Pedro Nuno Santos, que se tornou o nono secretário-geral socialista, já era apontado como o possível sucessor de António Costa.
O novo secretário-geral do PS foi escolhido por 60 por cento dos militantes e chegou ao cargo que desejava há décadas, num percurso que teve sucesso e muitas polémicas.
Pedro Nuno Santos afirmou em dezembro que chegar a líder do PS era um “sonho”.
Quem é o novo secretário-geral do PS?
Natural de São João da Madeira, distrito de Aveiro, Pedro Nuno Santos, neto de sapateiro e filho de empresário, é licenciado em Economia no ISEG, começou a carreira política na Juventude Socialista aos 14 anos e liderou a organização entre 2004 e 2008.
Como líder da JS, esteve na primeira linha em defesa da despenalização da interrupção voluntária da gravidez e depois da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Um passo considerado à época fraturante, que começou por oferecer resistência dentro do PS, então liderado por José Sócrates, com maioria absoluta no parlamento, mas que acabou por ser concretizado em 2010.
No PS, após a saída de José Sócrates em 2011, apoiou António José Seguro para a liderança dos socialistas, contra Francisco Assis, mas o seu alinhamento com o segurismo durou poucos meses. Com Portugal sujeito a assistência financeira externa, demitiu-se de vice-presidente da bancada socialista, semanas depois de ter feito declarações inflamadas, num jantar de Natal partidário, em Castelo de Paiva, a admitir o não pagamento da dívida pública – ação que, na sua perspetiva, iria pôr “as pernas dos banqueiros alemães a tremer”. “Nós temos uma bomba atómica que podemos usar na cara alemães e franceses. E essa bomba atómica é simplesmente não pagamos. Ou os senhores se põem finos, ou nós não pagamos! E se nós não pagarmos a dívida, e se lhes dissermos, as pernas dos banqueiros alemães até tremem!”.
A seguir, fez parte do chamado “grupo dos jovens turcos”, com João Galamba e com os seus sucessores na liderança da JS, Duarte Cordeiro e Pedro Delgado Alves, que defendiam a renegociação da dívida de Portugal perante a troika, contrariando a linha de António José Seguro e, mais tarde, a partir de 2014, também de António Costa.
Pedro Nuno Santos apoiou António Costa contra António José Seguro nas eleições primárias do PS em setembro de 2014 e, após as eleições legislativas de outubro de 2015, foi um dos principais dirigentes socialistas envolvidos nas negociações com o Bloco de Esquerda, PCP e PEV para a formação da Geringonça.
No primeiro dos dois governos minoritários de António Costa, foi secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, tendo negociado, entre outros processos, a viabilização de quatro orçamentos do Estado. No segundo Governo minoritário do PS, acumulou as Infraestruturas com a pasta da Habitação.
Dentro do PS, logo em 2018 Pedro Nuno Santos começou a dar sinais de demarcação política face à direção de António Costa. No congresso desse ano, apresentou uma moção em que defendia, entre outras ideias, um reforço do peso do setor público na economia portuguesa e que foi encarada como uma alternativa. António Costa encerrou esse congresso a avisar que ainda não tinha metido os papéis para a reforma.
Após as legislativas de 2019, com o PCP a prescindir de assinar uma nova declaração conjunta com o PS para reeditar a Geringonça, também criticou a direção socialista por não ter feito um esforço maior para fechar um acordo escrito com o Bloco de Esquerda.
Como ministro com a tutela da TAP, desentendeu-se várias vezes com os representantes privados da empresa e, inclusivamente, com o administrador nomeado pelo Estado Diogo Lacerda Machado, conhecido como “o melhor amigo de Costa”. Com a pandemia da covid-19, concretizou o processo com Bruxelas para a nacionalização da transportadora aérea nacional.
Em 29 de junho de 2022, já no Governo de maioria absoluta do PS, protagonizou o caso mais grave de divergência com o primeiro-ministro ao fazer sair do seu Ministério uma portaria sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa, sem conhecimento de António Costa e contrariando a opção política de acordar este processo com o PSD. António Costa não o demitiu, ao contrário do que se esperava. Exigiu que Pedro Nuno Santos revogasse essa portaria e pedisse desculpa publicamente. Marina Conceição – RTP
Pedro Nuno Santos acabou por se demitir de ministro das Infraestruturas e da Habitação em dezembro de 2022, na sequência do caso que envolveu um pagamento de 500 mil euros, a título de indemnização, à então secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis, para que esta cessasse funções na administração da TAP. Fátima Marques Faria – RTP
António Costa aceitou a demissão e elogiou o agradeceu a Pedro Nuno Santos o empenho com que exerceu funções ao longo de sete anos.
Regressou, como deputado, ao Parlamento em julho de 2023, sentou-se na última fila da hemiciclo e afirmou que regressava para apoiar o Governo e que não era “candidato a nada”. António Nabo/Pedro André Esteves- RTP
Uma semana depois de António Costa ter apresentado a demissão de secretário-geral do PS e de primeiro-ministro, Pedro Nuno Santos apresentou a candidatura ao cargo de líder socialista. Venceu as eleições diretas que decorreram em dezembro de 2023 e foi eleito com 62 por cento dos votos, contra 36 por cento de José Luís Carneiro e um por cento de Daniel Adrião.
Em janeiro, no congresso do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos revelou alguns dos pontos que constariam no programa de Governo, entre as quais a defesa do Estado social. As cinco missões socialistas
No documento de 144 páginas, intitulado “Plano de ação para Portugal Inteiro”, o PS apresenta cinco missões que quer realizar no caso de ser eleito, e formar governo.
A primeira missão do programa socialista é o desenvolvimento de “uma economia inovadora, verde e socialmente justa”, uma economia “mais produtiva que crie mais valor acrescentado, por forma a permitir aumentar os salários e os rendimentos das pessoas”. Para tal, o PS assume que pretende apostar “num Estado transformador que invista em infraestruturas renováveis, na transição digital, no desenvolvimento da ciência e tecnologia, apoiando o nosso sistema de Ensino Superior”.
A segunda missão é “investir e criar condições para termos um Estado social mais moderno e inclusivo que efetive os direitos sociais e combata a pobreza, um Serviço Nacional de Saúde resiliente que deve ser reformado e continuamente melhorado”, uma escola pública de qualidade, “uma habitação digna para todos” e uma Segurança Social sustentável que “assegure o cumprimento do contrato social em que assenta a nossa vida coletiva”.
“Promover e renovar o território inteiro” é a terceira missão do PS, incluindo uma transição climática justa, com políticas de ordenamento do território e de “valorização do Interior”, e ainda desenvolver “todo o potencial económico do mar”.
A quarta é “proteger e promover uma democracia de qualidade para todos, resiliente ao populismo e à demagogia”.
A última missão deste plano socialista é “reforçar o papel de Portugal na Europa e no Mundo, adotando uma atitude solidária, exigente e propositiva na União Europeia, e uma política externa humanista e construtiva”.
Saúde
O PS pretende iniciar negociações imediatas com os profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) para rever carreiras e valorizar salários.
Ainda no SNS, o programa prevê a “equiparação da posição de entrada dos enfermeiros aos licenciados da carreira geral da administração pública”, assim como a atribuição de incentivos especiais aos profissionais que trabalhem em territórios menos atrativos, através de apoios ao alojamento e às famílias.
O PS pretende também rever e “dignificar a carreira” dos administradores hospitalares e das chefias intermédias do SNS, promovendo a sua valorização salarial e a adoção de um modelo de avaliação de desempenho adequado.
Já em relação ao modelo de governação do SNS, o documento aponta para uma maior articulação e integração entre os cuidados de saúde primários, hospitalares e cuidados continuados, contrariando assim a “excessiva centralidade da rede hospitalar e a duplicação de custos” nesse serviço público.
“Criar uma rede de atendimento permanente, a funcionar em centros de saúde de referência, para reduzir o recurso às urgências hospitalares”, bem como aumentar os meios complementares de diagnóstico e terapêutica, com os respetivos técnicos, ao nível dos cuidados de saúde primários, são outras das propostas apresentadas pelo partido de Pedro Nuno Santos.
Educação
O PS pretende iniciar negociações com os representantes dos professores com vista à recuperação do tempo de serviço de forma faseada.
“Desburocratizar a função docente, garantindo que as escolas têm as condições e meios necessários e adequados para assegurar o trabalho administrativo – burocrático”, é outro dos temas.
O PS quer ainda avançar com uma “avaliação da rede de ensino público nacional”, no sentido de corrigir eventuais desequilíbrios e expandir a oferta nas zonas de maior pressão demográfica.
“Garantir a frequência da educação pré-escolar a todas as crianças a partir dos três anos. E instituir, de forma gradual, a obrigatoriedade da educação pré-escolar a partir dos 4 anos” tendo em conta o seu caráter preditor de aprendizagens de sucesso nos primeiros anos de escolaridade, é outra das propostas socialistas.
Além disso, o PS quer continuar a capacitação digital das escolas, “num currículo em que as competências digitais são trabalhadas a par das artes, da educação física e das humanidades”.
Pretende também “atualizar os valores que constituem referência para acesso à Ação Social Escolar”, continuando a reconhecer esta como uma ferramenta concreta de alavancagem e alisamento da igualdade de oportunidades e “garantir aos alunos do ensino secundário beneficiários da Ação Social Escolar a possibilidade de usufruírem de tutorias e/ou apoios especializados (explicações) ”.
O PS quer criar um programa de “alargamento de vagas no ensino superior para adultos”, nomeadamente em regime pós-laboral, de modo a atingir a prazo 25 por cento da capacidade instalada ao nível das licenciaturas para estes públicos.
Outra das propostas passa por “reforçar as condições de alojamento estudantil”, procurando atingir em 2028 as 30 mil camas em oferta pública de alojamento.
Salários e impostos
O programa eleitoral dos socialistas propõe aumentar o salário mínimo nacional, que atualmente é de 820 euros, mil euros até ao final da próxima legislatura, em 2028, num quadro de acompanhamento regular da dinâmica salarial no mercado de trabalho.
“Discutir com os parceiros sociais a adoção de instrumentos de melhoria das situações laborais das empresas”, designadamente a partir do aumento da transparência sobre os níveis de rotatividade nos quadros de pessoal e dos leques salariais praticados.
Quer ainda aprofundar a relação entre políticas ativas de emprego e o trabalho digno e em particular “reforçar os mecanismos de focalização e seletividade das políticas ativas e os mecanismos de prevenção da precariedade”, e assegurando uma avaliação regular sobre os resultados dos programas promovidos pelo IEFP, em particular estágios e apoios à contratação, é outro dos objetivos.
O Partido socialista pretende ainda “promover um maior alinhamento entre a política ativa de emprego” e a política económica do país, mobilizando estes instrumentos de política pública para o esforço de transformação da economia e apostando em programas e condições específicas direcionados para setores emergentes, considerados prioritários ou com forte potencial de crescimento e qualificação da economia portuguesa.
Ao longo da próxima legislatura, o partido de Pedro Nuno Santos “compromete-se a reforçar a redução do IRS para a classe média”, dentro da margem orçamental, diminuindo as taxas marginais.
Atualizar os limites dos escalões do IRS de acordo com a taxa de inflação, impedindo que os contribuintes vejam a sua tributação aumentar por este efeito.
Alargar o “IRS Jovem” a todos os jovens, independentemente do nível de escolaridade atingido.
No IRC, o PS promete reduzir em 20 por cento as tributações autónomas sobre viaturas das empresas, diminuindo o nível de tributação sobre a esmagadora maioria das empresas.
No IVA as propostas passam pela “devolução em IRS às famílias com menores rendimentos parte do IVA suportado em consumos de bens essenciais”, incluindo às famílias que não pagam IRS.
Proteção Social
O PS assegura que cumprirá integralmente a fórmula de atualização das pensões, sem prejuízo de “uma valorização adicional nos grupos mais desfavorecidos", permitindo que os “pensionistas mantenham níveis de vida dignos face aos que tinham na idade ativa, e de melhorias ao próprio modelo”.
Para isso, o partido propõe-se avaliar alterações ao modelo de atualização das pensões, que podem incluir a ponderação, na indexação da atualização, de outras variáveis macroeconómicas, como a variação da massa salarial, para cálculo dos aumentos, assim como a garantia de aumentos mínimos, “prevenindo a estagnação dos valores das pensões mais baixas”.
Os socialistas garantem rejeitar “quaisquer tentativas de privatização, total ou parcial do sistema de pensões” bem como de qualquer "exercício ou experiência de "plafonamento" de contribuições e pensões e que vão reforçar a sustentabilidade do sistema de pensões, apostando na diversificação de fontes de financiamento da segurança social.
O partido de Pedro Nuno Santos propõe o “alargamento da consignação de impostos para reforço do sistema de pensões” e lançar um debate sobre formas alternativas de financiamento da Segurança Social.
A revisão da regra de formação das pensões contributivas "para que seja menos penalizadora das carreiras intermitentes e mais favorável à formação de pensões dignas para pessoas com baixos salários" é outro ponto do programa socialista.
O PS promete também promover modelos de transição faseada entre a atividade e a reforma, "através da concretização da possibilidade de reforma a tempo parcial".
Quanto ao Complemento Solidário para Idosos (CSI), os socialistas propõem assegurar que o valor de referência se mantém "pelo menos em linha com o limiar da pobreza e excluindo os rendimentos dos filhos" para determinação dos recursos dos requerentes, sendo ponderados outros ajustamentos.
Justiça
O PS quer uma justiça mais eficiente, transparente e acessível, com as forças de segurança, que atuam como “agentes do Estado de Direito”, valorizadas.
No plano da Justiça Penal, o PS propões “dotar o Ministério Público e os órgãos de polícia criminal dos meios (inclusive, tecnológicos) para investigar novas formas de criminalidade”, bem como para constituir equipas interdisciplinares de magistrados de investigação criminal.
“Rever as regras sobre conexão de processos, assim evitando os megaprocessos”, relativamente aos quais a morosidade se coloca de forma particularmente grave e “permitir a suspensão provisória do processo para um número mais alargado de crimes”, desde que todas os sujeitos processuais estejam de acordo.
No eixo da transparência, o PS propõe publicitar periodicamente estatísticas por tribunal, “incluindo o número de processos pendentes, a duração média dos processos, a percentagem de revogação de decisões por tribunais de recurso, o número de processos prescritos e em risco e prescrição, bem como os tempos médios expectáveis associados aos processos”.
O PS pretende ainda “equacionar, em articulação com os Conselhos Superiores, a criação de novas ferramentas de trabalho no plano da gestão processual” que permitam rentabilizar a tecnologia existente.
“Reforçar o papel do Conselho Consultivo da Justiça, como forma de melhorar o diálogo entre todos os atores”.
“Rever e valorizar as carreiras dos oficiais de Justiça, dos conservadores e oficias de registo”, garantir a adequada formação inicial e valorizar os respetivos conteúdos funcionais e “repensar o modelo de recrutamento e de seleção dos novos magistrados judiciais e do Ministério Público”.
O PS quer ainda “reforçar os recursos e medidas de prevenção e combate à violência contra as mulheres”, envolvendo o sistema educativo, o sistema de justiça penal e de família, as forças policiais e os meios de comunicação social.
Ambiente
Em termos ambientais, o PS propõe a “criação de incentivos para aproveitamento de energia solar” em coberturas de parques de estacionamento ou outros edifícios em ambiente urbano.
Lançar uma Estratégia Nacional de armazenamento de Energia até 2026, “acelerando o investimento na capacidade de armazenamento do país, que poderá ser feita através de baterias associadas a parques eólicos e fotovoltaicos”.
O programa eleitoral socialista defende ainda o “uso eficiente dos recursos naturais” e um planeamento do abastecimento de matérias-primas essenciais para a transição energética, “nomeadamente através da prospeção e pesquisa de lítio”.
Para combater a pobreza energética, a proposta passa por “avaliar o aumento da comparticipação do Vale Eficiência e acelerar o investimento na reabilitação energética de edifícios e de condomínios”.
Desenhar um mecanismo permanente, após conclusão do PRR em 2026, de apoio à melhoria da eficiência energética das habitações.
Melhorar a qualidade de vida e bem-estar da população, “promovendo a qualidade do ar e a prevenção e controlo da poluição, reduzindo as emissões, controlando e revendo a lei do ruído ambiente tal como da poluição luminosa”, aprovando um regime prevenção da contaminação e a remediação dos solos contaminados, “implementando o regime de prevenção e remediação dos danos ambientais, com a responsabilização das entidades que deram origem à situação”.
Habitação
O PS pretende que o Estado preste uma garantia pública ao financiamento do crédito para habitação própria contraído por pessoas até aos 40 anos que não tenham casa em seu nome.
E, “em caso de incumprimento do pagamento do crédito à habitação pelos beneficiários dessa garantia, o devedor pode, contratualizando com o Estado”, manter a casa como habitação permanente, mediante o pagamento de uma renda ao Estado.
Do programa eleitoral do PS faz ainda parte uma proposta de “agravamento das mais-valias com imóveis adquiridos e vendidos sem que tenham sido recuperados ou habitados” e o “aumento da despesa dedutível com arrendamento em sede de IRS em 50 euros por ano até atingir os 800 euros”.
O PS quer também rever a fórmula de cálculo para atualização de rendas, “passando a incluir a evolução dos salários nos critérios de atualização em anos em que a inflação supere os dois por cento” e criar uma entidade fiscalizadora do arrendamento.
“Aumentar a abrangência do programa Porta 65 e alargar o parque público de habitação para atingir os cinco por cento no médio prazo”.
Criar o Balcão Mais habitação e concretizar o Código da Construção até 2026, são outras das propostas do partido liderado por Pedro Nuno Santos.