Défice de 2,6 por cento. Dívida de 126 por cento. Crescimento de 2,1 por cento. Desemprego de 11,2 por cento. São estes alguns dos eixos fundamentais do esboço de Orçamento do Estado para 2016 aprovado esta quinta-feira em Conselho de Ministros e apresentado já durante a tarde pelo responsável máximo das Finanças portuguesas, Mário Centeno. Um orçamento de “um tempo novo”, nas palavras usadas pelo PS, o draft chegou à Comissão Europeia com muitos meses de atraso. Mas não sem a mancha de uma advertência deixada pelo Conselho das Finanças Públicas, que alerta para “riscos relevantes” e previsões “pouco prudentes” do Projeto de Plano Orçamental.
Governo estima taxa de desemprego de 11,2% este ano, menos 1,1 pontos percentuais do que a taxa de 12,3% prevista para 2015.Quanto a esse aspecto, o ministro das Finanças pode já esta tarde resolver a questão: “Em relação à entrega do Orçamento vai ser feito previsivelmente a 5 de Fevereiro”, garantiu Mário Centeno na conferência de imprensa que decorreu no Ministério.
Centeno esmiuçou então perante as questões dos jornalistas um documento assente em três ou quatro traves-mestras: crescimento da economia de 2,1% e défice orçamental de 2,6% do PIB (Produto Interno Bruto); aumentos nos impostos do selo, do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (5 cêntimos na gasolina e 4 cêntimos no gasóleo) e sobre o tabaco; reposição salarial na função pública e redução da sobretaxa do IRS.
Conselho das Finanças Públicas e a dura realidade
Quanto ao sucesso do cenário no défice (2,6%), dívida (126%) e crescimento do PIB (2,1%), o Conselho das Finanças Públicas (CFP) teve já a oportunidade de alertar para a existência de “riscos relevantes” e previsões “pouco prudentes” do esboço hoje discutido.
Apontando a possibilidade de virem a concretizar-se cenários que podem fazer perigar aquelas estimativas, refere o parecer do CFP que “as previsões incluídas no PPO/2016 dependem crucialmente de hipóteses cuja concretização não está assegurada, em particular no que respeita ao crescimento da procura externa e à evolução dos preços”.
Não considerando “implausíveis estatisticamente no curto prazo, as previsões quanto ao comportamento dos preços, do investimento e do comércio externo em 2016 [são] pouco prudentes".Nesse sentido, o conselho aponta como riscos mais relevantes aqueles que estão relacionados com a evolução dos preços e o impacto imediato que estes representam para a competitividade da economia, do crescimento do PIB e do emprego.
O Governo costa aponta na introdução do draft que a sua equipa pretende aproveitar o facto de, “num contexto internacional de baixas taxas de juro, preço do petróleo reduzido e procura externa com fortes assimetrias espaciais, o maior contributo líquido para a aceleração do crescimento da economia portuguesa [vir] da componente externa”. Também aqui o CFP alerta para a necessidade de se olhar para o crescimento da procura externa com “prudência”, em particular face à evolução recente dos mercados angolano, brasileiro e chinês, e que são dos mais relevantes para as exportações portuguesas.
“O Ministério das Finanças assume a aceleração da procura externa em 2016, de 3,9% para 4,3%, o que não parece ter em conta os mais recentes sinais de abrandamento de parceiros económicos relevantes (…) num contexto de forte incerteza quanto à evolução da economia mundial”, pode ler-se na nota do CFP.
Veja aqui um resumo da conferência de imprensa de Mário Centeno esta tarde sobre o OE
Governo quer défice de 2,6% para este ano
O plano do Governo inclui uma previsão de défice de 2,6 por cento do PIB para este ano, menos 0,2 pontos percentuais do que o previsto no programa do executivo, o que representaria desde logo a saída de Portugal dos procedimentos por défice excessivo.Alteração nos impostos do selo, sobre os produtos petrolíferos e tabaco deverão render 0,21%. Do aumento destas receitas, o executivo espera que, combinando com o combate à fraude e evasão fiscais, compense a receita que vai perder com a redução da sobretaxa em sede de IRS, redução do IVA na restauração para os 13% em julho e redução da TSU dos trabalhadores.
A redução da sobretaxa terá um custo de 0,23% do PIB face a 2015, a descida do IVA na restauração implicará perdas de 0,09% e a redução da TSU até ao limite de 1,5 pontos percentuais paga pelos trabalhadores que ganhem até 600 euros custará 0,07%. Perdas totais na ordem dos 0,39% do PIB.
Refere o comunicado saído da reunião do Conselho de Ministros que, “em 2016, o défice é de 2,6 por cento, menos 0,4 pontos percentuais do que em 2015. Paralelamente, o défice estrutural situar-se-á nos 1,1 por cento, resultando numa redução igualmente significativa de 0,2 pontos percentuais (…) Paralelamente, o défice estrutural situar-se-á nos 1,1 por cento, resultando numa redução igualmente significativa de 0,2 pontos percentuais”.
Quanto à dívida pública, encolhe “em 2,7 pontos percentuais do PIB, projetando-se um valor de 126 por cento do PIB no final de 2016”. As primeiras estimativas do executivo apontavam para os 123,9 por cento.
Mário Centeno explicaria já perante os jornalistas que pretendeu desenhar uma “estratégia orçamental equilibrada [com espaço para] a potencialização do potencial crescimento económico, que é aquilo que um Orçamento do Estado deve fazer, neste caso concreto respeitando todos os compromissos assumidos pelo Governo”.
Menos IRS mais IVA
“O plano orçamental apresenta uma saudável recomposição das receitas fiscais com a diminuição do peso dos impostos diretos, cuja receita diminui 3,4% e aumento de 5,8% do peso dos impostos indiretos”, defende o documento libertado pelo Governo.
O ministro das Finanças explicou que se espera a queda da receita do IRS em cerca de 3 por cento este ano, mas aqui compensada também pelas verbas chegadas do IVA, e que deverão crescer 4 por cento.O Governo prevê a reposição do IVA na restauração para 13% a partir de julho. Esta descida terá um impacto orçamental de -0,09% do PIB em comparação com 2015.
Para Mário Centeno há que salientar aqui uma carga fiscal “mais favorável ao emprego e crescimento”, com “menos impostos diretos”. O ministro das Finanças explicou que espera uma queda total de 3,4 por cento face ao arrecadado em 2015 e “mais impostos indiretos”, na ordem dos 5,8 por cento. Apontando especificamente o imposto sobre o consumo, disse ser esperado um aumento da receita com o IVA num valor próximo de 4 por cento.
Já nos impostos diretos é esperada uma queda de quase 3 por cento com o IRS (sujeitos particulares) e de 5,5 por cento na receita de IRC (empresas).
Em 2013, o então ministro das Finanças Vítor Gaspar alterou os escalões do IRS de oito para cinco.Ainda na questão fiscal, face à dúvida sobre um eventual aumento do número de escalões de modo a aumentar a progressividade do IRS, Mário Centeno esclareceu que não haverá alterações aos escalões em 2016.
As taxas de imposto da tabela atual são: taxa mínima normal de 14,50% para rendimento coletável até 7 mil euros por ano; 28,5% entre 7 e 20 mil euros; 37% entre 20 e 40 mil; 45% de 40 a 80 mil euros; 48% acima de 80 mil euros.
Menos TSU para salários abaixo dos 600 euros
Os trabalhadores com salários iguais ou inferiores a 600 euros mensais vão beneficiar de uma redução da Taxa Social Única até 1,5 pontos, na confirmação de uma das medidas constantes do programa do Governo.
Se a descida for de 1,5 pontos percentuais, estes trabalhadores deixarão de descontar 11% para a Segurança Social, descontando apenas 9,5%. Esta medida levará a uma perda de receita equivalente a 0,07 por cento do PIB.
Despesa a crescer
O PS comprometera-se em campanha com a devolução de algum conforto que as famílias haviam perdido com o governo PSD/CDS-PP e traduz agora essa vontade numa série de medidas que deverão devolver às famílias mais de 1.000 milhões de euros em 2016. Trata-se de um montante que o Executivo procurará compensar, ainda que parcialmente, com os 390 milhões a arrecadar no aumento dos impostos de selo, sobre produtos petrolíferos e tabaco.Compensar os rendimentos das famílias vai custar ao Estado mais 1.117 milhões de euros.
Entre essas medidas que dizem respeito ao rendimento das famílias estão a reposição salarial faseada (com custos de 446 milhões de euros) e a redução da sobretaxa (430 milhões).
A agência Lusa fez ainda outras contas: a redução da Taxa Social Única para os trabalhadores implicará perdas de receita de 130 milhões; e a atualização de 0,4% das pensões e complementos até aos 628,82 milhões de euros terá um custo de 56 milhões. O Governo fez as contas para a reposição salarial dos funcionários públicos: são 0,24% do PIB, tendo em consideração o “ajustamento verificado entre a saída e entrada de trabalhadores”.
Este é um departamento que contempla ainda o abono de família - cujo aumento custará 37 milhões de euros - e a revogação da suspensão do complemento de pensão – mais 18 milhões de euros.
Somadas as parcelas das medidas, que implicam aumento de despesa ou diminuição de receita que influenciam o rendimento disponível das famílias, os custos para os cofres do Estado ascendem aos 1.117 milhões de euros em 2016.
c/ Lusa