Setor automóvel cai nas bolsas após anúncio de tarifas norte-americanas

por Cristina Sambado - RTP
Issei Kato - Reuters

Os fabricantes de automóvel europeus e asiáticos caíram esta quinta-feira na abertura das bolsas, depois do anúncio de tarifas adicionais de 25 por cento sobre carros fabricados fora dos Estados Unidos impostas pelo presidente norte-americano, Donald Trump.

As três maiores fabricantes de automóveis asiáticas, Toyota, Honda e Nissan, perderam 2,04, 2,47 e 1,67 por cento, respetivamente, no índice da bolsa de Tóquio (Nikkei), que reúne as 225 empresas mais representativas do mercado e encerrou o dia com queda de 227,32 pontos, fixando-se em 37.799,97.

A Hyundai, maior fabricante de automóveis coreana, perdeu 4,28 por cento, a Kia Motors 3,45 e a Mitsibishi 3,20. Quase metade dos 16 milhões de carros vendidos nos EUA no ano passado foram importados, com um valor total superior a 330 mil milhões de dólares.

Na Europa, os fabricantes e fornecedores de automóveis também caíram, com a Porsche a perder 4,30 por cento na bolsa de Frankfurt, a Mercedes a recuar 4,31 por cento, a BMW 4,09, a Daimler 3,18 e a Continental 2,71 por cento.

Na bolsa de Paris, a Stellantis caiu 6,12 por cento, a Valeo 5,65 e a Forvia 5,42. Na quarta-feira, Donald Trump anunciou que as novas tarifas adicionais de 25 por cento que serão aplicadas a "todos os carros não fabricados nos Estados Unidos" a partir de 2 de abril.

A taxa aplicada até agora era de 2,5 por cento, o que significa que os carros importados serão agora taxados em 27,5 por cento do seu valor.Tarifas de Trump prejudicam todos
A Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis (ACEA) lembrou esta quinta-feira que as tarifas instituídas por Donald Trump terão um impacto negativo global no setor, incluindo para os fabricantes americanos.

"Pedimos ao presidente [Donald] Trump que considere o impacto negativo das tarifas, não apenas sobre os fabricantes globais, mas também sobre a indústria nacional dos EUA", disse a diretora-geral da ACEA, Sigrid de Vries.


As tarifas não afetarão apenas as importações para os EUA, uma penalização que deverá ser suportada pelos consumidores americanos, mas as medidas sobre peças para automóveis também prejudicarão os fabricantes que produzem carros nos EUA para mercados de exportação, observou.

Os fabricantes de automóveis alemães também criticaram o aumento das taxas alfandegárias sobre automóveis, considerando-as "um sinal fatal para o livre comércio".

Os 25 por cento de taxas alfandegárias adicionais "representam um fardo considerável para as empresas e cadeias de fornecimento globais" na indústria automóvel, "com consequências negativas, especialmente para os consumidores, inclusive na América do Norte", considerou a Associação Alemã de Fabricantes de Automóveis (VDA), em comunicado.

"As consequências serão sentidas no crescimento e na prosperidade de todos os lados", acrescentou a VDA, pedindo aos Estados Unidos e à União Europeia (UE) que entrem rapidamente em negociações para encontrar uma "abordagem mais equilibrada".

"O risco de um conflito comercial global" é "alto em todos os lados", alertou.

Também a indústria automóvel britânica pediu que Londres e Washington consigam um acordo para evitar tarifas,
após o anúncio de Donald Trump, que consideraram "dececionante".

"Em vez de impor tarifas adicionais, deveríamos explorar formas de criar oportunidades para os fabricantes do Reino Unido e dos EUA", disse Mike Hawes, presidente executivo da associação do setor (SMMT), num comunicado emitido na noite de quarta-feira.

O Reino Unido está atualmente em negociações com os Estados Unidos para concluir um acordo económico que lhe permita evitar as tarifas alfandegárias americanas, que têm vindo a ser impostas a muitos países há semanas.

O setor automóvel britânico, que viu sua produção prejudicada no ano passado pela transição para veículos elétricos, já tinha manifestado preocupação em janeiro com as ameaças de taxas alfandegárias adicionais nos Estados Unidos.

Os fabricantes norte-americanos de automóveis também vão ser afetados com a imposição das taxas, uma vez que o seu modelo de negócio incorpora em grande parte o México e o Canadá, onde têm fábricas.


É “crucial” que as tarifas não “façam subir os preços para os consumidores”, alertaram esta quinta-feira a Ford, a GM e a Stellantis, num comunicado divulgado pela Associação Americana de Fabricantes de Automóveis (AAPC), defendendo a “competitividade” da produção automóvel “norte-americana”, que inclui o Canadá e o México.

Até Elon Musk, conselheiro de Donald Trump, receia ficar a perder. O multimilionário reconheceu que uma das suas empresas, a fabricante automóvel Tesla, não será poupada à política tarifária implementada pela Administração norte-americana.

"É importante notar que a Tesla não saiu ilesa deste problema. O impacto das tarifas na Tesla continua a ser significativo", disse Musk numa breve mensagem na rede social X, da qual também é proprietário.

A Tesla, que até ao ano passado era o maior vendedor mundial de automóveis elétricos, foi destronada desta posição pela chinesa BYD no último trimestre do ano passadoUnião Europeia vai proteger interesses
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, lamentou decisão do presidente norte-americano, garantindo que a União Europeia vai proteger os seus interesses.

Lamento profundamente a decisão dos EUA de impor tarifas sobre as exportações automóveis europeias”, destacou Von der Leyen, num comunicado.


A responsável da Comissão Europeia garantiu que irá avaliar este anúncio de Trump, bem como "outras medidas que os EUA estão a prever para os próximos dias”.

“A União Europeia continuará a procurar soluções negociadas, salvaguardando ao mesmo tempo os seus interesses económicos”, frisou.

“Como uma grande potência comercial e uma comunidade forte de 27 Estados-membros, protegeremos conjuntamente os nossos trabalhadores, empresas e consumidores em toda a União Europeia”, acrescentou.

Von der Leyen frisou ainda que a indústria automóvel “é um impulsionador da inovação, competitividade e empregos de alta qualidade, através de cadeias de abastecimento profundamente integradas em ambos os lados do Atlântico”.

Para a política alemã, as “tarifas são impostos – maus para as empresas, piores para os consumidores, tanto nos EUA como na União Europeia”.

Já o líder do Partido Popular Europeu (PPE) no Parlamento Europeu, o alemão Manfred Weber, considerou esta quinta-feira que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está a cometer “um grande erro” ao anunciar um aumento das taxas alfandegárias norte-americanas sobre os automóveis.

“Penso que está a cometer um grande erro”, disse Manfred Weber numa conferência de imprensa à margem de uma reunião do gabinete do PPE em Paris.


Está a construir muros comerciais e todos vão sofrer, tanto os europeus como os americanos. Não haverá vencedores”, lamentou, assegurando que “ainda tem esperança de convencer os nossos amigos americanos de que este não é o caminho a seguir”. Canadá fala em “ataque direto”
O primeiro-ministro canadiano, Mark Carney, classificou a tarifa aplicada pelo Presidente dos Estados Unidos Donald Trump sobre todos os automóveis importados como um "ataque direto" ao seu país.

Carney acrescentou que o Canadá responderá de forma unificada e que, embora as tarifas prejudiquem a economia canadiana, está a considerar medidas não tarifárias contra os Estados Unidos.

"Defenderemos os nossos trabalhadores, defenderemos as nossas empresas, defenderemos o nosso país. E defendê-lo-emos em conjunto. Os Estados Unidos estão divididos, e isso é debilitante", realçou o primeiro-ministro canadiano.

Além das suas próprias tarifas de retaliação, Carney afirmou que o Canadá "tem outras opções".

"Vou reunir-me com o gabinete amanhã para discutir opções", vincou o líder canadiano, que reconheceu que ainda não tem a ordem executiva assinada por Trump, pelo que não sabe ao certo o impacto das tarifas.

Carney já tinha alertado que a guerra comercial de Trump “está a prejudicar os consumidores e os trabalhadores americanos e vai doer mais”. Portugal exporta cerca de quatro por cento
Portugal exporta apenas quatro por cento dos 320 mil automóveis fabricados no território para os Estados Unidos. Hélder Pedro, presidente da Associação Automóvel de Portugal, apelou à União Europeia para que mantenha um diálogo com os EUA para “reverter ou minimizar a medida”. Para a Associação Automóvel de Portugal, "a economia está globalizada, a redução das taxas alfandegárias, nas últimas décadas contribui para o crescimento do PIB a nível global. E esta aplicação da taxa, quer aos veículos, no nosso caso, quer aos componentes a partir de 3 de maio, é negativa para a economia, para o setor"

Hélder Pedro considera ainda que a medida "é negativa para o setor automóvel, mas é, em primeiro lugar negativa para a economia americana, para os consumidores americanos".

"Os construtores automóveis europeus têm fábricas nos Estados Unidos e irão também ser afetados localmente na produção, com o custo dos componentes", recordou.

c/ agências
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