Processos sobre contas de partidos em risco de prescrever

por RTP
Pedro Nunes - Reuters

O alerta surge do presidente da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos. José Eduardo Figueiredo Dias argumenta que há um risco de prescrição de processos sobre contas dos partidos e campanhas eleitorais. O presidente fala de uma “inevitável paralisia” da entidade por falta de recursos humanos, se nada for feito.

Em entrevista ao jornal Público, o presidente da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos fala de uma “gritante” e “claríssima falta de meios” da Entidade, amplamente assinalada.

“Não temos qualquer informação de que esse reforço venha a ocorrer no futuro próximo”, alerta José Figueiredo Dias, apesar da “sua incontornável necessidade e dos perigos que a sua não concretização levanta, em termos de fiscalização efetiva e transparente das contas e dos financiamentos políticos”.

Razões para o responsável secundar as palavras de Costa Andrade, presidente do Tribunal Constitucional: a falta de resposta por parte dos órgãos responsáveis poderá redundar na “inevitável paralisia” da entidade.

A necessidade de meios humanos tornou-se mais flagrante porque a alteração da lei de financiamento dos partidos e a transferência de competências do Tribunal Constitucional para a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos não foi acompanhada de qualquer reforço de meios. José Figueiredo Dias alerta que a Entidade está “ainda a trabalhar com o quadro de pessoal que existia antes da alteração legislativa”.

E especifica que esse quadro de pessoal se resume aos três membros da direção, um técnico e dois assistentes técnicos.

“Será impossível cumprir as nossas funções se não nos forem atribuídos muito mais meios materiais e humanos”, alerta. “Trabalhamos com enormes constrangimentos e o avolumar do trabalho sente-se de dia para dia”, reforça.
"Não temos elementos suficientes"

Anteriormente, a Entidade das Contas emitia pareceres, cabendo ao Tribunal Constitucional as decisões finais. A Entidade não tinha qualquer competência quanto aos processos de contraordenação. Com a alteração legislativa, passa a ter a decisão final em termos da regularidade e legalidade das contas e em termos contraordenacionais, ainda que com recurso para o Tribunal Constitucional.

A falta de meios traz o perigo de prescrição dos processos de irregularidades das contas dos partidos e das campanhas. O risco de prescrição existe, garante o presidente da Entidade na entrevista, argumentando que “ainda não temos elementos suficientes para conseguir caracterizar e quantificar os processos que poderão estar prescritos”.

José Figueiredo Dias garante que em breve a Entidade deverá publicar as decisões relativas às contas da campanha para a Assembleia da República de 2015 e que em situação próxima estão as contas relativas às eleições dos Açores de 2016 e as contas anuais de 2015, “que apenas pela clamorosa falta de recursos humanos não foram ainda proferidas”. “Quanto aos processos de contra-ordenação subsequentes, a exiguidade de recursos humanos da ECFP impede-nos, neste momento, de fazer qualquer prognóstico.

Só no Tribunal Constitucional estão 14 pareceres emitidos pela Entidade antes da alteração legislativa e relativas aos anos entre 2009 e 2016. O Tribunal ainda não emitiu acórdãos e os processos ainda não voltaram para a Entidade. “São 14 situações de prestação de contas e todas pressupõem uma decisão a tomar pelo TC, ainda que seja, por hipótese, uma decisão de pura remessa para a Entidade”.
"Mecanismos de controlo"  
A Entidade pode ter de reanalisar muitos dos processos que entretanto foi instruindo. Em larga medida, os pareceres dirigidos ao Constitucional poderão ser traduzidos em decisões. Mas, apesar de ambicionarem o máximo aproveitamento dos trabalhos já realizados, “o regime aplicável é novo, também do ponto de vista material, o que implica uma reanálise de todas as situações já identificadas em momento anterior pela ECFP. Ou seja, todos os processos que não tenham sido objecto de um acórdão do TC terão de ser vistos à luz do novo regime, pelo que não se poderá tratar nunca de uma mera reprodução dos pareceres já elaborados”, alerta o presidente.

Cingindo-se à atividade da Entidade desde que tomou posse, em outubro de 2017, José Figueiredo Dias argumenta que o trabalho de fiscalização tem vindo a ser feito, tendo sido elaborados os relatórios relativos às contas da campanha para a eleição da Assembleia Legislativa dos Açores, realizada em Outubro de 2016, e das contas anuais dos partidos respeitantes a 2015, estando neste momento a ser proferidas as decisões relativas às contas da campanha das eleições para a Assembleia da República de 2015.

Pendentes estão as contas anuais dos partidos de 2015 a 2017 (estas últimas em fase de entrega pelos partidos), as contas da campanha para as eleições da Assembleia Legislativa dos Açores de 2016 e da campanha das legislativas de 2015.

Questionado sobre a falta de decisão sobre as contas dos partidos entre 2009 e 2014, as últimas campanhas das europeias (2014), das regionais dos Açores de 2012 e da Madeira de 2015, as autárquicas de 2013 e as presidenciais de 2016, o presidente da ECFP argumenta que constam dos 14 pareceres que foram enviados ao Tribunal Constitucional ao abrigo da lei anterior, diz o presidente da ECFP.

José Figueiredo Dias argumenta que a entidade tem vindo a trabalhar e teve outras atividades, entre elas “a elaboração e publicitação de FAQ, início da implementação de um procedimento interactivo com os partidos para controlo das acções e meios de propaganda política, estudos e análises em diversos domínios, por exemplo o estudo relativo ao novo quadro legal -, fundamentais para um adequado funcionamento dos mecanismos de controlo”.
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