Foco na China pode criar maior mercado negro do mundo aponta `think tank`

por Lusa

As tarifas recorde impostas por Washington sobre produtos chineses podem criar o "maior mercado negro do mundo", à medida que as empresas recorrem ao transbordo por países terceiros e à subfaturação, apontou um `think tank`.

Apesar de o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ter fixado taxas alfandegárias de 145% sobre a maioria dos bens oriundos da China, as exportações chinesas vão continuar a chegar ao mercado norte-americano através de canais alternativos, frisou num relatório a Gavekal Dragonomics, grupo de reflexão norte-americano focado na economia chinesa.

O documento destacou que a diferença tarifária entre a China e os restantes parceiros comerciais dos EUA está a criar "incentivos poderosos para a evasão", sobretudo através do `comércio triangular` e da subfaturação.

Uma das vias mais utilizadas consiste em enviar produtos da China para países como México ou Canadá, onde são depois reetiquetados ou levemente modificados, para posteriormente entrarem nos EUA ao abrigo de tarifas reduzidas ou isenções.

O chamado regime de `minimis`, que isenta de impostos as remessas até 800 dólares (705 euros), também tem sido amplamente explorado. Esta exceção será, no entanto, revogada para a China continental, Hong Kong e Macau a partir de 02 de maio.

As novas regras determinam que qualquer pacote de baixo valor proveniente desses territórios pagará uma tarifa fixa de 120% do valor declarado.

Para os restantes parceiros comerciais, as tarifas mantêm-se nos 10%, pelo menos durante o período de 90 dias de trégua decretado por Trump. Canadá e México continuam ainda a beneficiar de isenção para muitos produtos ao abrigo do acordo USMCA.

De acordo com os autores do relatório, mesmo os exportadores que não recorrem ao `comércio triangular` têm agora fortes incentivos para subfaturar as encomendas.

Esta prática já era significativa: em 2021, um estudo da Reserva Federal dos EUA concluiu que a subfaturação explicava mais de 55 mil milhões de dólares (48,5 mil milhões de euros) de discrepância entre os dados das importações dos EUA e os de exportações da China.

O relatório assinalou ainda um problema estrutural de fiscalização. A agência norte-americana de alfândegas e proteção de fronteiras tem apenas cerca de 3.000 agentes dedicados aos portos marítimos --- um número insuficiente face aos milhares de contentores processados diariamente.

Nos aeroportos, o desafio é ainda maior. Só em 2023, os EUA receberam mais de 1,2 mil milhões de encomendas sob o regime de minimis e o número reduzido de funcionários impossibilita uma verificação eficaz de todas as remessas.

Embora grandes empresas continuem a cumprir as regras, muitas pequenas e médias empresas optam por contornar os novos encargos, recorrendo a rotas alternativas ou ocultando a origem dos produtos, descreveu o `think tank`.

Com tarifas elevadas aplicadas à China e, potencialmente, aos restantes países, o relatório prevê um aumento exponencial das práticas de transbordo, subfaturação e dissimulação.

Vietname, Tailândia e Camboja são outros dos países envolvidos no `comércio triangular`, segundo um relatório publicado anteriormente pela Gavekal Dragonomics.

Estes países representam agora 6% do total das importações dos EUA, em comparação com 3,5% antes de Trump ter iniciado a guerra comercial contra Pequim no seu primeiro mandato (2017-2021). No mesmo período, as exportações da China para esses países aumentaram acentuadamente.

O aumento das importações dos EUA e o aumento das exportações chinesas verificaram-se nas mesmas categorias de bens, em grande parte maquinaria e eletrónica, destacou a unidade de investigação.

O défice comercial bilateral poderá diminuir, mas segundo os autores, o efeito será ilusório.

"Grande parte dos bens que parecerão vir de outros países continuarão a ter origem chinesa, apenas com camadas superficiais de valor acrescentado noutros locais", concluíram.

 

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