Mais tempo e dinheiro para Espanha em troca de medidas duras

por Joana Tadeu, RTP
O ministro espanhol da Economia, Luis de Guindos, fala numa conferência de imprensa após a reunião de ministros das Finanças da UE na sede do Conselho Europeu, em Bruxelas Thierry Roge, EPA

Em troca da extensão do prazo para a Espanha corrigir o défice, a União Europeia impõe até 32 condições financeiras e fiscais. As medidas mais duras aplicam-se aos bancos que vão receber ajuda financeira, mas também há novas condições a cumprir pelo sistema financeiro. No Memorando de Entendimento surgem medidas macroeconómicas que o Governo terá de aplicar, tirando poderes ao ministro espanhol da Economia e atribuindo-os ao Banco de Espanha. O país tem até 2014 para fazer os ajustes económicos necessários à aprovação do resgate.

Espanha conseguiu mais tempo para corrigir o défice e dinheiro para socorrer a banca, mas terá que aplicar mais medidas de austeridade. O acordo político alcançado esta terça-feira entre os parceiros europeus e Madrid prevê um prazo de "três meses para que o Governo adote medidas eficazes" e apresente um relatório detalhado sobre a estratégia de saneamento prevista para alcançar os objetivos do défice.
Madrid apresentou formalmente o pedido de apoio europeu à banca espanhola, até um máximo de 100 mil milhões de euros, no final de junho.
O memorando exige, segundo publica o jornal espanhol El País, que o Governo de Mariano Rajoy passe imediatamente a "implementar as recomendações" da Comissão Europeia pelo procedimento de défice excessivo, bem como "as reformas estruturais", sendo que o aumento do IVA anunciado pelo Executivo conservador, incluído nas mais recentes recomendações, é um passo de encontro às exigências dos parceiros económicos europeus.

Espanha fica obrigada a "garantir a independência do Banco de Espanha", que deverá iniciar um processo de exame interno que permita identificar as principais deficiências antes do fim de outubro deste ano, principalmente no que toca aos mecanismos de controlo e fiscalização do sistema financeiro.
Quatro grupos de bancos

Grupo 0: bancos “saudáveis”, que não precisam de ajuda (prevê-se que sejam o Santander, o BBVA e o La Caixa, de acordo com a análise preliminar dos consultores).

Grupo 1: bancos nacionalizados (BFA/Bankia, Caixa Catalunya, NCG Banco e Banco de Valência).

Grupo 2: bancos que vão suspender os testes de stress e não sejam capazes de angariar fundos para si mesmos.

Grupo 3: bancos que falham os testes de stress mas que conseguem criar planos de recapitalização credíveis sem auxílios estatais.

O resgate obriga a criar uma instituição fiscal independente que supervisione a política fiscal de Espanha, sendo que, até setembro, deverá ser entregue à UE um relatório independente sobre as necessidades de capital de 14 grupos bancários que representam 90 por cento dos ativos do sector financeiro espahol.

Neste relatório, os bancos deverão ser apresentados divididos entre quatro categorias, consoante a necessidade, ou não, de ajuda financeira. A divisão servirá para se atribuir a injeção de capital mediante o fundo europeu de resgate aos bancos que dela necessitarem.

Os bancos que receberem ajuda serão obrigados a fazer uma restruturação que poderá envolver reduzir o seu tamanho, vender ativos não estratégicos, fechar balcões e despedir empregados. O memorando exige ainda que todos os bancos, independentemente da necessidade de ajuda, apresentem um rácio de capital mínimo de nove por cento, "pelo menos até 2014".
Medidas macroeconómicas descentralizam poder
El País explica que, a par de uma reforma das regras aplicadas aos grupos financeiros que tornarão incompatíveis os seus conselhos de administração e os dos seus bancos afiliados, o memorando exige a aplicação de medidas que atribuem mais competências ao Banco de Espanha e as retira ao Ministério da Economia.

Na prática, as competências disciplinares relativas ao sistema financeiro, que estavam a cargo de Luis de Guindos, são transferidas para o Banco de Espanha, embora sob a orientação do Banco Central Europeu, ou seja, a supervisão bancária é dividida entre o Banco de Espanha e organismos europeus, como o BCE ou a Associação Bancária Europeia.
"A única coisa que quero dizer é que creio que conseguimos dois acordos muito bons", disse o ministro espanhol da Economia, Luis de Guindos, falando da reunião do Eurogrupo que durou nove horas.
São apresentadas indicações para alterações na gestão corporativa, incluindo a eliminação total de políticos nos conselhos de administração dos bancos e das instituições financeiras, bem como restrições de dividendos e limitações nas remunerações.

O Governo de Rajoy será responsável pelo empréstimo europeu aos bancos, que contabilizará como dívida pública e os juros como défice público. O Executivo fica ainda obrigado a aprovar a reforma laboral e criar renovada legislação de defesa do consumidor. Os parceiros internacionais pedem "esforços de consolidação" e um sistema fiscal "que apoie o crescimento", o que se traduz em menos tributação dos rendimentos do trabalho em troca de um aumento do IVA.
Custo político e dependência externa
Segundo analisa El País, este resgate tem mais uma consequência indireta para Espanha, que faz agora parte da lista dos países sob um programa de assistência da Zona Euro. O país perdeu poder de influência sobre os seus parceiros económicos e políticos como fica assinalado pela perda do cargo no Conselho Executivo do Banco Central Europeu e a não designação de Belém Roman como diretora-gerente do Mecanismo Europeu de Estabilidade (Mede), como estava previsto.

Os ministros das Finanças da UE reclamaram a adoção e implementação de medidas já no Orçamento do Estado de 2012 e a apresentação de um plano orçamental para 2013 e 2014. Segundo publica a imprensa espanhola, que teve acesso ao Memorando de Entendimento associado ao resgate do sistema financeiro do país, são 32 condições. “Terapia de choque”, chama-lhe o jornal espanhol El País.

O eurogrupo avisou o Executivo espanhol de que, às avaliações regulares do programa de recapitalização, somam-se avaliações dos progressos alcançados no cumprimento dos compromissos de redução do défice "de três em três meses".
Novas metas para Espanha
A decisão do Conselho Ecofin, a 27, confirma o acordo já alcançado pelos 17 ministros das Finanças da Zona Euro, na reunião do Eurogrupo concluída terça-feira de madrugada, no sentido de ser dado mais um ano a Espanha para corrigir o seu défice excessivo, ainda acima dos três por cento do Produto Interno Bruto.

O país deverá "conseguir uma melhoria do saldo orçamental estrutural de 2,7 por cento do PIB em 2012, de 2,5 por cento em 2013 e de 1,9 por cento em 2014 de modo a que o défice público fique a baixo do valor de referência de três por cento do PIB até 2014", refere o texto acordado pelo Eurogrupo e aprovado pela Ecofin.
Espanha não é Portugal
"O caso português e o caso espanhol são diferentes no sentido em que Portugal está sob um programa de ajustamento em que a consolidação orçamental e os limites para o défice e para a dívida fazem parte integrante e central desse programa de ajustamento", disse no final da reunião do Eurogrupo o ministro português das Finanças, Vítor Gaspar, reiterando o objetivo de cumprir a meta para 2012.

São "casos fundamentalmente diferentes e que devem ser tratados como tal", já que enquanto Portugal está sob programa de ajustamento a Espanha terá uma assistência dirigida apenas ao sector bancário e cujas condições se restringem ao sistema financeiro.


Os ministros das Finanças da Zona Euro chegaram a um acordo sobre os termos do empréstimo a conceder a Espanha para recapitalizar a sua banca e decidiram mobilizar 30 mil milhões de euros
até ao final deste mês como "contingência".

"Alcançámos um acordo político sobre o Memorando de Entendimento, sobre as condições para o sector financeiro", disse o presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, indicando que o empréstimo terá um prazo de vencimento máximo de 15 anos.

Assim, a economia espanhola tem que cumprir um défice de 6,3 por cento este ano (antes o objetivo era 5,3), de 4,5 por cento em 2013 (em vez da fasquia dos três por cento que antes era suposto
cumprir já no próximo ano), e de 2,8 por cento em 2014.

O comissário europeu dos Assuntos Económicos, Olli Rehn, sublinhou que Bruxelas "vai monitorizar de muito perto" a evolução das contas públicas espanholas, assim como as condições para a assistência financeira à recapitalização da banca, também acordada na reunião do Eurogrupo. Informou também que se prevê dar a autorização definitiva ao empréstimo no próximo dia 20.
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