Armadilhas do proteccionismo inquietam governantes em Singapura

por RTP
"O consenso é que ela [a crise] não acabou de modo algum", afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros de Singapura Barbara Walton, EPA

Os indícios globais e regionais de recuperação das economias podem ser apenas um intervalo na linha descendente da crise, o que reforça a necessidade de resistir ao proteccionismo. É esta a mensagem que serve de ponto de partida para a reunião anual do Fórum de Cooperação Económica Ásia-Pacífico (APEC), a decorrer até domingo em Singapura.

O diagnóstico de uma crise económica sem epílogo à vista ocupa até sábado os ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros dos 21 países-membros do Fórum APEC. Durante o fim-de-semana, a agenda é assumida pelos chefes de Estado e de governo da organização, incluindo o Presidente norte-americano. Embora os Estados Unidos tenham apresentado, no terceiro trimestre, um ritmo de crescimento que corresponde a menos de metade do desempenho do PIB chinês (8,9 por cento), é sobre a delegação de Washington que recaem todos os olhares.

"Expandir as trocas livres no Pacífico", defendeu em Singapura o presidente da Câmara do Comércio dos Estados Unidos, Thomas J. Donohue, é o "melhor bilhete" para atacar a crise em três frentes - o combate à recessão, a criação de postos de trabalho e o controlo das derrapagens orçamentais alimentadas pelos pacotes de estímulo às economias. Contudo, os Estados Unidos são cada vez mais encarados como um actor de resposta lenta na Ásia, que soma já 168 pactos de comércio.

Yuen Pau Woo, responsável pelo último relatório do Conselho para a Cooperação Económica no Pacífico, um centro de reflexão ligado ao Fórum APEC, alerta para a mudança de percepções entre os agentes económicos da Ásia, a começar pelas empresas e a culminar nos próprios governantes. Todos eles, explicou o coordenador à Associated Press, "estão muito conscientes de que os Estados Unidos não vão ser o motor de crescimento no futuro próximo e estão a pensar noutras formas de o gerar". É essa percepção que Barack Obama vai tentar combater quando chegar a Singapura, segundo Jeffrey Bader, do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. Até lá, a missão está a cargo da secretária de Estado, Hillary Clinton, e do secretário do Tesouro, Timothy Geithner.

"Crescimento verde" e dólar forte

Antes de rumar a Singapura, Geithner fez escala no Japão. E foi a partir de Tóquio que o secretário norte-americano do Tesouro procurou ir ao encontro das preocupações dos interlocutores do Fórum APEC, dizendo acreditar "profundamente" que é "muito importante para os Estados Unidos e para a sua saúde económica" pugnar por "um dólar forte". Na prática, porém, é graças à desvalorização da moeda que as exportações norte-americanas são impulsionadas. O índice do dólar, que avalia o seu valor face a um cabaz de seis moedas robustas, resvalou 7,6 por cento em 2009. Esta quarta-feira caiu para um mínimo de 15 meses.

Sem deixar de reconhecer que os sinais de recuperação nos Estados Unidos permanecem ténues, Timothy Geithner garante, por outro lado, estar consciente da "responsabilidade especial" de Washington para "implementar políticas que fomentem a confiança nos investidores em todo o Mundo". A Administração democrata, sustentou, deve dar mostras de empenho no reequilíbrio da "posição fiscal" à medida que a economia recupera. Mas acrescenta: "Estamos numa fase muito inicial da recuperação. O desemprego está realmente muito, muito alto. Provavelmente, vai continuar a aumentar durante algum tempo".

A Hillary Clinton coube a apologia de uma aposta nas energias renováveis, instando os parceiros do Fórum, responsáveis por cerca de 60 por cento das emissões globais de dióxido de carbono, a colaborar activamente para a obtenção de um pacto sobre o clima na cimeira de Dezembro em Copenhaga: "Temos de cooperar para transformar a ameaça das alterações climáticas numa oportunidade para um crescimento baseado em energias limpas. No último ano, fizemos mais para investir em energia limpa e reduzir as emissões de gases com efeito de estufa do que em qualquer momento da nossa história".

"Caminho escorregadio"

Após um primeiro pequeno-almoço de trabalho, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Singapura, George Yeo, resumiu o estado de espírito prevalecente entre os parceiros comerciais da América. Os países do Fórum APEC estão a experimentar os efeitos de um "proteccionismo latente" que é "muito perigoso".

"O caminho é escorregadio e, se não formos cuidadosos, todos nós podemos cair numa situação ainda mais grave", avisou o anfitrião do encontro ministerial. Na preparação da cimeira do fim-de-semana ganham relevo "a importância da coordenação macroeconómica, a reforma das instituições financeiras e, mais importante, a necessidade de resistir ao proteccionismo".

Instituído em 1989, o Fórum de Cooperação Económica Ásia-Pacífico visa a promoção das trocas comerciais na região, congregando 21 países que valem 54 por cento da economia mundial. Estados Unidos, China, Japão e Rússia são alguns dos membros do Fórum.

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