O Governo tenciona cumprir o contrato com o Novo Banco e a Lei de Enquadramento Orçamental, garantiu esta quinta-feira o primeiro-ministro, depois de o PSD ter somado os seus votos aos da esquerda e travado, assim, uma transferência orçamental de 476 milhões de euros para o Fundo de Resolução. António Costa teceu fortes críticas a partidos que, nas suas palavras, “quiseram brincar com o fogo”. O líder social-democrata, Rui Rio, lembrou, por sua vez, que “os contratos têm dois lados”.
O chefe do Governo lançou mão de um léxico duro para repudiar, em particular, a posição assumida pelo PSD face à proposta do Bloco de Esquerda tendo em vista a anulação da transferência para o Novo Banco, condicionando-a a uma auditoria prévia do Tribunal de Contas.
“Em caso algum a credibilidade externa do país será posta em causa. Portanto, a luta continua”, afirmou António Costa.
“Tudo faremos para que aqueles que quiseram brincar com o fogo não queimem o país”, lançou o primeiro-ministro, que prometeu também tudo fazer para respeitar “a legalidade que a Constituição impõe e que a Lei de Enquadramento Orçamental impõe no sentido de o Orçamento inscrever todas as obrigações contratuais do Estado português”.
“Não vou estar aqui a discutir as tecnicalidades jurídicas e só há uma coisa que digo: contrato assinado é contrato que tem de ser honrado, lei que existe é lei que tem de ser respeitada e a legalidade será seguramente assegurada num país que se honra de ser um Estado de Direito”, enfatizou. Portugal, insistiria António Costa, “não é um país em que a Constituição, as leis e os contratos são rasgados ao sabor das conveniências políticas”.
“Garanto a todos, quer os que nos escutam em Portugal, quer os que nos escutam internacionalmente, que o Estado Português é um Estado de Direito, é um Estado que honra as leis e os contratos que assina. Quanto a pormenores, a tempo saberemos”, resumiu o governante.
“Estamos aqui a defender os contribuintes”
Por seu turno, o líder do PSD, que falou aos jornalistas depois do primeiro-ministro, argumentou que votou “em coerência com o que sempre disse: que o Governo, antes de qualquer transferência para o Novo Banco, deve vir ao Parlamento explicar as razões, de preferência com uma auditoria independente do Tribunal de Contas em cima da mesa”.
Rui Rio colocou a ênfase na ideia de que “os contratos têm dois lados”.
“O Estado português tem de cumprir, mas temos de ter a certeza de que do outro lado também estão a cumprir. Os contratos têm dois lados e estamos aqui a defender os contribuintes portugueses”, vincou o presidente dos social-democratas.
O PSD selou esta quinta-feira, em plenário, o voto a favor, na especialidade, da proposta orçamental do Bloco que trava a transferência de 476 milhões de euros do Fundo de Resolução para o banco que resultou do colapso do BES.
“Danos reputacionais podiam existir se, com os votos que tenho, dissesse que por nós não vai nem mais um tostão para o Novo Banco, mas não é isso que estou a dizer. Por mim, o Estado cumpre, desde que os outros cumpram também”, devolveu, para em seguida acusar os socialistas de pretenderem criar “uma crise artificial”.
“Agora o Novo Banco a vender património um atrás do outro, com perdas, sabe-se lá a quem. Há um momento é que é preciso dizer basta”, carregou Rui Rio.
“Precisamos que a auditoria ande depressa e aquilo que deve acontecer é que o Novo Banco vai reclamar a verba lá para o mês de mais e aí vamos ver, com a garantia de que não se passa mais dinheiro para lá sem uma alteração orçamental aqui”, continuou, aludindo a um eventual orçamento retificativo que o PSD estará aberto a viabilizar. Questionado sobre um possível incumprimento por parte da instituição bancária, Rio referiu o cenário de um “acerto de contas” entre as partes, ou um passivo a reverter para o Fundo de Resolução.
“Pode ser que, se assim for, tenhamos um Ministério Público que não me responda que não há nada de grave, mas que vá investigar”, acrescentou.
Antes de apontar o facto de também o PCP, “com quem [os socialistas] articularam todo o Orçamento”, ter votado favoravelmente a proposta do BE, o líder do PSD considerou que, “se o Governo quiser ir para uma batalha legal, tem todo o direito”.
“Para mim é indiferente de quem é a proposta: quando é do Chega dizem que sou fascista, quando é do BE se calhar sou comunista, mas eu vou pela justeza das propostas”, rematou.
A proposta do Bloco de Esquerda passou com os votos a favor de PSD, PCP, PEV e Joacine Katar Moreira, deputada não inscrita. PS, Iniciativa Liberal, a deputada não inscrita Cristina Rodrigues votaram contra, ao passo que CDS-PP, PAN e Chega escolheram a abstenção.
Costa contacta Banco Central Europeu
Entretanto, o primeiro-ministro fez saber no Twitter que já contactou a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, a propósito deste dossier.
#Portugal é um Estado de direito que cumpre as suas obrigações contratuais. Falei com a Presidente do BCE, @Lagarde, a quem garanti o escrupuloso cumprimento dos compromissos assumidos no quadro da venda do Novo Banco. pic.twitter.com/Noas8HjOr7
— António Costa (@antoniocostapm) November 26, 2020
"Portugal é um Estado de Direito que cumpre as suas obrigações contratuais", reiterou António Costa num tweet também reproduzido em inglês, acrescentando que garantiu a Lagarde "o escrupuloso cumprimento dos compromissos assumidos no quadro da venda do Novo Banco".