados Unidos da América”, considerou Barrot.

O Reino Unido e a França querem propor uma trégua "no ar, nos mares e na infraestrutura energética", o que "servirá para demonstrar a boa-fé de Vladimir Putin quando ele se comprometer com esta trégua". É nessa altura, considerou o ministro francês, que “as verdadeiras negociações de paz vão começar, porque queremos paz, mas queremos uma paz sólida e duradoura”.

“Uma paz que ponha um fim definitivo ao que tem vindo a acontecer no leste do continente há 15 anos”.

"Para pôr fim à guerra de agressão russa na Ucrânia, queremos que os Estados Unidos, por meio de pressão, consigam levar Vladimir Putin à mesa de negociações e a concordar em pôr fim de uma vez por todas às suas ambições imperialistas que levaram a linha da frente a estar cada vez mais para perto de nós", continuou.

Jean-Noël Barrot considerou "possível", num futuro imediato, retomar o diálogo entre Donald Trump e Volodymyr Zelensky após a acalorada conversa.

"Acredito que há desejo de ambos os lados, uma consciência partilhada de que é do interesse da Ucrânia, do interesse dos europeus e do interesse dos norte-americanos garantir que as ambições imperialistas russas sejam interrompidas"
, explicou.
Pausa nas operações cibernéticas dos EUA contra a Rússia é “difícil de entender”
Nas últimas horas, o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Pete Hegseth, ordenou uma pausa em todas as operações cibernéticas do país contra a Rússia, incluindo ações ofensivas. Esta pausa faz parte de um processo mais alargado de reavaliação das operações dos EUA contra a Rússia e a sua duração não está claramente definida, segundo o New York Times, que desenvolveu uma notícia avançada no final da semana passada.

Ainda à France Inter, o ministro francês admitiu ter tido "um pouco de dificuldade para entender" a pausa ordenada por Hegseth.

"Em relação aos ataques cibernéticos, os países da União Europeia são constantemente atacados pela Rússia dessa forma", destacou o ministro francês. "Tenho um pouco de dificuldade para entender essa decisão".

Esta pausa ocorre no momento em que Trump está no processo de liderar uma reaproximação histórica com Moscovo. Uma mudança de política externa decidida sem consulta aos europeus e que ameaça a Europa, que durante décadas delegou em Washington a responsabilidade pela própria segurança e proteção.
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