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Destaques da legislatura europeia. A reforma do Pacto de Estabilidade e Crescimento

Entrevista a Rui Henrique Alves, professor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto e ex-coordenador do Núcleo de Economia e Finanças da Representação Portuguesa junto da União Europeia.

O que é o Pacto de Estabilidade e Crescimento?

O Pacto de Estabilidade e Crescimento é, digamos assim, a Bíblia das Regras Orçamentais da União Europeia, isto é, tem um conjunto de elementos que mostram o modo como um país deve comportar-se em termos de contas públicas, quando é membro da União Económica e Monetária.

Em particular, para poder estar na moeda única, o país tem de manter finanças públicas saudáveis de forma a não ter problemas que fora da moeda única seriam só seus mas que dentro da Zona Euro acabam por ser problemas para todos.

Quais são as regras deste Pacto?

As mais conhecidas são as que se referem aos critérios da dívida e do défice, isto é, a ideia de que o défice público não deve ultrapassar os três por cento do PIB e que a dívida pública não deve ultrapassar os 60 por cento do PIB ou, pelo menos, deve estar numa trajetória descendente a um ritmo suficiente para atingir esse valor de referência.

Estas são duas regras muito simples, mas que depois tem uma aplicação prática muito mais complexa e que remete para outros indicadores que têm sido relativamente discutíveis e que muitas vezes são até difíceis de perceber pelo comum dos mortais – eu diria não só pelo comum dos mortais, mas até pelos economistas – uma das vertentes que mais tem sido usada é o chamado Saldo Orçamental Estrutural, que não é um indicador que possa ser objetivamente calculado, é estimado – há muitas formas de o estimar e muitas revisões ao longo do tempo e é muito difícil de explicar às pessoas. Portanto, o pacto em si tem essas duas regras muito simples, mas depois a sua aplicação tem vindo ao longo do tempo a tornar-se muito complicada e até difícil de a fazer entender.

Se os países falharem os critérios do défice e da dívida, entram em procedimentos por défice excessivo?

Exatamente, se os países ultrapassarem estes critérios – isto tem sido sobretudo do critério do défice – é aberto esse tal Procedimento por Défice Excessivo que implica, nomeadamente, que ao país seja estabelecido um programa – que não é um programa da troika – mas é um programa que ele deve cumprir no sentido de corrigir a trajetória das contas públicas e que normalmente envolve políticas restritivas.
Mas agora foram aprovadas alterações significativas.

O que vai acontecer a partir de agora, de uma forma muito simples, é que os dois grandes critérios mantêm-se e – são, digamos assim, os pilares que não mudam no Pacto de Estabilidade e Crescimento – mas o país vai poder negociar com a Comissão Europeia uma espécie de programa de sustentabilidade das suas contas públicas, um programa para entre quatro a sete anos, em que dentro de um conjunto de linhas que são estabelecidas a nível técnico pela Comissão Europeia, o país vai poder, digamos assim, escolher melhor o seu caminho em termos do que é a política orçamental que quer seguir e em que o controlo vai ser sobretudo feito, ou seja, a monitorização vai ser sobretudo feita, por um indicador que está mais na mão dos governos controlarem que é a chamada despesa primária líquida. De que é que eu estou a falar? Basicamente da despesa do Estado – fora os juros da dívida pública – que se refere aos salários, estamos a falar nas transferências, estamos a falar nos subsídios, etc., etc.

Portanto, estamos a falar de decisões competem ao Estado.

Por exemplo, os juros da dívida pública obviamente têm a ver com decisões do Estado, mas têm também a ver com decisões de governos passados e estão relacionados com as taxas de juro que é o mercado que decide. O saldo orçamental estrutural, como eu dizia, é algo muito mais complicado e, portanto, temos agora um indicador muito mais simples para podermos ver se o país está na boa trajetória ou não.

Pode dizer-se que esta é uma das “lições da pandemia”?

Eu acho que são mais do que lições da pandemia, porque esta discussão sobre a aplicação concreta do Pacto de Estabilidade e Crescimento já vem de há muitos anos. Houve uma grande alteração logo a seguir à crise financeira, à crise económica, à crise das dívidas soberanas, que tornou a aplicação, na minha opinião, ainda mais restritiva do que aquilo que era antes, e começou a ver-se muitas dificuldades por esse prisma quando há que reagir a choques negativos e a situações específicas dos países.

E portanto, um dos grandes problemas era um pacto que no fundo tem uma receita igual para todos. Nós vamos continuar a ter receitas iguais para todos, nomeadamente os critérios, mas cada um vai poder ter alguma margem de manobra no sentido de adequar à sua economia a trajetória para as contas públicas saudáveis e portanto, do ponto de vista teórico, esperamos que seja mais fácil de cumprir e que os governos de facto cumpram mais razoavelmente do que no passado.

Mas as regras do PEC estão, para já, suspensas. Foram suspensas durante a pandemia mas vão regressar?

Sim, os países têm agora de apresentar este primeiro programa em setembro deste ano o que quer dizer que, a partir do próximo ano, as regras estão aí em toda a força embora nesta nova versão, digamos assim.

Para consulta

https://www.europarl.europa.eu/news/pt/press-room/20240419IPR20583/parlamento-aprova-novas-regras-orcamentais-da-uniao-europeia

https://www.europarl.europa.eu/factsheets/pt/sheet/89/o-quadro-da-ue-para-as-politicas-orcamentais