Três eleições regionais na Madeira em ano e meio. Como chegámos até aqui?

Dez meses depois da última eleição regional, os madeirenses voltam às urnas para escolher a composição do novo Governo e Parlamento regionais. Este domingo, decorrerá o terceiro escrutínio na região em apenas um ano e meio, desencadeado pela aprovação de uma moção de censura inédita na Madeira no final do ano passado. Dissecamos, neste artigo, os motivos que levaram o arquipélago à atual situação política.

A 17 de dezembro de 2024, o Parlamento madeirense aprovava uma moção de censura inédita. Foi a primeira vez que um Governo regional da Madeira caiu por esta via em cinco décadas de democracia.

A moção apresentada pelo Chega contou com os votos a favor de toda a oposição. De um total de 47 deputados, uma maioria de 26 votou a favor. Contra votaram os 19 deputados do PSD e os dois deputados regionais do CDS-PP.

Dias antes, a 9 de dezembro, a mesma oposição tinha-se unido no chumbo do Orçamento da Madeira para a Assembleia Regional. Mas a atual crise política na Madeira já se prolonga há mais de um ano.
Do apoio do PAN à mega operação
A 24 de setembro de 2023, as eleições regionais na Madeira determinaram a vitória da coligação entre o PSD e o CDS, obtendo em conjunto 23 mandatos.

Ficou, no entanto, aquém dos 24 necessários para obter uma maioria. Os dois partidos negociaram então um acordo de incidência parlamentar com o PAN, que elegeu um deputado, viabilizando dessa forma o Governo.

Esse mesmo apoio viria a ser retirado poucos meses mais tarde após uma operação de larga escala cujos efeitos ainda se fazem sentir na política madeirense.

Em janeiro de 2024, uma megaoperação policial envolveu mais de uma centena de inspetores da Polícia Judiciária e outros peritos do continente que viajaram para a Madeira.

Juntaram-se, no arquipélago, aos inspetores locais para realizarem centenas de buscas por suspeitas de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, prevaricação, recebimento ou oferta indevidos de vantagem, abuso de poderes e tráfico de influência.

Na altura, foram detidos o ex-presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, e os empresários Custódio Correia e Avelino Farinha.

O presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, foi constituído arguido no âmbito deste processo mas recusou demitir-se. Dias depois, o PAN acabaria por retirar o apoio parlamentar, exigindo a saída do líder do executivo da Madeira.
Nova vitória do PSD e a viabilização pelo Chega
A Madeira voltava a votos ao fim de nove meses. Na eleição antecipada de 26 de maio de 2024, o PSD voltou a vencer, mas ficou novamente aquém dos 24 deputados necessários para assegurar a maioria absoluta, mesmo coligado com o CDS-PP. Em conjunto, conseguiu apenas 21 mandatos.

No entanto, os quatro deputados eleitos pelo Chega acabariam por viabilizar, através da abstenção, o Programa de Governo.

Poucos meses depois, em novembro de 2024, o mesmo Chega decidiu apresentar a moção de censura que ditou o fim deste Governo, isto depois do chumbo do Orçamento regional com os votos do PS, JPP e Chega.

O partido justificou a decisão com as diferentes investigações regionais que envolvem não só o chefe do executivo regional, Miguel Albuquerque, mas também quatro secretários regionais que foram constituídos arguidos. Um destes inquéritos, de Eduardo Jesus, secretário de Economia, Turismo e Cultura, foi entretanto arquivado pelo Ministério Público.

A queda do Governo levou o presidente da República a convocar o Conselho de Estado em janeiro último. Marcelo Rebelo de Sousa anunciou depois a decisão de dissolver o Parlamento da região e convocar novas eleições regionais.
Cinco décadas de domínio do PSD

Miguel Albuquerque governa a Madeira desde 2015, após quase quatro décadas de Alberto João Jardim na liderança do PSD Madeira e do Governo regional. Se nas primeiras eleições a que concorreu, em 2015, conseguiu assegurar uma maioria absoluta, nas últimas três eleições, os social-democratas ficaram aquém desse objetivo, necessitando do CDS-PP e depois do PAN para governar.

Nesta altura, os acordos de incidência parlamentar com outros partidos também parecem ser cada vez mais difíceis.

O cabeça-de-lista do PSD e presidente da região admitiu, já durante a campanha, que poderá sair de cena se perder as eleições. “Sou o primeiro responsável pelos bons e maus resultados. Se perder as eleições, não tenho qualquer condição de continuar”, afirmou aos jornalistas nos primeiros dias de campanha.

Ao fim de mais de um ano da operação que levou ao fim do executivo madeirense no início de 2024, o líder do PSD Madeira e do Governo regional ainda espera para ser ouvido como arguido no âmbito do processo judicial na origem de toda a crise e que ainda se encontra em fase de inquérito.

De assinalar também que estas eleições regionais decorrem num contexto complexo também a nível nacional, com a rejeição da moção de confiança por parte do Governo da República, que levou à convocação de eleições legislativas antecipadas para 18 de maio, um ano e dois meses após o último sufrágio.

Mais de 255 mil eleitores estão inscritos para votar nestas eleições regionais, de acordo com os dados do recenseamento da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna.



Foto: Homem de Gouveia - Lusa