PP espanhol já cruzou "linhas vermelhas" com Vox e admite aliança com Meloni

por Lusa

O Partido Popular espanhol cruzou no último ano as "linhas vermelhas" em debate nas eleições europeias com acordos com a extrema-direita que o colocaram no poder em quatro regiões, mas também, segundo analistas, num "jogo difícil" de gerir.

O presidente do PP, Alberto Núñez Feijóo, admitiu na semana passada alianças também em Bruxelas do Partido Popular Europeu (PPE) com a formação da direita radical da primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, alinhando assim com declarações da presidente da Comissão Europeia e recandidata ao cargo, Ursula von der Leyen.

"Em Itália, eu ficaria atento ao posicionamento de Meloni. Não tenho informação, suficiente, mas não me parece comparável a outros partidos que se consideram de extrema-direita na Europa", afirmou Feijóo.

O PP, que lidera as sondagens das europeias em Espanha, poderá eleger 23 eurodeputados no próximo domingo e contribuir com o maior número de lugares para o PPE a seguir à CDU da Alemanha, de Ursula von der Leyen. As sondagens a nível europeu revelam, em paralelo, um crescimento da direita radical.

A presidente da Comissão Europeia assumiu na campanha trabalhar com partidos à direita da CDU, de cujo apoio poderá precisar, neste contexto, para se manter no cargo, estabelecendo três "linhas vermelhas" para o PPE dialogar com outros grupos políticos (incluindo a extrema-direita): visão europeísta, posição a favor da Ucrânia e o cumprimento do Estado de direito. E apontou Meloni como exemplo de alguém à sua direita com quem trabalhar.

Giorgia Meloni lidera o partido italiano Irmãos de Itália e, no Parlamento Europeu, o grupo Conservadores e Reformistas (ECR), de que também faz parte o Vox.

Para o politólogo especialista na direita radical europeia Guillermo Fernández, da Universidade Carlos III, de Madrid, que falava recentemente à rádio Cadena SER, o Irmãos de Itália é um partido "comparável com outros partidos de extrema-direita europeus", tanto "do ponto de vista ideólogico como programático", como revelam, por exemplo, semelhanças entre os programas de governo de Meloni em Itália e os de executivos autonómicos espanhóis em que está o Vox.

Em Espanha, no último ano, PP e Vox assinaram acordos de governo em mais de uma centena de municípios e em quatro regiões, passando a estar juntos à frente de cinco executivos autonómicos.

No plano nacional, porém, os dois partidos estão em confronto, assumido sobretudo pelo Vox desde finais do ano passado, por considerar que o PP não usou todos os poderes que tem a nível institucional para travar a lei de amnistia para os independentistas catalães.

Na campanha eleitoral destas europeias, o Vox tem como alvo tanto a esquerda como o PP, que designa sistematicamente como "`direitita` cobarde", insistindo muito em que no Parlamento Europeu os populares votam em 90% dos casos ao lado dos socialistas e sociais-democratas.

Como poderá acontecer com Ursula von der Leyen depois das eleições do próximo fim de semana, as alianças com a direita mais radical foram a forma que o PP teve de chegar ao poder em regiões e municípios em Espanha, um caminho que não resultou a nível nacional, nas eleições legislativas de julho de 2023, em que os dois partidos ficaram a quatro deputados de uma maioria absoluta.

Para o poltólogo Oscar Martínez Tapia, "o PP tem um problema muito grande com o Vox", partido sem o qual "não pode funcionar politicamente neste momento" e que em sucessivas eleições tem garantido sempre cerca de 12% dos votos, sem que os populares lhe consigam roubar eleitorado.

"É um jogo muito difícil aquele que tem de fazer o PP neste momento. Por um lado, tem de ser moderado e um partido de Estado e, por outro, tem de fazer algumas concessões para tentar atrair votantes do Vox", disse à Lusa o professor de Ciência Política da IE University, de Madrid, que deu como exemplo destas concessões um discurso de Feijóo sobre a imigração na "`boderline` da xenofobia" no final da campanha das eleições catalãs de maio passado.

"Move-se num terreno muito complicado", de "ambiguidade", num "puzzle muito difícil de resolver", defendeu Oscar Martínez Tapia, que considerou que apesar disto, os governos regionais PP/Vox funcionam e não parecem instáveis.

Para o politólogo, a nível autonómico, PP e Vox acordaram "programas muito bem desenhados" em que evitaram e é possivel contornar temas com mais impacto e mais polémicos como o da gestão da imigração.

Oscar Martínez Tapia destacou que, ainda assim, o Vox tem conseguido controlar pastas como a da cultura a nível local e regional, com notícias frequentes de censura a espetáculos ou obras de arte.

Recentemente, ganharam estatuto de polémica nacional e até internacional leis de três governos regionais PP/Vox que um relatório das Nações Unidas considerou ameaçar "a memória histórica de graves violações de direitos humanos" durante a ditadura e a guerra civil espanholas.

"A nível autonómico é muito mais fácil de funcionar com este tipo de maiorias porque fazem menos ruído, mas a nível nacional é outra liga", defendeu Oscar Martínez Tapia, para quem, neste momento, será difícil haver em Espanha um governo nacional com os atuais protagonistas do PP e do Vox, "um cartaz com demasiada testosterona", sobretudo no caso de Santiago Abascal, o líder do partido de extrema-direita, que tem um discurso mais violento e radical.

"A ideia de Santiago Abascal como vice-presidente [do governo] dá muito medo", defendeu.

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