“Temos listas paritárias e queremos representação parlamentar e trazer mais assuntos de que não se fala”, dando o exemplo do desconforto térmico que os portugueses sentem durante os invernos.
O historiador de 49 anos demarca-se das políticas de PCP e BE mas não fecha a porta ao Partido Socialista, apesar do receio de um bloco central com o PSD, algo que Rui Tavares acredita ser um “mau cenário” para Portugal e que pode vir a aumentar os extremismos no país.
O Livre diz ser a verdadeira alternativa nestas eleições, a única escolha com sentido a 30 de janeiro de 2022. Rui Tavares fala da esquerda verde que em toda a Europa tem levado à criação de governos (caso da Alemanha) e promete compromisso e diálogo, duas componentes que acha faltarem à esquerda de hoje em Portugal.
Nas legislativas com Joacine Katar Moreira na memória
Seis de outubro de 2019. Criado em 2014, o Livre festejou nas eleições legislativas de 2019 a eleição do seu primeiro deputado parlamentar. A encabeçar a lista de Lisboa, Joacine Katar Moreira chegou à Assembleia da República para trazer uma nova esquerda ao Parlamento.
O casamento durou pouco e o divórcio foi litigioso. O mal-estar começou em novembro, pouco mais de um mês após as legislativas. Em causa, uma condenação de uma agressão de Israel a Gaza, apresentada pelo PCP. A deputada absteve-se e causou polémica no seio do partido.
O Livre veio a público dizer que se revia no texto do Partido Comunista e que não se revia na decisão de Joacine Katar Moreira. A deputada tentou explicar a intenção de voto, alegando “dificuldades de comunicação”.
Nas redes sociais, a deputada única do Livre responsabilizou-se pelo voto e chegou a afirmar que havia votado contra si própria, sendo ela uma apoiante da causa palestiniana. “A votação não se deveu a uma falta de consciência ou descaso desta grave situação mas à dificuldade de comunicação” com a direção do partido.
O mal estava feito. O Livre veio a público mostrar preocupação pelo sentido de voto da única deputada que tinha no Parlamento, explicando que Joacine Katar Moreira foi contra o programa eleitoral e tomadas de decisão do partido, que defende a causa palestiniana.
Em meados de Janeiro os ânimos exaltaram-se. O partido foi a Congresso e acusou a deputada única de deslealdade, intransigência, isolamento e incompetência. Joacine Katar Moreira, num discurso político altamente mediatizado, queixou-se de perseguição política.
“Vocês fazem uma análise olhando para o mediatismo, e usam o ódio do qual tenho sido alvo para tentarem afastar-me”, gritou Joacine visivelmente exaltada.
O partido pediu depois a retirada de confiança política à deputada e Joacine Katar Moreira respondeu que não renunciaria ao cargo para que foi eleita.
“São vocês que vão decidir se vão silenciar as 57 mil pessoas que votaram porque queriam uma voz na Assembleia. Se vocês querem substituir a minha voz, lamento informar, elegeram uma mulher que gagueja muito bem e que nunca escondeu isso. Elegeram uma mulher negra que foi útil para a subvenção e tem que ser útil para vos defender”.
Os argumentos foram postos em cima da mesa mas no Congresso adiou-se a moção de rejeição à deputada única. No dia 31 de janeiro de 2020 foi anunciada a retirada de confiança política a Joacine Katar Moreira, que se tornou uma deputada não-inscrita.
O Livre acabava de perder a sua representação parlamentar e Joacine perdia direitos na Assembleia.
Esquerda útil para o regresso à normalidade
Depois de Joacine Katar Moreira, Rui Tavares. A cara mais proeminente do partido é agora cabeça de lista por Lisboa e candidata-se a um lugar no Parlamento, lugar que o historiador acredita sem dúvidas que vai alcançar.
O mesmo foi confirmado em entrevista a Vítor Gonçalves, na RTP. Questionado sobre se a ruptura com a antiga deputada do Livre podia ser prejudicial para as legislativas de 2022, Rui Tavares disse não acreditar em efeitos colaterais e pediu aos votantes para fazerem uma avaliação da situação e que vejam o partido como uma proposta viável à esquerda, que quer uma alternativa de esquerda no Governo do país.
No programa eleitoral do Livre, o partido toca em vários setores da sociedade. Denominando-se como um partido libertário e verde, o Livre pretende uma nova economia, segundo o modelo dos países nórdicos, e uma preocupação com os problemas climáticos dos dias de hoje.
- Pelo desenvolvimento ecológico e solidário, pedindo um novo pacto verde;
- Pela igualdade, justiça social e liberdade, querendo combater a pobreza, lutar contra a segregação e a discriminação por orientação sexual, identidade e expressão de género e combater a violência de género;
Veja aqui o programa eleitoral do Partido Livre.- No setor da Saúde, o Livre quer prevenir a doença, aprender com a pandemia, reforçar o Serviço Nacional de Saúde e promover a permanência de profissionais no mesmo, apostar na saúde mental dos portugueses e facilitar o acesso a cuidados de saúde;
- Na Educação, o partido pretende reforçar o ensino público, dignificar a carreira de professor, valorizar pessoal não docente e promover a cidadania na escola;
- Na Cultura, é pedida nova legislação para o setor, maior financiamento e revisão do estatuto dos profissionais da Cultura para terminar com a precariedade, lutar contra o monopólio de grupos editoriais e assegurar a sobrevivência de livrarias independentes. Fala-se de um apoio mais efetivo à RTP e o pedido para a descolonização da cultura, contextualizando a história de Portugal;
- O Livre, assumidamente partido verde, pretende alertar para os problemas da Emergência Climática e Energia, declarando emergência climática nacional, reivindicar a neutralidade carbónica a todos os Estados da União Europeia até 2050, priorizar a eficiência energética, aposta nas fontes renováveis de energia, fomento da neutralidade carbónica no setor público e a criação de uma taxa universal sobre o carbono;
- Na Agricultura, o Livre diz querer concluir o Plano Estratégico da PAC 2023-2027, reconhecer o papel da mulher na agricultura, a criação de um observatório de alimentação, combater o processo de desertificação e revitalizar o Conselho Nacional da Floresta;
- Na Justiça, o partido pede maior rapidez e eficácia no sistema, acesso a recursos que permitam a toda a população aceder à justiça, reformar o sistema prisional e descriminalizar a “Ofensa à Honra do Presidente da República;
- Em termos de defesa da democracia, o Livre quer implementar o voto a partir dos 16 anos, uma revisão das subvenções públicas aos partidos, reformar o sistema eleitoral, descentralizar competências, garantir um acesso livre aos meios de comunicação social e defender o princípio básico da liberdade de expressão;
- No que à corrupção diz respeito, o partido liderado por Rui Tavares pretende a criação de uma agência pública e independente para centralizar as funções do Conselho de Prevenção da Corrupção, proteger denunciantes, promover o avanço na lei do enriquecimento ilícito ou injustificado e garantir a transparência e acesso aos dados;
- Por último, o Livre quer um Portugal forte na Europa, defendendo a criação de uma democracia europeia, baseada na soberania de cada Estado-membro. O partido também quer o relançar da economia europeia no mundo, lutar por uma política de comércio justo e participar na construção de uma democracia global. A defesa do direito à auto-determinação do povo palestiniano também está expressa no programa eleitoral.
No próximo dia 30 de janeiro, o Livre tem a estratégia bem definida: viabilizar uma opção governativa à esquerda e eleger, pelo menos, dois deputados para a Assembleia da República.