O presidente do autoproclamado governo tibetano no exílio (`sikyong`) visitou pela primeira vez Portugal para pedir que se "escolha entre democratas e autocratas", mas não conseguiu reunir-se com um representante do governo.
A mensagem do líder político do Tibete, hoje uma província da China, só chegou em discurso direto a quatro partidos com assento parlamentar, dada a falta de resposta ou desencontros de agenda com os partidos e o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Em entrevista à agência Lusa, o chefe do governo instalado na Índia, Penpa Tsering, explicou que a sua deslocação visou "criar mais consciência sobre o que está a acontecer no Tibete e o que a China está a fazer em todo o mundo".
"Até porque com a China, nada vem de graça", afirmou o responsável, atribuindo a falta de disposição para ser recebido a posições políticas impostas a par dos investimentos chineses.
Penpa Tsering reuniu-se com a Iniciativa Liberal (IL), o PSD, o Livre e o PAN, não tendo ocorrido o encontro com o PS, como previsto, por desencontro de agendas. Foram solicitadas audiências designadamente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) e a todos os partidos com representação parlamentar, excetuando o Chega.
Após as reuniões realizadas na quarta-feira à tarde, apenas a IL prestou declarações à Lusa, com o deputado Rodrigo Saraiva a anunciar que apresentará brevemente um projeto de resolução continuando o "caminho parlamentar e formal para pôr a Assembleia da República (AR) ao lado da causa do povo tibetano, da sua autodeterminação".
A IL tinha feito aprovar, em maio, na Comissão de Negócios Estrangeiros da AR, um voto de preocupação pelos "29 anos do rapto do 11.º `Panchen Lama` perpetrado pela República Popular da China". Trata-se da "segunda figura religiosa mais importante do Tibete" que é responsável pela "procura e reconhecimento da próxima reencarnação do Dalai Lama", o líder do povo tibetano.
No pedido de comentários às entidades que não receberam o Sikyong, apenas o Bloco de Esquerda (BE) respondeu à Lusa, indicando ter sugerido datas alternativas para um encontro.
Segundo a equipa de Penpa Tsering, o MNE não respondeu a solicitações para um encontro. A Lusa contactou o MNE para averiguar da disponibilidade para receber o líder político tibetano, mas não obteve resposta em tempo útil.
Na entrevista à Lusa, Penpa Tsering acrescentou que os encontros com partidos servem para "os convencer a convencer o governo", a quem pede apenas que "oiçam".
"Não estamos a pedir aos governos que tomem posições, se não o quiserem fazer. Mas pelo menos ouçam o que temos para dizer e tentem descobrir se é verdade, ou não. E, se se descobrir que é verdade, então tem de se decidir o que é bom para este mundo. Se se deve ficar do lado dos autocratas ou do lado dos democratas", argumentou.
O responsável sublinhou a necessidade da comunidade internacional decidir se quer continuar a "alimentar o dragão", ou seja a China, citando "amigos alemães" que lamentaram que o "dragão esteja a morder".
"E eu digo-lhes: em tempos o dragão já foi fraco. Quem fez o dragão poderoso? Estados Unidos e não precisam de ler muitos livros, apenas um: [Henry] Kissinger (ex-secretário de Estado dos EUA) sobre a China. Depois a União Europeia, o Japão, Taiwan, cada um de nós foi muito importante para fazer da China o que ela é hoje", defendeu.
"Agora, sabendo que o dragão está a morder-te, mas se continuas a alimentar o dragão, tal como Portugal está a fazer, então de quem é a culpa?", questionou retoricamente .
"Agora não podem culpar a China porque estão a tornar a China poderosa, sabendo que a China está no meio deste eixo de poder: China, Rússia, Irão, Coreia do Norte", afirmou Penpa Tsering. Neste contexto, nota "muita confusão" no Ocidente, na forma como lidar com os chineses.
Sobre a posição dos EUA, com o regresso do republicano Donald Trump à presidência, o líder político tibetano afirmou que se deve esperar para ver, mas comentou a nomeação de Marco Rubio, senador republicano da Florida, para assumir a diplomacia - confirmada já depois da entrevista.
"Rubio é pelos direitos humanos. Há muitos anos que trabalhamos com Rubio no Senado", indicou à Lusa, referindo que a causa do Tibete é apoiada por democratas e republicanos, assim como pelas duas câmaras do Congresso: Senado e Câmara dos Representantes.
"Conseguimos a aprovação em julho o `Resolve Tibet Act`(...) E essa lei contraria tudo o que a China diz. A China diz que não há problemas no Tibete, que o Tibete é um paraíso socialista", recordou.
"Agora que os EUA aprovaram esta lei, teremos de ver até que ponto podemos trabalhar com o Congresso dos EUA ou com o Departamento de Estado para convencer outros governos a adotar posições semelhantes, que possam forçar a China a dialogar com os tibetanos", acrescentou Sikyong.