Brexit: Santos Silva diz que Estados-membros têm de estar preparados para falta de acordo

por RTP
Devemos estar preparados para um cenário em que o acordo seja apenas de comércio de médio alcance, mas também devemos preparar-nos se acaso chegarmos a março de 2019 sem acordo" Reuters

O ministro português dos Negócios Estrangeiros defende que os Estados-membros têm de estar preparados para a eventualidade de chegarem a março sem acordo entre o Reino Unido e a União Europeia sobre o Brexit. A União Europeia já veio pedir que os países “intensifiquem” a preparação para um cenário de não acordo. O FMI fez as contas e estima que, no pior cenário, a economia europeia possa perder 1,5 por cento do PIB a longo prazo.

"Estamos muitíssimo empenhados em chegar a um acordo com o Reino Unido, mas temos de estar preparados para todos os cenários", disse Augusto Santos Silva, em entrevista à TSF.

O ministro deixa um aviso: “Devemos estar preparados para um cenário em que o acordo seja apenas de comércio de médio alcance, mas também devemos preparar-nos se acaso chegarmos a março de 2019 sem acordo".

Esta quinta-feira, a Comissão Europeia emitiu uma comunicação de 16 páginas em que apela aos Estados-membros para “intensificarem” a preparação para todos os cenários possíveis para o Brexit, entO documento de Bruxelas cita a necessidade de antecipar as consequências do Brexit no controlo de fronteiras, nas trocas comerciais, troca de dados, entre outros. re eles o de uma “rutura brutal” com Londres, que equivale à impossibilidade de chegar a um acordo com o Reino Unido até 30 de março de 2019, a data marcada para os britânicos abandonarem a União Europeia.

Augusto Santos Silva diz não estranhar esta recomendação de Bruxelas. "No dia do brexit (...), automaticamente o Reino Unido abandona 750 diferentes acordos, que vão desde as alfândegas aos voos de aviação comercial, já para não falar dos sistemas de satélite", recordou Santos Silva, frisando que os Estados-membros devem ter consciência de que o cenário do não acordo tem "efeitos negativos muito fortes para todos".

"Devemos trabalhar para chegar a um melhor acordo possível, mas tendo presente que já passaram dois anos desde a data do referendo e o governo britânico só na semana passada publicou a sua proposta mais desenvolvida para um novo acordo", acrescentou.

Se houver um acordo assinado antes de 30 de março de 2019, a legislação europeia só deixará de ser aplicada no Reino Unido a 1 de janeiro de 2021, ou seja, depois de um período de transição de 21 meses. Sem acordo, não haverá período de transição e o divórcio é consumado imediatamente no dia 30 de março. A Comissão Europeia chama esse cenário de “sem acordo” ou “à beira do precipício”.

A apreensão é grande no seio da União Europeia, com as saídas do governo britânico do ministro dos Negócios Estrangeiros, Boris Johnson, e do negociador britânico do Brexit, David Davis. O seu sucessor, Dominic Raab, esteve esta quinta-feira reunido com os representantes da União Europeia. Enquanto isso, no Reino Unido, não abranda a contestação incessante à estratégia de Theresa May.

De acordo com o jornal The Times, o Governo de Theresa May vai começar na próxima semana a distribuir boletins informativos semanais a consumidores e empresas, com conselhos sobre a melhor forma de se prepararem para uma “Brexit desordeiro”.

A expetativa é de que o Reino Unido e a União Europeia consigam chegar a um acordo até outubro, altura de um Conselho Europeu.
Todos perdem, avisa o FMI
O Fundo Monetário Internacional lançou entretanto novos dados económicos de avaliação do impacto do Brexit. Estima que uma saída sem acordo pode ter um efeito na economia comunitária de 1,5 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) conjunto a longo prazo, um impacto negativo mais elevado do que o apontado noutros estudos.

Segundo o FMI, esse efeito negativo teria especial incidência na Irlanda, Bélgica e Holanda. Num cenário mais pessimista, a Irlanda poderia ver o seu PIB baixar até quatro por cento, enquanto na Holanda e Bélgica a queda atingirO impacto do Brexit em Portugal deverá ser de 0,5 por cento, no caso de saída sem acordo.ia um por cento.

"A força da integração entre a zona euro e o Reino Unido implica que não haja vencedores com o Brexit", afirmou o FMI num documento sobre as consequências do processo de saída de Londres do bloco comunitário.

Os cálculos da instituição financeira indicam que os custos em caso de uma "saída dura", ou seja, com rutura total e sem acordo de comércio livre com a UE, podem significar uma redução 1,5 por cento do PIB comunitário, num período entre cinco e dez anos.

Há consequências negativas, mesmo num cenário de acordo de livre comércio, avisa o Fundo. Nesse caso o impacto na economia europeia seria de 0,8%. O cenário mais positivo seria o de uma opção parecida à da Noruega, a de permanecer com acesso ao mercado único europeu e obrigado a respeitar leis europeias. Esta opção não traria impacto económico.
A perda de empregos poderá chegar aos 0,7 por cento da força de trabalho na União Europeia, mais de um milhão de empregos.
Numa conferência telefónica, Mahmood Pradhan, responsável pela zona euro no FMI, destacou a incerteza prolongada sobre os termos do Brexit, com impacto também nas previsões económicas.

"Estamos muito preocupados. O processo vai adiantado e não vemos com clareza qual a futura relação, numa altura em que se aproximam importantes datas limite", disse Pradhan.

Nas contas do FMI, o Reino Unido será o mais afetado com o abandono da União Europeia. Perderia cerca de quatro por cento do PIB, mais do dobro do que perderia, em média, a União Europeia. A Irlanda perderia idêntico valor, dadas as fortes ligações ao Reino Unido e à partilha de fronteira.

O FMI pede cautela nas conclusões a tirar destes números, alertando que as previsões estão, tal como as próprias negociações, rodeadas de incerteza, comprometendo a solidez das estimativas.
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