O ex-administrador financeiro da TAP disse hoje que questionou sobre os contratos de gestão, obrigatórios em empresas públicas e que não existem na TAP, e que o ex-presidente Manuel Beja disse que há várias empresas públicas que não os têm.
"Sabia da necessidade de serem assinados contratos de gestão, eu próprio levantei essa questão quando estávamos a findar o período de três meses a contar de 24 de junho [de 2021], porque perguntei. [...] Tive uma conversa inclusive com o presidente do Conselho de Administração da TAP [Manuel Beja], que também era muito sensível a essas matérias e ele fez uma consulta e disse-me que várias empresas públicas portuguesas funcionam sem contratos de gestão, ou não têm contratos de gestão", afirmou João Gameiro, na comissão de inquérito à TAP.
O ex-administrador financeiro, que exerceu funções durante quatro meses em 2021, respondia a questões da deputada socialista Fátima Fonseca sobre o estatuto do gestor público, a que a TAP passou a estar abrangida quando regressou ao controlo do Estado, e sobre os contratos de gestão que têm de ser assinados pelos administradores de empresas públicas, no prazo de três meses após início de funções e que, no caso da companhia aérea, ainda não foram.
Afirmando que conhecia o estatuto do gestor público antes de integrar os órgãos sociais da TAP, João Gameiro adiantou que era para si importante ter um contrato de gestão, bem como um seguro `directors & officers`, uma vez que são cargos com responsabilidade penal, civil e financeira pelas decisões e atos assumidos.
Segundo o ex-responsável, a companhia aérea tinha um seguro para aquele efeito, mas era "diminuto", porque, na sequência das dificuldades causadas pela pandemia de covid-19, o capital das seguradoras diminuiu e "passou a ser muito difícil encontrar no mercado uma seguradora que estivesse disponível a segurar a TAP".
"Isso foi um assunto importante, creio eu, para os vários elementos da administração e a que o presidente do Conselho de Administração deu importância e que ficou um bocadinho nele liderar esse processo de tentar arrancar um mecanismo - não havendo o seguro - alguma outra salvaguarda que enquadrasse a responsabilidade dos administradores", explicou.
O ex-administrador financeiro explicou mais tarde, em resposta ao deputado social-democrata Hugo Carneiro, que esta foi mesmo uma das razões pelas quais renunciou ao cargo, porque entendia ser "fundamental ter o seguro".
"Não havendo o seguro, [...] então era fundamental ter um contrato de gestão, tentar-se por via do contrato salvaguardar os administradores e sei que o presidente do Conselho de Administração estaria a tomar iniciativas nessa medida, mas chegou uma altura em que entendi que isso não ia acontecer", apontou.
Questionado sobre o comunicado divulgado pelo Governo na altura da sua renúncia, que refere "motivos pessoais imprevisíveis", João Gameiro desvalorizou, considerando que na perspetiva das tutelas "tratava-se de facto de motivos pessoais e não previsíveis".
Quanto à relação com o Ministério das Finanças, o ex-administrador explicou que havia um canal de diálogo com o então secretário de Estado do Tesouro, Miguel Cruz, e com a Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF), sublinhando nunca ter sentido "ausência de resposta".
Quanto aos custos da frota de aviões, que motivou a abertura de um inquérito por parte do Ministério Público por indícios de que a TAP possa estar a pagar mais do que as concorrentes, o ex-administrador disse que nunca fez essa comparação com as congéneres e que só teve conhecimento do caso posteriormente à sua saída.
O PSD questionou ainda o ex-responsável sobre uma compra de copos de papel para a companhia, no valor de 620.000 euros, cuja decisão foi tomada pela Comissão Executiva, fazendo o paralelismo com a indemnização de 500.000 euros paga à ex-administradora Alexandra Reis, que não terá sido alvo de discussão na mesma sede.
João Gameiro respondeu que, no período de quatro meses em que esteve na companhia, "as decisões estavam muito concentradas no Conselho de Administração e na Comissão Executiva". "Acho que os diretores não assinavam nada, tudo tinha de ser levado aos administradores", acrescentou.