Greve nos comboios. Maquinistas exigem clarificação do Governo sobre sinistralidade e álcool

por Carlos Santos Neves - RTP
A CP antevê "fortes perturbações" na circulação durante a greve Gonçalo Costa Martins - Antena 1

Esta sexta-feira é dia de greve de maquinistas. Estes profissionais reivindicam que o Governo clarifique declarações sobre a relação entre sinistralidade ferroviária e a taxa de álcool, além de condições de segurança adequadas. O Tribunal Arbitral decretou serviços mínimos.

A paralisação de 24 horas foi convocada pelo Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro Portugueses. E o impacto poderá prolongar-se até sábado, tendo em conta os turnos dos profissionais nas empresas abrangidas pelo SMAQ - CP, Fertagus, MTS - Metro do Sul do Tejo, ViaPorto, Captrain, Medway e Infraestruturas de Portugal.Os primeiros efeitos da greve fizeram sentir-se logo na quinta-feira, com a CP a dar conta da supressão de ligações regionais e urbanas.

Na base do protesto estão declarações proferidas pelo ministro da Presidência na sequência da reunião do Conselho de Ministros de 14 de novembro. "Não é muito conhecido, mas Portugal tem o segundo pior desempenho ao nível do número por quilómetro de ferrovia de acidentes que ocorrem", apontava então Leitão Amaro, para referir também "um desempenho cerca de sete vezes pior do que a primeira metade dos países europeus".

O Governo aprovou, nesse âmbito, uma proposta de lei para reforçar “as medidas de contraordenação para os maquinistas deste transporte ferroviário, criando uma proibição de condução sob o efeito de álcool”.

“Estando Portugal numa das piores situações em termos de nível de acidentes, tem o quadro contraordenacional mais leve e mais baixo da Europa”, notava ainda Leitão Amaro.

O ministro da Presidência veio entretanto classificar como “inédita” a greve dos maquinistas, argumentando tratar-se de uma ação contra algo que não aconteceu.
Na quinta-feira, em comunicado, o Ministério das Infraestruturas e Habitação anunciou a intenção de implementar medidas para reforço da segurança ferroviária, em resposta às reivindicações dos maquinistas.
"O senhor ministro, no fundo, é um incompreendido"
Ouvido já na manhã desta sexta-feira pela equipa de reportagem da RTP na Gare do Oriente, em Lisboa, o presidente do SMAQ afirmou que a greve está a causar perturbações em diferentes empresas.

António Barata Domingues sublinhou também que as razões da paralisação vão além das declarações do ministro da Presidência sobre sinistralidade e álcool: "Isso foi o que desencadeou a revolta dos trabalhadores, mas o motivo principal tem a ver com questões de segurança".

"O pré-aviso de greve foi colocado há três semanas. Durante estas três semanas, não fomos recebidos pelo senhor ministro Pinto Luz, o ministro Leitão também não se demarcou e não clarificou aquelas infelizes declarações iniciais, aliás, ele ainda ontem as reiterou, acha que foi mal interpretado", enfatizou o dirigente sindical.
"Todos interpretámos mal. O senhor ministro Leitão, no fundo, é um incompreendido", ironizou Barata Domingues.

"Foi-nos apresentado um projeto de despacho, mas o teor do texto não é mais do que uma operação de cosmética que não resolve, na prática, aquilo que nos preocupa e reflete o modo de desempenho da ferrovia portuguesa e que está refletido nos relatórios anuais de segurança ferroviária. Se não for resolvido, corremos o risco de, para o ano, os resultados serem ainda piores do que este ano", concluiu.
Pinto Luz "lamenta a decisão"

Por sua vez, o ministro Miguel Pinto Luz "lamenta a decisão do Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro Portugueses em manter a greve geral de maquinistas para o dia 6 de dezembro de 2024, que terá um impacto negativo na circulação de comboios e consequentemente na vida de milhares de cidadãos que utilizam o transporte público".

Ainda de acordo com a nota da tutela, "no decorrer das negociações entre as duas partes, o Ministério das Infraestruturas e Habitação tudo fez para ir ao encontro das reivindicações sobre segurança ferroviária apresentadas pelo SMAQ e, assim, evitar esta paralisação".O ministro sustenta ter dado "respostas às reivindicações do sindicato que estiveram na origem desta paralisação", tendo "emitido um despacho a mandatar as entidades responsáveis a procederem a um conjunto de iniciativas que têm como objetivo monitorizar e melhorar a segurança, confiabilidade e eficiência do sistema ferroviário português".


As medidas passam pelo "reforço da utilização do sistema ATP (Automatic Train Protection) nos veículos que circulam na Rede Ferroviária Nacional", pela "diminuição do recurso à utilização das Limitações de Velocidade Temporárias, privilegiando um maior recurso aos períodos azuis previsto no Diretório de Rede" e pela "melhoria contínua dos Sistemas de Gestão de Segurança do Gestor da Infraestrutura e dos operadores ferroviários".

O Governo vai também avançar com a "definição de indicadores de desempenho para monitorizar o progresso e eficácia das medidas" e o "reforço das condições de segurança respeitantes à sinalização e proteção de Limitações de Velocidade Temporárias, através da revisão e clarificação dos regulamentos de segurança em vigor".

O Ministério salienta que, nas reuniões negociais, "foram reafirmadas as principais causas para o elevado número de acidentes na ferrovia", designadamente "atropelamentos (52 por cento), acidentes em passagens de nível (38 por cento), colisões com objetos (sete por cento) e descarrilamentos por degradação das infraestruturas (três por cento), segundo dados do relatório anual de segurança do Instituto da Mobilidade e dos Transportes", bem como "reiterada a rejeição de outras causalidades".

"Tenho um profundo respeito pelos maquinistas e plena confiança nos profissionais do sector ferroviário. O investimento na modernização da ferrovia é uma das prioridades deste Governo, que está comprometido em garantir uma oferta de qualidade de transportes públicos para todos os cidadãos", remata Pinto Luz.

c/ Lusa
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